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Assassinato de Soleimani: Estados Unidos declaram guerra ao Irã

Estados Unidos executaram um ataque aéreo que matou Qasem Soleimani, comandante das Forças Al-Quds, unidade de elite da Guarda Revolucionária do Irã, em Bagdá

A década começou com uma séria escalada nas tensões entre Estados Unidos e Irã e ainda maiores provocações que então constituem atos de guerra, agora que Qasem Soleimani, Comandante das Forças Al-Quds, unidade especial da Guarda Revolucionária do Irã, foi assassinado por ataques aéreos perto do Aeroporto Internacional de Bagdá. A operação ocorreu logo após os ataques aéreos americanos de 30 de dezembro sobre campos pertencentes ao grupo Kataib Hezbollah, apoiado pelo Irã, que culminaram na invasão da Embaixada dos Estados Unidos na chamada Zona Verde de Bagdá por manifestantes indignados com os acontecimentos, em cenas que nos recordam do cerco à embaixada americana em Teerã, em novembro de 1979. A gravidade de tais acontecimentos e as potenciais repercussões agora atingem um estado crítico.

Após os ataques de foguetes da semana anterior sobre a base militar iraquiana K1 na cidade de Kirkuk, no norte do país, resultando em apenas uma morte de uma pessoa identificada pela mídia como um “prestador de serviços” anônimo e diversos soldados americanos e iraquianos feridos, Washington passou a crer que possui evidências razoáveis de que o grupo Kataib Hezbollah, apoiado pelo Irã, seria o responsável. No dia seguinte, Forças de Operações Especiais Iraquianas publicaram imagens de um lançador de foguetes e quatro foguetes cujos lançamentos falharam. As imagens sugeriam que se tratava de foguetes Fadjr-1, fabricados no Irã, embora muitos destes equipamentos tenham sido saqueados por grupos terroristas em depósitos militares na Síria e no Iraque.

Nenhum grupo de fato assumiu a responsabilidade por este ataque ou quaisquer ataques similares, cada vez mais frequentes nas últimas semanas.

Entretanto, o Secretário de Defesa dos Estados Unidos Mark Esper decidiu informar diretamente o Primeiro-Ministro do Iraque Adil Abdel-Mahdi que os EUA executarão ataques contra todos suspeitos de estarem por trás dos ataques em Kirkuk, a despeito dos apelos de Mahdi para que os ataques aéreos sejam interrompidos.

O que seguiu-se foi uma resposta desproporcional e imprudente envolvendo ataques aéreos contra cinco alvos em ambos os lados da fronteira entre Síria e Iraque (cerca de 540 quilômetros de distância da base K1, em Kirkuk), em particular ataques contra a travessia estratégica de Qaim, aberta por Mahdi em setembro de 2019, muito a contragosto de Estados Unidos e Israel, após permanecer fechada desde 2012. De modo bastante crítico, as Forças de Mobilização Popular (Hashd Al-Shaabi), que incluem o Kataib Hezbollah, são parte das forças armadas iraquianas, sob o comando do primeiro-ministro, e foram instrumentais na luta contra o Daesh (Estado Islâmico), em declínio e retirada, porém não plenamente derrotado.

O que raramente é reportado sobre os ataques ao Kataib Hezbollah é que apenas nove mortos eram combatentes da célula paramilitar; os outros 22 mortos eram soldados e policiais iraquianos. Nenhum iraniano foi morto. Ainda assim, temos observadores distantes que são teimosos o bastante para pensar que cidadãos comuns iraquianos não sentiriam-se indignados frente a um ataque tão flagrante às suas forças armadas e ao seu país. Estes cidadãos comuns então marcharam em protesto contra as ações americanas, após realizar as orações e funerais pelos seus mortos. É interessante notar que, para esses observadores, os ataques contra missões diplomáticas iranianas foram, ao longo do tempo, todos orgânicos, enquanto este contra a “embaixada” dos Estados Unidos – praticamente do tamanho do Vaticano e, na realidade, um enorme centro de espionagem – só pode ser orquestrado por Teerã. Uma imagem eventual passou a ser evidência deste ponto de vista: uma pixação sobre as paredes da embaixada americana que dizia “Soleimani é nosso líder”.

