Os Estados Unidos fizeram um apelo ao governo iraquiano na noite de segunda-feira (11) para que suspenda atos de violência contra manifestantes que tomaram as ruas do país. O chamado americano é uma resposta ao assassinato de centenas de civis por forças do governo.
Washington também pediu às autoridades iraquianas que implementem reformas eleitorais e realizem eleições antecipadas, pedidos aos quais o Presidente Barham Salih prometeu assentir. Uma declaração da Casa Branca reiterou: “Os Estados Unidos estão gravemente preocupados com os sucessivos ataques contra manifestantes, ativistas civis e profissionais de imprensa, além de restrições impostas ao acesso à Internet no Iraque.”
Três manifestantes foram mortos ontem no sul do Iraque e dezenas foram feridos pelas forças de segurança, que abriram fogo no centro da capital, Bagdá. A Anistia Internacional alertou para um “massacre” no país.
Manifestantes são vistos pelas autoridades iraquianas como uma influência desestabilizadora. A resposta do governo resultou em 319 pessoas mortas desde o início dos protestos, em 1° de outubro, a maioria civis. A repressão também resultou em 12.000 feridos, segundo estimativas oficiais anunciadas na manhã de ontem.
Representantes políticos iraquianos concordaram no último sábado (9) a suspender os protestos, em um momento no qual os manifestantes acusam partidos políticos tradicionais de lealdade ao Irã, visto popularmente como o arquiteto do atual sistema político do Iraque. Após consentirem com o “retorno à vida normal”, as forças de segurança, no entanto, intensificaram a repressão aos protestos. O país permanece também sem acesso à Internet; plataformas de redes sociais estão bloqueadas há quase uma semana.
O governo do Primeiro-Ministro Adil Abdul Mahdi assumiu algumas medidas para tentar atenuar a situação, incluindo o fornecimento de auxílio social aos necessitados e novas oportunidades de emprego a profissionais com nível universitário. Porém, tais medidas fracassaram em acompanhar às demandas cada vez mais abrangentes dos manifestantes, que agora exigem a revisão do sistema político sectário e a deposição de toda a elite política do país.
Sob pressão das autoridades religiosas xiitas, o governo iraquiano recentemente prometeu implementar medidas mais contundentes, incluindo reformas do sistema eleitoral e reconhecimento de legitimidade dos protestos pacíficos. Redes de mídia relataram que diversos líderes iraquianos concordaram em se encontrar ontem em Bagdá a fim de estabelecer reformas eleitorais que dariam à juventude iraquiana melhores oportunidades para participar do processo de tomada de decisões, além de romper com a hegemonia dos partidos políticos sobre as instituições estatais desde 2003.
Os protestos em curso já há algum tempo são vistos como um dos mais complexos desafios impostos ao sistema político estabelecido após a invasão dos Estados Unidos ao Iraque, em 2003, a qual levou à deposição e execução do ex-ditador Saddam Hussein. O Iraque sofreu décadas e décadas de guerras, sanções e, mais recentemente, violência sectária. O último conflito entre sunitas e xiitas ocorreu durante o período do Daesh (Estado Islâmico), quando o grupo extremista passou a controlar a maior parte da região norte e oeste do Iraque. O país desfrutou de um curto período de tranquilidade após a derrota do Daesh, em 2017.
As atuais manifestações são caracterizadas por uma retórica antissectária e lideradas, em maioria, por representantes xiitas que opõem-se ao governo dominado por uma elite política também xiita, porém, com apoio do Irã. Muitos iraquianos têm esperanças de uma transformação política real, mas receiam que os distúrbios populares deixem marcas duradouras sobre o Iraque. Muitos grupos armados lutam para obter poder e influência, à medida que o Exército do Iraque, com apoio de países ocidentais, continua a combater os remanescentes do Daesh por toda a região norte do território iraquiano.