Nesta mesma data, há 12 anos, os palestinos em Gaza viviam o que até então seria o pior massacre israelense na estreita faixa – marca tragicamente superada em 2014. A ofensiva sionista, iniciada no apagar das luzes de 2008 – em 27 de dezembro – seguiria até 18 de janeiro de 2009. Ao final, foram mortos 1.400 palestinos, entre os quais 138 crianças. A barbárie sionista levou milhares de solidários às ruas em todo o mundo. No Brasil não foi diferente.
O massacre, que se iniciou com bombardeios aéreos e incluiu, a partir de 3 de janeiro, operações terrestres, além de, na sequência, uso de armas químicas (fósforo branco), veio na esteira do cerco desumano a Gaza, inaugurado no ano anterior. Além do sangue derramado, hospitais, casas, escolas foram destruídas – em 2014, no novo massacre, suas ruínas ainda estavam presentes, diante do bloqueio criminoso que impede até mesmo a entrada em Gaza de insumos básicos.
A ofensiva marcou a tradição sionista de bombardear a estreita faixa, sempre sob o falso pretexto de “defesa” e “segurança”, que não sobrevive a uma mínima análise séria. A partir do massacre de 2008-2009, os bombardeios – descarados ou a conta-gotas – são a face explícita da limpeza étnica planejada à contínua Nakba (catástrofe com a criação do Estado de Israel em 15 de maio de 1948). Israel tem sido condenado repetidamente por esses crimes contra a humanidade, mas segue impune.
A necessária unidade de ação
De Norte a Sul do Brasil, movimentos sociais, junto a comunidades palestinas locais, atuaram em unidade de ação para denunciar o terrorismo sionista em Gaza em 2008-2009 e expressar solidariedade ao povo palestino. Atos públicos que reuniram milhares de pessoas foram realizados em cidades como Corumbá, Brasília, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife, São Paulo, Campinas, Foz do Iguaçu, Curitiba, Florianópolis, entre muitas outras.
LEIA: Sangue, lágrimas e a heroica resistência em Gaza
A lembrança é nítida. Em São Paulo, uma reunião na Mesquita do Brasil com a presença de 150 participantes – entre os quais representantes de partidos políticos de esquerda, movimentos culturais, sociais e populares, centrais sindicais, intelectuais e lideranças da comunidade árabe e muçulmana – culminou na formação da Frente em Defesa do Povo Palestino, um comitê amplo para a organização de atividades em apoio aos palestinos em unidade de ação. Foram vários atos públicos, manifestos, panfletagem e passeatas contra o massacre a Gaza, desde seu início, que reuniram milhares de pessoas. Somavam-se ao protesto contra a agressão sionista as exigências ao governo federal de ruptura diplomática com o Estado de Israel – como anunciado à época por Bolívia e Venezuela – e de cancelamento do Tratado de Livre Comércio Mercosul e Israel. Também se levantava a bandeira de uma campanha internacional de boicote a produtos e empresas de Israel.
A unidade de ação que inspirou a solidariedade naquele e em outros momentos nos quais a contínua Nakba foi escancarada não deveria ser pontual. A colonização e limpeza étnica sionistas não dão trégua. São cotidianas.
No caso de Gaza, os bombardeios frequentes foram direcionados inclusive a hospitais durante a pandemia de Covid-19 no ano de 2020. O cerco desumano, por ar, mar e terra, segue impiedoso. Como resultado, 2 milhões de palestinos enfrentam a tragédia de conviver com apenas poucas horas de energia por dia e 95% da água contaminada. A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou há anos que Gaza se tornaria inabitável em 2020. A crise humanitária é gravíssima.
Na Cisjordânia, Israel acaba de anunciar a construção de 800 novos assentamentos israelenses na expansão colonial ilegal contínua. O apartheid é institucionalizado e conta com todo um aparato que inclui muro e checkpoints. Ordens de demolição de casas, expulsão e prisões políticas são parte do dia a dia dos palestinos. Além disso, os que vivem nos territórios ocupados em 1948, onde hoje é Israel, estão submetidos a 60 leis racistas. E milhões de refugiados na região seguem à espera do retorno há quase 73 anos. Em meio a tudo isso, regimes árabes aceleram a normalização com o Estado de Israel, vendendo a causa palestina em troca de seus interesses econômicos.
LEIA: O cerco de US$16 bilhões de Israel sobre Gaza
É urgente cercar os palestinos da mesma solidariedade que se viu em 2008-2009 e depois em 2014. Retomar a ampla unidade de ação em meio às diferenças. E de forma permanente, seja agora em ações virtuais diante da pandemia de Covid-19 – como tem sido feito pelos movimentos de favelas e militantes de outras organizações que integram o BDS Brasil –, seja na preparação para a volta às ruas em breve.
Enquanto isso não acontecer com a amplitude expressa diante de massacres que ganham as manchetes, os palestinos seguirão com a sensação de que o mundo os abandonou. Transmitir uma mensagem que não deixe dúvidas de que podem contar com as organizações brasileiras que lutam contra a opressão e exploração é tarefa de qualquer um que se afirme solidário à justa causa palestina. Que não seja relegada para mais um massacre explícito como o de 2008-2009. Mas que o colorido das organizações que deu vida às manifestações naquele momento volte a tremular e se some à bandeira palestina para exigir boicote ao apartheid israelense. Pela Palestina livre, do rio ao mar.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.