O braço austríaco do movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) condenou o cancelamento da exibição de um filme palestino, como ataque à liberdade de expressão e exemplo de racismo institucional.
A estreia do filme palestino ¡Yallah! ¡Yallah! estava prevista para ocorrer essa semana no ARTIS Cinema, em Viena, capital da Áustria. O filme é uma coprodução argentino-palestina dirigida pelo cineasta Cristian Pirovano. Pirovano está em turnê na Europa para promover o filme. Após a exibição, estava prevista uma conversa entre diretor e público.
No entanto, às vésperas do lançamento, o ARTIS Cinema anunciou que não exibiria o filme, ao alegar: “Nos últimos dias, recebemos diversas informações e mensagens destacando a postura política controversa nem tanto do filme, mas do evento com apoio do BDS.”
¡Yallah! ¡Yallah! acompanha a vida de sete palestinos e sua paixão por futebol sob a ocupação de Israel, que já dura 52 anos, e sob condições contínuas de deslocamento forçado. O filme ganhou prêmios em diversos festivais cinematográficos na América Latina e Europa, exibido em mais de cem cidades.
Em um longo texto compartilhado em sua página no Facebook, o BDS Áustria acusou o ARTIS Cinema – que pertence ao Cineplexx Ltd., maior operador de cinema no país europeu – de “tentar encobrir a pressão recebida por instituições sionistas” e argumentou que, portanto, preferiu ser conivente com a “censura”.
Na quarta-feira (4), ativistas protestaram contra a decisão em frente ao ARTIS Cinema, com bandeiras palestinas e vestindo keffiyehs, o tradicional lenço palestino.
O cinema também citou a resolução adotada pelo Conselho Municipal de Viena em 2018, a qual conclamou às instituições civis a “nenhuma cooperação com o movimento antissemita de BDS”, além de buscar impedir a realização de eventos filiados ao BDS na capital austríaca.
“A resolução do Conselho de Viena representa o racismo institucional e interpreta equivocadamente ou ignora em absoluto as demandas de direitos humanos da campanha de BDS,” comentou o braço austríaco do movimento sobre a decisão. “O movimento de BDS é um movimento internacional, pacífico, de direitos humanos, liderado por representantes civis da população palestina, fundamentado no direito internacional e na Declaração Universal de Direitos Humanos.”
“Está claro que o cancelamento da exibição por parte do ARTIS Cinema é efeito direto da resolução do Conselho Municipal de Viena, de modo que determina uma restrição injustificada e desproporcional sobre liberdades de expressão e reunião pacífica. Essa forma de racismo institucional e organizado é inaceitável.”
“A cidade tenta hoje ditar o que podemos e não podemos discutir dentre a sociedade civil. Isso é inadmissível.”
O BDS em Viena não é o primeiro movimento pró-Palestina a ter seus eventos ameaçados com cancelamento sob pressão de grupos de lobby israelenses.
Em julho, descobriu-se que o grupo jurídico sionista Advogados Britânicos por Israel (UK Lawyers for Israel – UKLFI) realizou inúmeras tentativas de cancelar uma das maiores feiras culturais palestinas na Europa, a Palestine Expo. O UKLFI alegou que os organizadores do evento – a organização não-governamental Amigos de Al-Aqsa, com sede no Reino Unido – “promoviam amplamente” a campanha de BDS e utilizou esta acusação como pretexto para exigir que o coproprietários alemães do local do evento cancelassem a exibição.
Em seus esforços, o UKLFI citou uma moção não-vinculativa aprovada em maio pelo Bundenstag – Parlamento da Alemanha –, que caracteriza o movimento de BDS como “antissemita”. A moção foi amplamente criticada; organizações não-governamentais israelenses e palestinas, acadêmicos israelenses e mesmo o diretor do Museu Judaico na capital alemã Berlim condenaram a decisão.
Israel ativamente tenta banir o BDS da Europa. Em junho, Gilad Erdan, Ministro de Assuntos Estratégicos de Israel, contactou Jean Claude Juncker, Presidente da Comissão Europeia, para pedir-lhe que garanta a suspensão de recursos da União Europeia (UE) a organizações palestinas que apoiem o BDS.
Erdan também elogiou o papel da Aliança Internacional de Memória do Holocausto (IHRA, em inglês) em sua definição de antissemitismo inclinada à condenação dos esforços do movimento de BDS. O ministro israelense celebrou a influência da entidade, ao alegar que resultou em “cortes na Espanha e na França determinando a ilegalidade de boicotes anti-israelenses e condenando ativistas de BDS”. Erdan reiterou: “Nos últimos anos, mais de cinquenta processos legais contra o BDS foram registrados, muitos dos quais bem-sucedidos.”