Tanto o Presidente dos Estados Unidos Donald Trump quanto o Primeiro-Ministro de Israel Benjamin Netanyahu acolherão tais acontecimentos como uma oportunidade grata para distrair o público de seus processos de impeachment e indiciamento criminal, respectivamente – ambos também tentam se reeleger. Nada parece ajudar tanto a mobilizar comícios públicos em torno de um líder populista do que uma guerra para ambas as partes, mesmo que seja tão imprudente ao ponto de tornar realidade o sonho neoconservador de lutar contra o Irã. Qual foi a reação de Trump ao dançar sobre o abismo com seu país à margem de uma guerra com o Irã? Meramente compartilhou uma imagem em sua página do Twitter: uma bandeira americana em baixa definição. Acredita-se também que o Secretário de Estado Mike Pompeo, também um consistente entusiasta da guerra contra Teerã, esteja com os dias contados em seu cargo e que, portanto, fará todo o possível para incitar os conflitos.

Aqueles assassinados ao lado de Soleimani eram Mohammed Reza Al-Jaberi, comandante de alto escalão iraquiano e chefe de assuntos públicos do Hashd Al-Shaabi, e Abu Mahdi Al-Muhandis, vice-presidente da mesma organização. No momento da escrita, há ainda relatos de que fuzileiros americanos tenham prendido Qais Al-Khazali, líder do grupo Asaib Ahl Al-Haq, e Hadi Al-Amiri, chefe das Brigadas Badr, ambas organizações subsidiárias do Hashd. Dois meses antes de ocorrerem, Khazali alertou para a deflagração de protestos em outubro de 2019, seguida por um golpe de estado planejado para novembro. Sua previsão não foi tão imprecisa, considerando que tanto o presidente quanto o primeiro-ministro renunciaram a seus cargos desde então.

É bastante evidente que os Estados Unidos decidiram seguir a perigosa diretriz de provocar o Irã a responder mais aberta e punitivamente, dado que – até então – havia agredido postos iranianas apenas de modo tático e indireto, ao atingir somente forças armadas iraquianas com apoio do Irã. Ao mirar na cabeça das Forças Al-Quds – provavelmente o mais importante oficial iraniano após o Líder Supremo Ali Khamenei –, além de atingir figuras do alto escalão do Hashd Al-Shaabi, os Estados Unidos decidiu realizar um movimento estratégico. O Hashd, apoiado pelas Forças Al-Quds, fornecem um contrapeso diante do terrorismo patrocinado pelos Estados Unidos na região.

O que podemos esperar é uma pressão combinada pelo governo iraquiano para que os Estados Unidos retirem suas tropas do país, ou mesmo retaliações dentro do Iraque executadas por elementos das forças armadas – isto é, o Hashd – em particular pelo fato de que o Kataib Hezbollah fora composto como resultado da invasão americana ilegal no país em 2003, e pode logo retornar a ações de guerrilha contra forças americanas, como fez nos primeiros anos após a ocupação. Muqtada Al-Sadr, clérigo nacionalista iraquiano, também expressou sua disposição para cooperar com o Hash, embora sejam antigos rivais. Al-Sadr comanda um grupo paramilitar com sua própria história de resistência frente aos americanos.

Fundamentalmente, a influência abrangente do Aiatolá Sayyd Ali Sistani, proeminente líder político iraquiano, pode determinar o quão ampla e popular será a resistência, caso seja de interesse do Iraque. Afinal, já declarou que as autoridades possuem o pleno direito de responder ao ataque contra forças armadas iraquianas. Washington antecipou-se ao enviar ainda mais tropas à região. Ainda mais significativo será a resposta inevitável, embora arduamente calculada e cautelosa de Teerã, diante do último ato de agressão realizado por uma hegemonia em declínio, a qual luta cada vez mais contra a corrente para preservar sua relevância geopolítica no Oriente Médio.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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