O que começou para Sohaib Samara como uma maneira de entrar em forma o fez viajar pela Cisjordânia, visitando centenas de suas aldeias. “Em 2015, eu estava no trabalho e tive que subir as escadas para um apartamento no sexto andar”, diz ele. “Eu era um fumante de shisha na época e cheguei lá me sentindo extremamente exausto. Senti-me doente para uma pessoa na faixa dos vinte anos […] então decidi tentar andar de bicicleta para fazer exercício”.
Após um ano pedalando sozinho pela Cisjordânia, Sohaib, de 30 anos, deu início a um grupo de ciclistas chamado “Ciclismo Palestino”. “Eu decidi criar o grupo para permitir que outros vissem a Palestina como eu a vejo”, diz Sohaib. Nos dois anos desde que o grupo foi fundado, homens e mulheres jovens visitaram quase todas as comunidades da Cisjordânia. Somente no primeiro semestre de 2018, o grupo de Sohaib visitou 135 aldeias da Cisjordânia, com mais de 1.000 ciclistas participando dessas turnês. No entanto, nem sempre foi um passeio fácil.
Ver pessoas pedalando nas ruas não é comum na Palestina. Quando começou a andar de bicicleta, Sohaib enfrentou muitas críticas, mas agora acredita que as coisas mudaram. “Quero difundir a cultura do ciclismo para o maior número de pessoas que puder”, explica Sohaib. As meninas, em particular, enfrentaram muitas críticas, visto que era socialmente inaceitável para as meninas pedalar, mas isso mudou: “Hoje em dia as pessoas nos contatam para perguntar sobre as próximas turnês e esperam saber sobre nossas atividades” – diz Sohaib.
No entanto, tendo experimentado andar de bicicleta em outros países árabes, Sohaib explica que a questão principal não é a cultura, mas sim a ocupação israelense: “Pedalei por centenas de quilômetros na Tunísia sem ser parado ou interrogado por ninguém”. Porém, movimentando-se pela Cisjordânia ocupada, “é improvável que você vá além de dez quilômetros sem um posto de controle israelense”, diz Sohaib.
Apesar do fato de que os postos de controle israelenses arruinaram diversas turnês nos dois últimos anos, o Ciclismo Palestina deseja continuar. Sohaib nos conta sobre um incidente que o grupo enfrentou no ano passado, em uma turnê que organizaram de Ramallah até Abud, cerca de 20 quilômetros a noroeste de Ramallah: “Paramos em Nabi Saleh para uma pausa e quando saímos da aldeia para retomar nossa rota, fomos parados por cerca de 20 veículos das forças de ocupação bloqueando a estrada”, afirma Sohaib. “Eles nos interrogaram por cerca de uma hora antes de nos permitir continuar”, acrescenta ele.
De acordo com o Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (OCHA OPT), existem 572 obstáculos ao movimento palestino impostos pela ocupação israelense em toda a Cisjordânia. Os fechamentos são parte de todas as turnês de Sohaib e seu grupo, mas não os impedem: “Não faz sentido ficar chateado com isso”, diz ele, “mesmo se houver muitos postos de controle nos cercando, nós os desafiaremos e atravessaremos. Se as forças de ocupação nos mandarem de volta, sempre há rotas alternativas para descobrir”.
À medida em que cresceu, o grupo foi organizando rotas mais longas. No ano passado, no contexto da Cúpula da Liga Árabe, eles decidiram chamar a atenção para a limitada liberdade de ir e vir dos palestinos. Um grupo de duas mulheres e oito homens pedalou da Palestina para a Jordânia – onde ocorreu a cúpula – nomeando-a como “A Viagem da Liberdade”. Sohaib me contou sobre sua experiência:
“Esta rota de 455 quilômetros começou em frente ao posto de controle de Qalandia em direção a Al-Aqaba e levou quatro dias para ser concluída. Tivemos que cruzar a ponte Allenby para ir à Jordânia – uma travessia de três quilômetros nos levou mais de três horas. Como qualquer palestino que precisa viajar da Cisjordânia para a Jordânia, tivemos que atravessar o ponto de fronteira controlado pelos palestinos, o israelense e o jordaniano.”
Suas viagens são uma ilustração da vida sob ocupação; as restrições ao movimento impostas pela ocupação israelense fazem parte da vida de todos os palestinos. Ciclismo Palestina resiste, movendo-se por todo o território. Em uma turnê recente, eles pedalaram pelo Muro da Separação, com 70 ciclistas seguindo a rota de 770 quilômetros por cinco dias em toda a extensão da Cisjordânia. Mover-se pela Palestina não é apenas um esporte para esse grupo. Para eles, é uma declaração de que a terra é deles. “Nosso ciclismo é uma forma de resistência”, relata Sohaib. “É nosso dever manter o relacionamento com essa terra. Se pararmos de nos movimentar, a ocupação vai nos roubar ainda mais.”