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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

A Nova Ordem Política – Como os palestinos responderão à anexação de Netanyahu?

Manifestantes repudiam o plano israelense de anexar assentamentos ilegais nos territórios ocupados da Cisjordânia e Vale do Jordão, em Tel Aviv, 6 de junho de 2020 [Nir Keidar/Agência Anadolu]
Manifestantes repudiam o plano israelense de anexar assentamentos ilegais nos territórios ocupados da Cisjordânia e Vale do Jordão, em Tel Aviv, 6 de junho de 2020 [Nir Keidar/Agência Anadolu]

O Primeiro-Ministro de Israel Benjamin Netanyahu está avançando com seus planos ilegais de anexação, que permitirão a Israel alegar “soberania” sobre quase um terço do total do território palestino da Cisjordânia ocupada.

Embora a anexação ilegal de terras palestinas supostamente represente apenas um dos termos do chamado ‘acordo do século’ de Donald Trump, Netanyahu deixou claro que não está interessado em implementar qualquer contrapartida do acordo.

O premiê israelense declarou a um grupo de líderes extremistas judeus, em 7 de junho, que não há qualquer interrupção vigente sobre a expansão dos assentamentos ilegais.

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Anteriormente, Netanyahu alegou que qualquer entidade palestina – caso haja – eventualmente estabelecida nas terras remanescentes da Cisjordânia não seria chamada de estado. O político compreende bem que tem em suas mãos de fato uma oportunidade histórica, na qual não se apresenta qualquer responsabilização por seus atos, sequer uma gentil reprimenda proveniente de Washington.

O debate mais significativo sobre a natureza e o momento da anexação parece acontecer justamente dentro de Israel, pois Washington já concedeu luz verde para as ações israelenses; outros países europeus permanecem silenciosos ou complacentes diante da última violação israelense dos direitos palestinos.

Desde os primórdios, o debate entre as elites de Israel preocupa-se com a chamada “bomba demográfica”. Seu propósito é adquirir toda a terra palestina habitada com o menor número possível de palestinos. (Observe agora que as terras em processo de anexação tem menor densidade demográfica, comparadas ao resto da Cisjordânia).

Em 4 de junho, Israel declarou que aproximadamente 50.000 habitantes palestinos da região da Cisjordânia destinada à anexação não receberão qualquer garantia de cidadania israelense. Deste modo, Netanyahu emite duas mensagens claras – a primeira aos palestinos; a outra aos israelenses.

Sua mensagem aos israelenses – em particular, aos apoiadores dentro do Likud e dos partidos ultranacionalistas e fundamentalistas judaicos – é que a “bomba demográfica” palestina ainda não representa uma ameaça e que cidadãos judeus de Israel continuarão a representar maioria da população, uma vez completa a anexação.

Mas qual a mensagem de Netanyahu aos palestinos?

É bastante difícil conjecturar com qualquer grau de certeza o que acontecerá quando Israel de fato avançar nos planos de anexação. A falta de clareza é relacionada à complexidade do contexto político palestino e à falta de solidariedade efetiva por parte dos árabes em relação à Palestina, sob contexto histórico tão crítico.

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Banners expostos na fachada de um edifício alertam o Secretário de Estado dos Estados Unidos Mike Pompeo, durante visita, sobre os riscos da anexação de assentamentos ilegais em terras palestinas, na Praça de Begin, em Jerusalém, 13 de maio de 2020 [Mostafa Alkharouf/Agência Anadolu]

Banners expostos na fachada de um edifício alertam o Secretário de Estado dos Estados Unidos Mike Pompeo, durante visita, sobre os riscos da anexação de assentamentos ilegais em terras palestinas, na Praça de Begin, em Jerusalém, 13 de maio de 2020 [Mostafa Alkharouf/Agência Anadolu]

A Autoridade Palestina serviu por um longo tempo para impor uma zona tampão a serviço do Exército de Israel e dos assentamentos judaicos ilegais. De fato, a própria justificativa política da existência da Autoridade Palestina, aos olhos de Israel, Estados Unidos e aliados, é precisamente esta: fornecer segurança a Israel.

