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Relembrando o nascimento da República da Turquia

Em 29 de outubro, Mustafa Kemal Ataturk declarou o nascimento da República da Turquia, ao tornar-se primeiro presidente do país

O que: Mustafa Kemal Ataturk declarou o nascimento da República da Turquia, ao tornar-se primeiro presidente do país.َِ

Onde: Ancara, Turquia

Quando: 29 de outubro de 1923

O que aconteceu?

“Cavalheiros! Devemos declarar a república amanhã”, asseverou Mustafa Kemal Ataturk a legisladores, durante um jantar na véspera de 29 de outubro de 1923. Em sessão parlamentar no dia seguinte, a república foi votada à existência e Ataturk foi eleito para liderá-la.

Embora a Turquia já fosse uma república de fato por três anos, desde a criação da Grande Assembleia Nacional, o governo oficialmente ainda era chefiado pelo imperador otomano. A declaração de Ataturk encerrou seis séculos de império. O político turco usaria seu novo poder para embarcar em um ambicioso projeto, a fim de construir uma nova identidade moderna, secular e nacional, que levaria sua figura à reverência como “pai da nação”. De fato, o nome “Ataturk” literalmente traduz-se como “pai dos turcomanos”.

Nascido em Tessalônica, atual Grécia, como Ali Reza Oglu Mustafa (isto é, “Mustafa filho de Ali Reza”), a juventude de Ataturk foi influenciada pelo contínuo declínio da ordem otomana na Europa. Suas origens como muçulmano de classe média, falante do idioma turco, influenciaram então as atitudes de Ataturk diante do velho sistema otomano.

Há grandes debates em torno das origens étnicas de Ataturk. Acredita-se que seu pai possuísse origem albanesa, mas outros garantem a ascendência turcomana. Sua mãe também é tópico de intenso debate, em particular, sobre sua origem turcomana ou não. Por outro lado, alguns garantem que as raízes de Ataturk remetem a famílias judaicas ou búlgaras. Certamente, tamanha dúvida reflete o fato de que o Império Otomano era bastante diverso, em termos étnicos, culturais e religiosos.

Noções pré-modernas de etnicidade diferem bastante das ideias modernas. Ataturk nasceu em um tempo no qual velhas ideias sobre identidade e pertencimento eram eclipsadas por novas formas de pensamento. Cresceu neste ambiente e frequentou escolas militares que garantiram a trajetória de sua carreira, no Exército Otomano. Como herói de guerra, Ataturk recebeu louvores e subiu de hierarquia ao longo de uma série de conflitos, como a Guerra Ítalo-Turca (1911-12), os confrontos nos Balcãs, a Primeira Guerra Mundial e a Guerra da Independência. Neste período, Ataturk tornou-se um homem admirado por muitos e, consequentemente, Presidente da República da Turquia.

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O objetivo central de seu mandato era construir um estado-nação moderno com forte identidade turca. A maioria das pessoas que viveu dentro das fronteiras da república recém-instituída, contudo, não encaixava-se nas novas ideias sobre etnicidade. O povo possuía diversas origens, incluindo raízes da Europa Central e Leste Europeu, Norte da África, Ásia Central e países árabes. Todos tiveram de “turquificar-se” e muitas das medidas anti-otomanas de Ataturk tratavam tanto da composição de uma nova identidade nacional, quanto da recolocação do Islã e suas práticas à esfera privada.

Por exemplo, em 1928, a nova república estabeleceu uma série de reformas que levou à conversão do alfabeto da escrita árabe-otomana à sua versão latina. A intenção, sobretudo, era romper com o passado otomano. Na época do nascimento de Ataturk, o domínio otomano já era caracterizado pelo fracasso de sua ordem política, revoluções em série, guerras e declarações étnicas de autodeterminação e forte vontade de criar uma identidade distinta.

A conjuntura, porém, complicou-se pela presença de uma maioria islâmica na Turquia e pela forte prática do Islã, em franco confronto com a noção de estado secular, proposta por Ataturk. Na ocasião, a identidade muçulmana sunita era parte crucial da própria essência do cidadão turco. Na década de 1920, cristãos greco-otomanos e muçulmanos gregos foram expulsos de seus respectivos países e trocados pelos novos governos instituídos em Atenas e Ancara. Ser muçulmano e turco eram características entrelaçadas desde o princípio da república.

Apesar de todos os obstáculos, as reformas de Ataturk aboliram efetivamente o califado e as cortes de Sharia, além de impor códigos de vestimenta europeus a homens e mulheres e tornar o Islã subordinado à nova ordem política. O novo líder ousou até mesmo ordenar que o chamado à oração feito nas mesquita fosse em turco, ao invés de árabe, como era e ainda é em todas as mesquitas do mundo. A mudança perdurou na Turquia até 1950, quando foi então revertida ao árabe tradicional. Não obstante, o país passou por um ressurgimento gradual de sua consciência islâmica, ao longo das últimas décadas.

Todavia, a abordagem hierárquica de governabilidade proposta por Ataturk criou um padrão autoritário às lideranças da República da Turquia. Embora ainda seja uma democracia inquestionável, a preferência por líderes fortes resiste na cultura política da Turquia, como traço reforçado por constantes golpes militares ou tentativas de executá-los. Sob diversas formas, este é o legado de Ataturk na Turquia moderna.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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