O movimento global de Black Lives Matter (BLM; Vidas Negras Importam) tornou-se uma ameaça estratégica majoritária a Israel. Ao menos, é como vê cada vez mais o lobby sionista.
Um grupo de lobby sionista bastante obscuro recentemente subiu o tom de sua retórica anti-BLM. O chamado “Instituto Legal Zachor” passou a atacar as mobilizações na internet, ao alegar supostas ligações com “organizações terroristas”.
Jamais ouvi falar do Zachor. Este “instituto” parece ter apenas dois funcionários: Marc Greendorfer, advogado americano de direito que se opõe ao casamento homossexual, e Ron Machol, “profissional de alta tecnologia” israelense. Analisando seu parco website e sua presença mínima nas redes sociais, o Zachor me parece ser mais um grupo de linha de frente para o chamado Ministério de Assuntos Estratégicos de Israel. Os aparentes laços entre Greendorfer e Adam Milstein também sugerem esta conclusão. Milstein é um investidor multimilionário do lobby sionista, conhecido por coordenar ações de modo bastante próximo com o ministério israelense. Nos últimos cinco anos, a pasta liderou a guerra semiclandestina de Israel contra o movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), que se opõe ativamente ao apartheid de Israel.
Sem citar qualquer evidência, o “Instituto Legal Zachor” alegou, em nota à imprensa divulgada em julho: “O Black Lives Matter (BLM) está rapidamente incorporando a cartilha do terrorismo internacional para sua Insurreição nos Estados Unidos”. Para embasar esta alegação absurda, o “instituto” decidiu referir-se ao apoio generalizado do movimento a direitos humanos do povo palestino, em particular, por meio da campanha de BDS.
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Em declaração, Greendorfer exortou o governo americano a investigar supostos laços entre o Black Lives Matter e grupos “terroristas” palestinos. Afirmou: “Exigimos que o Departamento de Justiça aja para investigar por completo os laços do Black Lives Matter com parceiros do BDS e grupos estrangeiros terroristas, que promovem violência e distúrbios nos Estados Unidos.”
If you weren’t expecting this you weren’t paying attention:
US lawfare group that is focused on delegitimizing/criminalizing support for/solidarity with Palestinians goes after BLM, claiming “terror ties” over links to BDS https://t.co/59faNCe3Pu
— Lara Friedman🔥 (@LaraFriedmanDC) July 9, 2020
Lara Friedman, presidente da Fundação para Paz no Oriente Médio (FMEP) denuncia campanha de criminalização do Black Lives Matter e seu apoio ao povo palestino
Lara Friedman, presidente e fundadora da Fundação para Paz no Oriente Médio (FMEP) respondeu à calúnia ao denunciar: “Se você não esperava isso, não prestava atenção. Grupo de guerrilha jurídica, focado em deslegitimar e criminalizar o apoio e a solidariedade aos palestinos pelo BLM, alega ‘laços terroristas’ com o BDS.” Trata-se, é claro, de um padrão.
As contas nas redes sociais do Zachor possuem menos de 500 seguidores no total. Parece improvável, portanto, que este caso particular represente algum tipo de impacto significativo. O “instituto”, no entanto, é apenas uma ramificação das operações israelenses que envolvem a chamada “guerra legal”, um tipo de combate em campos jurídicos utilizados por advogados sionistas para pressionar e coagir agendas pró-Israel em países de todo o mundo.
Graças a uma combinação entre guerrilha jurídica e lobby político, mais de trinta estados dos Estados Unidos aprovaram leis anti-BDS. Além disso, o Primeiro-Ministro do Reino Unido Boris Johnson, em seu primeiro discurso ao trono, em dezembro último, declarou que seu governo pretende aprovar uma nova lei para impedir que a autoridades locais britânicas promovam o desinvestimento contra empresas envolvidas com a ocupação israelense dos territórios palestinos ocupados.
A guerra legal é histórica, mas tais atos costumam ladrar muito e morder pouco. Mesmo com todas as leis estatais aprovadas nos Estados Unidos, o lobby israelense de fato fracassou em angariar qualquer lei federal neste sentido, aprovada pelo Congresso. Sobretudo, tais leis estatais poderão ser revogadas pela mesma razão que a lei federal jamais foi sequer apresentada à Câmara dos Representante: violam ativamente todas proteções à liberdade de expressão promulgadas pela Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos.
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Contudo, não é surpresa alguma ver tais estratégias de guerrilha jurídica serem estendidas ao movimento Black Lives Matter, por grupos de direita e extrema-direita. Da mesma forma que a atual solidariedade entre as lutas por libertação dos palestinos e dos negros possui uma longa história, a mesma lógica se aplica aos opressores, frequentemente também muito íntimos.
Israel, por exemplo, apoiou e armou o regime supremacista branco que impôs o apartheid na África do Sul, até 1994. Nas décadas de 1980 e 1990, a Liga Antidifamação, organização de lobby sionista de destaque, coordenou toda uma rede de espionagem nos Estados Unidos e se infiltrou em grupos de ativistas que operavam contra ambos os sistemas de apartheid: em Israel e África do Sul.
Trata-se de uma calúnia assustadora atacar o movimento de Black Lives Matter como “terrorista” apenas por expressar solidariedade a outros povos oprimidos do mundo. Porém, a fidelidade à verdade jamais foi o ponto forte dos propagandistas israelenses. Fato é que o último ataque deplorável faz parte de um padrão histórico que torna a solidariedade internacional entre grupos oprimidos ainda mais importante.
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