Há muito ruído sobre o papel da Autoridade Palestina na construção de um estado e de boa governança, mas nada resulta de tais rumores no final da história, pois o estabelecimento de um estado palestino jamais foi prioridade na agenda política do Ocidente.

Em 19 de maio, o Presidente da Autoridade Palestina Mahmoud Abbas declarou revogação de todos os acordos vigentes com Israel e Estados Unidos, em resposta aos planos de anexação. Ainda não sabemos ao certo o que significa na prática essa decisão. Caso a Autoridade Palestina, por si só, seja resultado de tais acordos e, caso o apoio de países doadores seja emitido apenas devido à existência da Autoridade Palestina, então deverá esta entidade continuar a existir? A que papel serve? E não será momento para ressuscitar a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), historicamente a entidade política palestina com maior representação internacional?

É possível argumentar que Abbas revogou os acordos, sem qualquer medida prática em campo, para antecipar os protestos palestinos que certamente ocorrerão após Israel anexar quase 30% da Cisjordânia ocupada.

Quando os palestinos tomarem as ruas em repúdio a Israel e Estados Unidos, além do silêncio e da duplicidade dos estados e entidades árabes, será que também condenarão a Autoridade Palestina e o próprio Abbas pelas décadas de cooperação com Israel e por seus persistentes fracassos e corrupção endêmica?

Alarmados pelas sinistras possibilidades à sua frente, Abbas e seus amigos desesperadamente tentam posicionar a si mesmos ao lado da indignação coletiva do povo palestino diante das ações israelenses. Entretanto, o povo palestino, altamente instruído e politicamente sagaz, compreende por completo que Israel jamais poderia sustentar sua ocupação e expandir seus assentamentos ilegais (com razoável facilidade) sem as contribuições diretas de Abbas.

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Caso Israel anexe partes da Cisjordânia e protestos palestinos sejam eventualmente contidos sem reforma significativa da liderança palestina, então Netanyahu deverá sentir-se ainda mais incitado pelas circunstâncias, o que pode resultar em maiores anexações de terras palestinas.

Ocorre que o plano de anexação de Netanyahu representa um momento decisivo não apenas a Israel, que traça seus toques finais ao projeto colonial na Palestina, ou aos governos árabes e à comunidade internacional, negligentes ou facilitadores do colonialismo sionista, mas também para os próprios palestinos.

Está reiteradamente comprovado que a atual fórmula política – a solução de dois estados defendida por uma liderança palestina arcaica e corrupta – fracassou por completo.

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Também está claro que qualquer visão futura que exclua a centralidade do povo palestino, na Palestina e na diáspora, possa sobreviver, muito menos trazer uma paz justa e duradoura. Os acordos de Oslo, a iniciativa de Genebra, a iniciativa de Paz Árabe, a chamada Rota para Paz do Quarteto são apenas algumas das muitas tentativas fúteis assumidas até hoje.

Nos próximos meses e anos, a resposta palestina ao plano de anexação israelense pode talvez transparecer ao público a natureza da luta contra o colonialismo e o apartheid israelenses.

Acredito firmemente que os palestinos estão prontos a ir adiante, para além da Autoridade Palestina, da retórica inútil de Abbas, do faccionalismo e da busca frívola pela solidariedade de governos árabes, que meramente traduz-se em discursos exaustivos e em eventuais remessas financeiras.

Embora, na mente de Netanyahu, o fim do jogo esteja próximo, seu esquema de anexação pode levar talvez à reordenação de todo o jogo político, à medida que o povo palestino volta a assumir o centro da equação política.

Não importa se a resposta coletiva palestina levará em outra Intifada ou se manifeste de algum outro modo: não há escapatória sobre o fato de que o povo palestino há muito tempo é marginalizado e que chegou a hora, mais outra vez, de vestir o manto e as bandeiras de sua luta nacional.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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