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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Campos de refugiados contém vítimas ocultas do covid-19

Palestinos no campo de refugiados de Jabaliya sobrevivem sob duras condições, na Cidade de Gaza, em 17 de dezembro de 2020 [Mustafa Hassona/Agência Anadolu]
Palestinos no campo de refugiados de Jabaliya sobrevivem sob duras condições, na Cidade de Gaza, em 17 de dezembro de 2020 [Mustafa Hassona/Agência Anadolu]

Com o surgimento da pandemia de coronavírus, no fim de 2019, o interesse no suplício dos refugiados – as populações mais vulneráveis em todo o mundo – começou a desvanecer. Um ano depois, é como se a crise dos refugiados desaparecesse por completo.

Entretanto, não acabou. De fato, a mais antiga crise humanitária do mundo deteriorou-se substancialmente, apesar de não tratar-se mais de um item recorrente nos noticiários. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), dados de junho de 2020 indicam aproximadamente 26 milhões de refugiados espalhados por todo o mundo.

Vítimas da guerra, miséria e negligência internacional, muito antes da mortal pandemia, os refugiados foram forçados a enfrentar ainda mais obstáculos do que aqueles já presentes à sua coletiva agonia. Ao agravar ainda mais as condições atrozes em que vivem os refugiados – apátridas, desnutridos, sem acesso à saúde ou educação –, os isolamentos impostos pela doença obstruíram por completo suas sucessivas jornadas, confinados no tempo e no espaço, privados de esperança e, por vezes, acusados injustamente de propagar o covid-19. A realidade, no entanto, é que os campos de refugiados contêm vítimas ocultas da pandemia.

É conveniente argumentar que a pandemia afeta a população global como um todo, de modo a eclipsar o que parece agora uma crise secundária, que aflige um grupo muito menor de pessoas. Este pensamento não somente é cruel e desumano – dado que um refugiado em seu leito de morte, em um campo de refugiados fechado, com pouco ou nenhum acesso a medicamentos apropriados, deveria ser tratado com urgência –, mas também é desonesto. De fato, a crise dos refugiados foi exacerbada ao longo de uma década de turbulência política no Oriente Médio; não obstante, raramente mostrou-se prioridade internacional.

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As muitas conferências e reuniões de cúpula realizadas para debater a questão dos refugiados – sobretudo provenientes do Oriente Médio, em direção à Europa – poucas vezes demonstraram alguma seriedade, ou mesmo honestidade, nos esforços para abordar a responsabilidade coletiva sobre o crescimento exponencial das comunidades de refugiados no mundo e suas consequências hediondas.

O foco, não obstante, sempre foi reagir ao custo político e de “segurança” supostamente imposto ao garantir a salvaguarda aos refugiados, em sua passagem pelas fronteiras nacionais europeias. Tudo isso contribuiu efetivamente para uma nova ascensão do racismo e chauvinismo, propagado por políticas do medo e teorias sinistras que descrevem os refugiados como fonte majoritária da instabilidade social e “terrorismo”.

Esta realidade infeliz e perigosa é particularmente evidente na Europa e Estados Unidos, entre outras partes do mundo. Segundo a mesma mentalidade limitada, os refugiados são um fardo e uma ameaça extraordinária.

A pandemia embaralhou ainda mais um panorama já complexo e confuso. Felizmente, não há necessidade de especular sobre isso, dado que pesquisas abrangentes conduzidas por grupos internacionais de direitos humanos podem nos ajudar a compreender a enormidade do desafio em mãos.

‘Fique em casa’ é o principal conselho para enfrentar o coronavírus; mas o que fazer se for expulso de sua casa? [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

‘Fique em casa’ é o principal conselho para enfrentar o coronavírus; mas o que fazer se for expulso de sua casa? [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

A questão mais urgente relativa à crise dos refugiados hoje é o acesso a tratamento médico adequado. Segundo a organização Mixed Migration Centre (MMC), a crise particular nos serviços de saúde disponíveis aos refugiados está relacionada a “falta de recursos, falta de conhecimento sobre onde ir e discriminação contra estrangeiros”. Em muitas partes do mundo, sobretudo na América Latina, a falta de documentação também serve como faca de dois gumes. Sem documentos regulares de residência, os refugiados são privados de empregos estáveis, sem os quais não podem obter ou custear cuidados essenciais de saúde.

Embora a perda de renda resultante do fechamento de diversos setores da economia, em todo o mundo, tenha agravado a desigualdade existente, aumentado o desemprego – logo, a pobreza – a níveis significativamente altos, os refugiados vulneráveis continuam em uma situação ainda muito pior do que o restante da população.

Segundo o ACNUR, em torno de 70% dos refugiados “vivem em países com acesso restrito ou sem direito ao trabalho”. Considerando que os refugiados já viviam abaixo da linha da pobreza, em condições de vulnerabilidade, como mão de obra barata, os sucessivos lockdowns decorrentes do covid-19 empurraram populações inteiras a níveis sem precedentes de miséria e exploração, nos últimos anos.

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A mesma lógica aplica-se a outros campos, como educação. Embora a pandemia possa resultar em novas formas criativas de ensino e aprendizado – online, por exemplo –, as crianças refugiadas dificilmente possuem as mesmas oportunidades. Sem qualquer alternativa para obter o ensino básico nos campos isolados e, considerando o aumento exponencial na pobreza entre os refugiados, o ACNUR reportou que a matrícula escolar entre crianças refugiadas desabou consideravelmente.

Evidente, há ainda a questão do impacto direto e letal do covid-19 sobre os refugiados. “Os números de infecções em campos no Iraque, Síria, Líbano e territórios palestinos aumentaram rapidamente”, desde o início da pandemia, destacou o jornal britânico The Guardian.

Atenuar o impacto mortal da doença nos campos de refugiados é um verdadeiro desafio, não apenas devido à indiferença diante dos problemas das populações marginalizadas, mas também porque muitos desses campos localizam-se dentro de zonas de guerra, onde o distanciamento social é quase impossível. Para fornecer equipamentos de segurança, kits de testagem, medicamentos que salvam vidas ou a recém desenvolvida vacina, é preciso uma enorme vontade política em diversos níveis e escala global. Infelizmente, no contexto da crise dos refugiados, a experiência nos ensinou que tal disposição é raríssima.

Só nos resta manter a esperança de que nossa tragédia coletiva seja capaz de produzir generosidade o bastante dentro de nosso mundo conturbado, a fim de alocar os refugiados vulneráveis no centro de nossas reflexões e decisões políticas. Temos de olhar para além do curto prazo. Afinal, quando o covid-19 tornar-se um trágico episódio do passado, os refugiados ainda estarão lá – famintos, apátridas, abandonados.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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