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Partido Justiça e Desenvolvimento do Marrocos vendeu a Palestina pelo Saara Ocidental?

Fathallah Arsalane (à direita), porta-voz do Partido Justiça e Caridade, e Saadeddine El Othmani (à esquerda), secretário-geral do Partido Justiça e Desenvolvimento, durante ato para marcar o 60° aniversário da Nakba (catástrofe palestina), em Rabat, Marrocos, 15 de maio de 2008 [Abdelhak Senna/AFP via Getty Images]
Fathallah Arsalane (à direita), porta-voz do Partido Justiça e Caridade, e Saadeddine El Othmani (à esquerda), secretário-geral do Partido Justiça e Desenvolvimento, durante ato para marcar o 60° aniversário da Nakba (catástrofe palestina), em Rabat, Marrocos, 15 de maio de 2008 [Abdelhak Senna/AFP via Getty Images]

O proeminente político marroquino Abdelilah Benkirane anunciou a suspensão de sua filiação ao Partido Justiça e Desenvolvimento, em protesto contra a adesão do governo a um projeto de lei para legalizar a maconha para fins medicinais. Benkirane é ex-secretário-geral do partido, de modo que trata-se de um incidente notável.

O Partido Justiça e Desenvolvimento é a principal força islâmica na vida política do Marrocos e lidera sucessivas coalizões de governo desde 2012. Após quase uma década no poder, o partido registrou algumas conquistas políticas, econômicas e de segurança.

Antes mesmo da decisão de Benkirane, o sheikh Abu Zayd Al-Mokri Al-Idrissi também decidiu suspender sua filiação e Idris al-Azmi renunciou à liderança do Conselho Nacional. Muitos oficiais veteranos e membros do partido passaram a criticar suas políticas, sobretudo políticas introduzidas pelo atual secretário-geral e primeiro-ministro, Saadeddine Othmani, incluindo a assinatura de um acordo de normalização com Israel.

O acordo foi divulgado em 10 de dezembro do último ano pelo então presidente americano Donald Trump. Em 22 de dezembro, o Marrocos aceitou iniciar voos diretos, promover a cooperação econômica, reabrir escritórios de contato e avançar a “relações amistosas, pacíficas e diplomáticas” com o estado da ocupação.

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Embora Benkirane não tenha mencionado a normalização ao debater sua filiação ao partido, observadores creem que a adesão da política de cannabis medicinal foi apenas a última gota para sua ruptura. Segundo o presidente do Observatório Marroquino contra a Normalização, Ahmed Wihman, a medida “com certeza” é resultado da normalização dos laços com a ocupação israelense. O mesmo vale para Al-Idrissi, que exortou o partido a retomar seus objetivos fundadores.

Al-Azmi alegou estar perplexo com as condições internas do partido, perante contradições entre as atuais políticas e seus princípios. “Não posso mais tolerar ou mesmo compreender, tampouco explicar ou aceitar o que está acontecendo dentro do partido”, declarou Al-Azmi. “Ainda somos nós?”

Muitos observadores consideram a normalização com Israel como erro majoritário perpetrado pelo partido islâmico. Alguns vão além e argumentam que o partido efetivamente vendeu a Palestina em troca do Saara Ocidental, dado o reconhecimento dos Estados Unidos da soberania marroquina sobre o território disputado, como parte integrante do acordo com a ocupação de Israel. Contudo, Wihman — figura de esquerda e que opõe-se ao partido islâmico — rejeitou a alegação. “Isso jamais aconteceria”, afirmou.

Abdelilah El-Halouti, secretário-geral do Sindicato Nacional do Marrocos, também repudiou com firmeza a hipótese, ao destacar: “O Partido Justiça e Desenvolvimento é parte da política marroquina e jamais abandonará seu apoio e solidariedade à Palestina”.

 

Manifestantes exibem bandeiras palestinas e marroquinas e retratos do então Presidente dos Estados Unidos Donald Trump e do Primeiro-Ministro de Israel Benjamin Netanyahu, com sapatos em seus rostos em sinal de repúdio, durante protesto em Rabat, Marrocos, 10 de dezembro de 2017 [Fadel Senna/AFP/Getty Images]

Manifestantes exibem bandeiras palestinas e marroquinas e retratos do então Presidente dos Estados Unidos Donald Trump e do Primeiro-Ministro de Israel Benjamin Netanyahu, com sapatos em seus rostos em sinal de repúdio, durante protesto em Rabat, Marrocos, 10 de dezembro de 2017 [Fadel Senna/AFP/Getty Images]

Muitos oficiais do partido negaram vender a causa palestina pelo Saara Ocidental. Abdelaziz Aftati é membro da secretaria-geral e argumentou que “tudo relacionado a normalização cairá por terra”, ao reiterar o apoio do partido à resistência palestina contra a colonização sionista. “Somos parte da nação islâmica, ao lado dos povos árabes e islâmicos, uma nação que não pode ascender sem resistir ao sionismo. Esta é uma luta existencial e estamos implicados em seu âmago”.

Dadas todas as garantias, entretanto, é difícil explicar porque o líder do Partido Justiça e Desenvolvimento de fato subscreveu o pacto. Wihman acredita que Othmani foi obrigado a tanto pelo Rei Mohammed VI. Não obstante: “Apesar de estar sob pressão, [Othmani] é responsável pelo que assinou”.

Quando questionado pelo diretor da entidade anti-normalização de Wihman sobre sua decisão de referendar o tratado, Othmani relatou a Aziz Hinnawi ser parte da política do reino, de modo que não poderia desobedecer às ordens do rei. Uma testemunha do encontro entre Hinnawi e Othmani afirmou que o premiê então desmanchou-se em lágrimas.

No Marrocos, a assinatura de acordos internacionais e o desenvolvimento da política externa recai ao Palácio Real. O primeiro-ministro não tem qualquer poder sobre tais questões. Segundo Wihman, sob restrições constitucionais: “Othmani não quis enfurecer o rei”.

Não obstante, Othmani poderia renunciar e Wihman crê que deveria fazê-lo. El-Halouti, porém, destacou que o Partido Justiça e Desenvolvimento obteve acesso ao parlamento sob a prerrogativa de jamais contestar a monarquia, seja como for. “Rejeitar a normalização e recusar-se a assinar o acordo teria enfurecido o rei e levado o país ao caos. A renúncia do primeiro-ministro teria graves consequências políticas, sociais e econômicas”. O partido, enfatizou, escolheu a alternativa menos danosa.

Wihman, El-Halouti e outros que conversei insistem que o Partido Justiça e Desenvolvimento do Marrocos não desistiu de seus princípios ou objetivos, ao normalizar laços com Israel. Segundo eles, suas finalidades permanecem focadas nos interesses nacionais marroquinos, à medida que preserva o respeito ao povo palestino e seu direito legítimo de resistir à ocupação israelense, libertar a Palestina e conquistar um estado independente.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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