Israel se prepara para deflagração da situação na Cisjordânia

No ápice de seu monitoramento sobre as reações palestinas diante do chamado “acordo do século”, Israel alertou para a possibilidade de uma deflagração nas escaladas em solo na Cisjordânia ocupada. Houve receios de que membros dos serviços de segurança palestinos e do partido Fatah fossem absorvidos por estas escaladas, como foi o caso durante a Segunda Intifada, entre 2000 e 2005.

Israel temia que tais questões fugissem do controle da Autoridade Palestina e que membros do partido Fatah resolvessem se engajar nos confrontos populares. Também temia que as forças de segurança palestinas utilizassem as armas ao seu dispor para apontá-las contra soldados da ocupação israelense.

Considerando as conversas cada vez mais frequentes em Tel Aviv sobre a potencial anexação de áreas palestinas na Cisjordânia, conforme for implementado o “acordo do século”, tais fatores podem levar ainda a uma escalada de campo.

Talvez Tel Aviv tenha compreendido tarde demais que somente falar sobre anexação, e não implementá-la, já é capaz de inflamar a situação em solo em relação à população palestina e, deste modo, jogar mais combustível às tensões incendiárias já existentes nas regiões ocupadas.

Embora a situação atual nos territórios palestinos seja similar àquela de 2015 e 2016, parece difícil restaurar a frágil tranquilidade de segurança nas áreas palestinas ocupadas, como era antes do anúncio do “acordo do século”. Esta conjuntura levou os círculos de segurança de Israel a pedir a seus próprios políticos que parem de falar da possível anexação da Cisjordânia, pois somente o discurso já é capaz de prejudicar a cooperação de segurança com a Autoridade Palestina.

Generais israelenses alertaram que uma escalada de campo dentre palestinos pode permanecer reduzida em resposta ao “acordo do século”, desde que o lançamento prático dos planos de anexação não tenham se iniciado, apesar dos últimos dias terem efetivamente vivenciado uma série de investidas armadas contra alvos israelenses em Jerusalém, além de confrontos populares na cidade de Jenin e disparos de foguetes e balões a partir da Faixa de Gaza. Entretanto, a análise israelense sobre o contexto crê que não estamos no início de uma nova intifada palestina, mas sim uma pequena onda de operações, na qual mortes trazem mais mortes.

Os israelenses contam com o fato de que a coordenação de segurança com a Autoridade Palestina não chegou ao fim, pois a organização política palestina pondera arduamente sobre as perdas e custos impostos pela eclosão de uma nova intifada, a despeito de ameaças antigas. Portanto, a Autoridade Palestina considera que, desde que Israel não assuma medidas unilaterais antes das eleições, qualquer medida tomada – como o fim da coordenação de segurança – afetará diretamente sua vida prática, em particular no que se refere à sua própria sobrevivência.

Porém, isso não nos impede de dizer que vemos uma escalada gradual na situação na Cisjordânia; não obstante, devido a decisões de campo locais, ao invés de tendências abrangentes. Não vimos até então a deflagração de confrontos massivos na região, mas podemos concordar no ponto de que sempre alertamos sobre esta possibilidade no passado.

Embora seja verdade que os palestinos não gostam nada do “acordo do século”, enquanto não houver aplicações práticas, em particular no que se refere à anexação, a resposta palestina não resultará na eclosão de uma nova intifada. Ainda assim, apesar do público na Cisjordânia não ter ainda ocupado as ruas, qualquer anexação unilateral de fato será o suficiente para fazê-los ir às ruas e pôr fogo nos territórios palestinos em questão.

O atual nível de deterioração pode ser refreado e administrado ao rever os métodos que podem ser utilizados para evitar a degradação final da situação em campo na Cisjordânia.

O primeiro método israelense refere-se à coleta intensa e extensiva de dados de segurança e inteligência de campo – em particular, por meio das redes sociais –, a fim de identificar os grupos ativos capazes de incitar ataques e fontes potenciais de operações. Tal método pode ser posto em prática por meio de uma nova campanha de prisões e coordenação com os serviços de segurança palestinos para convencer o público de que a escalada não favorecerá os palestinos; ao contrário, poderá levar a novos massacres.

O segundo método israelense é reforçar a ocupação militar israelense na Cisjordânia. Também devem considerar o fato de que empregar mais tropas de segurança no local implica em mais oportunidades para que soldados israelenses sejam alvos de ataques, o que requer, portanto, mais precauções de segurança para protegê-los, como bloqueios de concreto.

O terceiro método israelense é tentar não perturbar demasiadamente as vidas dos palestinos na Cisjordânia ocupada.

A despeito de todos os motivos possíveis para deflagar-se uma Terceira Intifada, os palestinos ainda não tomaram as ruas em números significativos, tampouco investiram contra os postos de controle militar israelenses espalhados por toda a Cisjordânia.

A primeira das razões para tanto é a presença intensa do Exército de Israel na Cisjordânia ocupada, que busca impedir a deflagração de uma nova intifada, apesar da disponibilidade de todos os fatores para fazê-lo. Essa presença relaciona-se à coleta de informações de inteligência e segurança que resultam na coibição de ataques palestino conforme planejados.

O segundo fator refere-se à coordenação de segurança entre Israel e a Autoridade Palestina, que fornece certa infraestrutura de inteligência e segurança para frustrar esforços que possam lançar uma nova intifada. Há um interesse comum em impedir que o Hamas conquiste suas aspirações militares e ganhe destaque na Cisjordânia, à medida que forças de segurança palestinas frustraram operações e prenderam centenas de membros do Hamas e outras facções da resistência palestina.

O terceiro fator relaciona-se a preservar a divisão entre Fatah e Hamas; portanto, entre Gaza e Cisjordânia. Tais medidas impedem de fato o lançamento de qualquer movimento popular na Cisjordânia e qualquer subsequente confrontação de campo. Essa divisão serve ao governo de Israel tanto no nível político quanto de segurança.

O quarto fator deve-se à perda de confiança na liderança palestina, que levanta a questão: Em nome de quem lutamos contra Israel? Mantemos nossa luta para aumentar o saldo bancário de oficiais palestinos e seus filhos, para que levem uma vida de luxo fora dos territórios palestinos?

É verdade que as tensões vivenciadas na Cisjordânia não serão algo a se intensificar da noite para o dia, mas sim gradualmente devido a diversas razões sociais e econômicas. Trata-se apenas de uma questão de tempo para que exploda novos confrontos e o burburinho de oficiais israelenses sobre a anexação é combustível ao incêndio em curso.

Contudo, esta tensão nos territórios palestinos pode ser suficiente para transformar-se em uma onda severa de violência. Não trata-se ainda de uma escalada generalizada – certamente, não é uma intifada –, pois o que foi feito até então resume-se a uma série de ataques individuais que simulam operações anteriores que até então não saíram do controle.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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