Em 2005, o Exército de Israel começou a retirar-se da Faixa de Gaza, como parte de um plano de desengajamento unilateral da ocupação. Muitos círculos israelenses criticaram a ação, devido a desvantagens estratégicas majoritárias.
Palestinos e israelenses recordam-se todo verão, cada qual a seu modo, do aniversário da retirada de tropas de Israel da Faixa de Gaza. Israel receia que ações similares possam ocorrer eventualmente na Cisjordânia ocupada. Tais preocupações refletem-se no plano de anexação de que tanto se fala ou por meio do chamado “acordo do século”, anunciado pelo Presidente dos Estados Unidos Donald Trump.
Ao revisitar rapidamente os mais relevantes artigos israelenses publicados nos últimos dias para recordar este aniversário, enxergamos com transparência um estado de frustração sem precedentes. Alguns autores não hesitaram em dizer que a retirada representou um dos passos mais tolos já assumidos por Israel.
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Tais alegações decorrem do fato de que o desengajamento não atingiu objetivos específicos; ao contrário, segundo opositores, resultou em diversas consequências pejorativas, dentre as quais, as mais relevantes são a intensificação das supostas ameaças de segurança contra Israel e a não-mitigação da hostilidade internacional frente às ações do estado sionista.
Em suma, críticos alegam que a retirada resultou em uma série de fracassos. No entanto, círculos próximos ao então premiê israelense Ariel Sharon, que liderou o plano, costumavam referir-se a Gaza como “Hong Kong do Oriente Médio”, no período imediatamente posterior à retirada, ao sugerir que mantinham o controle. Hoje, uma década e meia depois, Israel enfrenta um estado hostil que parece ameaçar sua fronteira ao sul.
Do ponto de vista político, o objetivo de Israel em retirar-se de Gaza era abdicar de qualquer responsabilidade pelo que poderia ocorrer política e juridicamente no território palestino, além de negar qualquer acusação feita contra o estado sionista relativa à sua responsabilidade como potência ocupante.
Israel também pretendia trancar as portas de Gaza e atirar a chave no mar. Embora pensasse tratar-se de um desejo perfeito, não era realista. A comunidade internacional ainda considera Israel responsável pela Faixa de Gaza e quando os palestinos de Gaza sofrem de fome ou falta de energia, dedos logo são apontados ao Estado de Israel.
É importante notar que os israelenses que iniciaram a retirada assumiram que poderiam trabalhar para retomar negociações com a Autoridade Palestina e lhes impor responsabilidade para combater ataques armados e implementar um mapa rodoviário, por procuração. No entanto, isso nunca aconteceu. Ao contrário, os homens de Abu Mazen fugiram de Gaza diante do Hamas. Hoje, ninguém espera que os israelenses atinjam a paz com movimento, que participou de eleições legislativas apenas alguns meses após a retirada e que simboliza um ressonante fracasso político de Israel.
Uma das razões pelo apoio generalizado israelense à retirada de Gaza foi o aumento na frequência de ataques contra o exército de Israel e seus colonos, no território ocupado, e a dificuldade em lidar com o que parecia ser um infindável massacre israelense. Deste modo, com a retirada, prometiam interromper uma sangria que feria muitos corações.
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Aqueles que rejeitaram a retirada de Gaza alegam que o Hamas recebeu permissão para constituir um exército real, incluindo força de infantaria, naval e aérea. Também alegam que o movimento palestino recebeu permissão para criar uma cidade subterrânea e um sistema de mísseis controlado remotamente, de modo que sequer o caríssimo Domo de Ferro seja capaz de neutralizar. Então, todos os fracassos e inaptidões de Israel diante da questão ocorrem porque sabem muito bem que a eliminação massiva da infraestrutura armada de Gaza custaria perdas massivas também em vidas israelenses.
Quinze anos se passaram desde a retirada de Gaza e Israel ainda não sabe o que quer com ela, como demonstrado pelo debate ao longo dos anos sobre a persistente dúvida: a retirada contribuiu ou feriu sua segurança?
Críticos da retirada estão convencidos de que ação enfraqueceu a segurança israelense. A evacuação de colonos ilegais demonstrou sozinha que Israel cedeu de fato à resistência armada. Opositores da medida temem que o processo possa encorajar maiores retiradas sob as mesmas pressões.
Por outro lado, apoiadores da retirada estão convencidos de que o desengajamento fortaleceu a segurança de Israel. Alegam que, ao invés de investir em missões inúteis incumbidas às suas forças armadas, estas podem combater agora somente nos frontes estritamente necessários. Entretanto, isso não elimina a impressão de que a retirada israelense retratou uma fuga do estado sionista diante da resistência popular dos palestinos.
A retirada de Gaza, segundo os israelenses que repudiam a decisão, representou Israel como se desistisse gratuitamente de porções do território ocupado, sem nada em troca.
Israel não está isento do fracasso na era pós-desengajamento. Deste modo, promete que qualquer suposta violação à sua soberania, proveniente de Gaza, resultará em dura reação; mas rapidamente tais palavras tornam-se vazias. Mesmo a soltura do soldado israelense Gilad Shalit, cinco anos após a retirada, em 2011, resultou de um acordo negociado de troca de prisioneiros. Acordo que Israel efetivamente revogou ao prender novamente os palestinos libertados sob seus termos.
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