A organização internacional Human Rights Watch (HRW) exortou a França a abrir uma investigação sobre um ataque aéreo executado contra o Mali, que atingiu civis que participavam de uma cerimônia de casamento, segundo relatos em campo.
Conforme relatório publicado ontem (21) pelo grupo humanitário, residentes denunciam que o ataque aéreo francês, executado em 3 de janeiro, atingiu uma festa de casamento na aldeia de Bounti, na região centro-sul do país, resultando em 19 mortos.
A França negou as acusações e afirmou que os ataques em questão, na região norte de Bounti, levaram à morte de 40 homens adultos, dos quais ao menos 30 eram combatentes de grupos radicais islâmicos.
“Graves alegações de que civis foram mortos por ataques aéreos precisam ser imediatamente investigadas, para determinar a legalidade dos ataques conforme as leis de guerra”, declarou Jonathan Pedneault, pesquisador de crise e conflito do HRW.
“Autoridades da França e Mali possuem a obrigação sob a lei internacional de assegurar que uma investigação confiável seja conduzida em detalhes e de modo imparcial”, reiterou.
O Human Rights Watch reivindicou cooperação de Paris com as investigações abertas pela Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para Estabilização do Mali (Minusma), em conjunto com o Ministério de Defesa do país africano.
Segundo o recente relatório, é preciso que o eventual inquérito francês chegue à própria cadeia de comando, diretamente responsável pela ofensiva.
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Em 10 de janeiro, a Ministra do Exército da França Florence Parly negou qualquer delito à rádio France Inter, ao alegar ter verificado que não havia “nenhum casamento, nenhuma mulher, nenhuma criança” no local do ataque. “Somente homens, exclusivamente homens”.
Em nota, o exército francês afirmou que a chamada Operação Barkhane conduziu a ofensiva após profundas análises de inteligência. Porém, admitiu que o alvo foi identificado apenas uma hora antes, quando um drone detectou dois indivíduos em uma moto e um grupo maior.
Não obstante, o ataque atingiu um casamento planejado com mais de um mês de antecedência, no qual compareciam pessoas de outras localidades que viajaram a Bounti, conforme três relatos independentes de habitantes da aldeia.
Segundo as testemunhas, os convidados homens estavam separados das mulheres devido às rigorosas normas de segregação de gênero impostas por jihadistas que ocupam a área.
“Subitamente, ouvimos barulhos de jatos e tudo aconteceu rápido demais”, declarou um residente local de 68 anos. “Ouvi um poderoso estrondo e então outro. Perdi a consciência por alguns minutos. Quando acordei, meu pé sangrava devido a um estilhaço”.
“Ao meu redor, havia feridos e corpos”, concluiu.
Outro residente destacou ao HRW ter esperanças de que uma “investigação detalhada” seja conduzida a seguir, com maior proteção aos civis contra incidentes semelhantes no futuro.
O governo francês tem a obrigação de indenizar as vítimas civis e seus familiares, reiterou o relatório da organização de direitos humanos, caso seja comprovado que a ofensiva contra Bounti ocorreu de maneira ilegal.
O Mali é assolado por uma insurgência de grupos radicais islâmicos, que teve início no norte do país, em 2012, e então espalhou-se aos estados vizinhos de Burkina Faso e Níger. Em 2013, tropas francesas intervieram na região saariana, a fim de tentar conter o fenômeno jihadista.
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