Apenas alguns dias antes da comemoração palestina da Nakba de 1948, na qual os povos indígenas da Palestina foram massacrados, deslocados e sofreram limpeza étnica para abrir caminho ao projeto colonial sionista europeu, a Alemanha emitiu uma declaração manifestando sua intenção de se opor a “qualquer tratamento injusto” que, alegadamente, teria sido visto na ONU em relação a Israel.
“A responsabilidade histórica da Alemanha pelo Estado judeu e democrático de Israel e sua segurança é parte de nossa razão de ser”, declarou o governo alemão. “A Alemanha sempre trabalhará, inclusive na ONU, para garantir que o direito de Israel a existir nunca seja questionado.”
A Alemanha optou deliberadamente por divulgar sua declaração sobre o 70º aniversário de Israel e sua aceitação como estado membro da ONU. Neste dia, apesar de supostamente defender os direitos humanos, a ONU abdicou de suas responsabilidades para abraçar uma nova potência colonial e celebrar seu próprio papel no processo de normalização do colonialismo. A ONU também tem ignorado, de modo conveniente e consistente, o fato de que a participação de Israel na organização estava condicionada a permitir que os refugiados palestinos retornassem à sua terra.
Na ONU, Israel não enfrenta qualquer ameaça. Seu recente bombardeio a Gaza e declarações oficiais da comunidade internacional atestam esse fato. No entanto, a Alemanha entrou na mesma onda, alegando que Israel é tratado injustamente na arena internacional e citando sua lealdade ao Estado coloninial-colonizador como uma “responsabilidade histórica”. Será que o país estende o mesmo sentimento e compromisso diplomático a outras minorias assassinadas durante o Holocausto?
Israel foi um projeto político planejado e discutido no final do século XIX, como mostram documentos e pesquisas históricas muito claramente. O Holocausto facilitou sua implementação, mas não criou a demanda por um “Estado judeu”. No entanto, a responsabilidade histórica e o estado de apartheid colonial-colonizador de Israel são incompatíveis. Além disso, tal responsabilidade que a Alemanha tem em relação a todas as minorias assassinadas na era nazista não anula a responsabilidade histórica coletiva em relação aos palestinos, da qual o mundo inteiro tem fugido.
Enquanto isso, a Alemanha também atribuiu sua postura à “firme crença de que a ONU está no centro da ordem multilateral, baseada em regras” para alcançar a paz e a segurança. O fato é que a ONU não se destacou em nenhuma delas, nem em termos da impunidade com a qual Israel pode agir. O governo alemão, portanto, está meramente afirmando seu compromisso com a propagação de violações de direitos humanos que, naturalmente, atendem aos interesses de Israel.
Numa época em que o mínimo que a comunidade internacional pode fazer é desviar sua atenção para a comemoração Nakba, a Alemanha está determinada a marcar pontos diplomáticos com Israel, o que têm mais a ver com a colonização da Palestina do que com os horrores nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
Os “interesses israelenses” não são mais do que um acordo internacional contra a descolonização da Palestina. Em sua declaração, a Alemanha está recusando a possibilidade de questionar o direito de existência de Israel, alegando uma suposta segurança de Israel e a narrativa de “autodefesa” como justificativa para a violência contra os palestinos.
Por que não inverter a narrativa? Certamente, assim como Israel exige apoio incondicional para sua existência, os palestinos têm uma reivindicação e legitimidade maiores em perguntar por que as pessoas e suas terras foram alvo de limpeza étinica. Se a justiça realmente existisse, a ONU – e a Alemanha – não hesitariam em questionar a criação e a existência de Israel dessa maneira. No entanto, como as coisas estão, a ONU continua sendo um porta-voz de Israel e seus aliados, enquanto, os palestinos são massacrados pelo estado colonial que não hesita em tirar proveito de termos como “responsabilidade histórica”.
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