Preocupadas com o tratamento desigual que muitos países estão dispensando a refugiados e imigrantes, nas políticas e orientações voltadas à proteger cidadãos nacionais contra o coronavírus, um grupo de organizações sociais da América Latina decidiu emitir um manifesto público, voltado aos governos, contra preferências racistas ou xenofóbicas que deixam contingentes de pessoas ao alcance da pandemia.
Articuladas na Rede Espaço Sem Fronteiras, que tem também representações na Europa, as entidades estão instando a comunidade internacional para que apliquem medidas de proteção e garantia dos direitos humanos dessa população vulnerável.
Paralelas à crise mais visível dos refugiados que se amontoam nas fronteiras fechadas da Europa, na Turquia ou nas já esgotadas ilhas gregas, em risco iminente de uma explosão da epidemia local, as entidades chamam a atenção para as crises de milhares de pessoas vulneráveis nos diversos países para onde migraram, cobrando “medidas de proteção e assistência humanitária para migrantes e refugiados que estejam em situação de maior vulnerabilidade devido a condições administrativas, em situações de rua, acomodações superlotadas, empregos informais, sem cobertura de assistência e sem proteção social.”
A rede atribui aos modelos econômicos vigentes, desnudados pelo encontro dos deslocamentos forçados com a propagação do vírus, a enorme quantidade de pessoas não alcançadas por políticas públicas que as ajudem a se prevenir das ameaças biológicas. “A atual pandemia que está se expandindo em escala global desmascara mais uma vez as deficiências do modelo neoliberal e seu complexo método de acumular riqueza, permitindo o acesso desregulado pelo setor privado e corporativo, aprofundando as desigualdades socioeconômicas, altos níveis de pobreza, que também são causas e consequências da mobilidade humana.”
A rede responsável pela nota reúne organizações de direitos humanos, associações de advogados e pequenos empresários, que compartilham a agenda comum de defesa dos imigrantes. Representante do Conselho da rede, Sergio Miletto, explica que a rede defende uma cidadania universal. As signatárias da América Latina atuam no Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Colômbia – há duas na Espanha e Portugal – e observam que a saúde pública, alvo de desmonte e privatizações na América Latina e no mundo, agora é “o centro de nossa resistência”.
A rede mostra preocupação especial com a realidade dos migrantes em situação administrativa irregular, que por medo de serem presos devido a políticas restritivas hesitam em procurar serviços de saúde e dependem do trabalho diário para sobreviver.
Já as solicitantes de asilo são cada vez mais numerosas em determinados países e regiões e convivem com ” a incerteza em torno do vírus que causa pânico. coletivo e deixa essas pessoas à mercê de manobras políticas e governos que as transformam em bodes expiatórios”
O documento destinado aos estados acolhedores exige responsabilidade política para garantir a saúde abrangente de todos os seres humanos. “A única saída para essa crise de saúde é incluir migrantes e refugiados nos cuidados e, portanto, na solução”.
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