A questão palestina é dolorosa para a humanidade

Lameh Smeili [Arquivo pessoal]

Lameh Smeili está em seu quarto mandato como vereador na Câmara Municipal de Guarulhos, e sempre teve em mente a importância da defesa da causa palestina, mesmo na atuação municipal, onde o parlamento é um importante meio, não apenas de promover direitos da população, mas também de sensibilizá-la para as causas justas.

Além de legislador, Smeili é um jornalista competente, que abriu caminho para a cobertura da guerra do Líbano nos anos 80 e a ocupação do sul do país por Israel, o que lhe rendeu o maior reconhecimento em jornalismo sobre direitos humanos no Brasil, o Prêmio Wladimir Herzog.

Nesta entrevista ao Monitor do Oriente Médio, o vereador e jornalista fala dessa dessa experiência e condena veementemente o Estado de Israel, por atacar e excluir o povo palestino de qualquer direito de cidadania sob uma lei que só considera cidadãos plenos os adéptos da religião judaica.

O que o levou a se tornar um jornalista dedicado à causa palestina?

Nasci em Ghazze, no Líbano, vim para o Brasil porque fui expulso do Líbano pela guerra civil dos anos 70. Quando a guerra estourou, comecei a militar nos movimentos da época, principalmente os movimentos palestinos. Foi aí que meu avô, que estava responsável por mim no Líbano, me enviou para o Brasil, onde já estavam meus pais.

Quando cheguei ao Brasil e comecei a ler os jornais, vi que as informações não batiam, eram muito contraditórias, existia uma grande manipulação da informação e sempre tendenciosa para o lado sionista. Neste mesmo período, a comunidade árabe de São Paulo lançou um jornal chamado Jerusalém e um dos diretores do jornal que era o Georges Bourdoukan , me convidou para trabalhar no jornal e prontamente aceitei.

Denunciamos na época, nos anos 80, a invasão de Israel no Líbano e a construção israelense de  campos de concentração no sul do Líbano. Não havia sido publicado isso em nenhum jornal, ninguém tinha conhecimento do que estava acontecendo. Nossa principal denúncia foi o campo de concentração de Ansar, conseguimos  fotos de uns parceiros do Líbano e começamos a denunciar. Este trabalho nos rendeu  o prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo.

Começou assim a minha história e a minha militância, não digo que no movimento palestino, mas no movimento das pessoas oprimidas. Mas sem dúvida nenhuma a questão palestina é a questão mais dolorosa para a humanidade.

LEIA: O que o estado de Israel faz com os palestinos hoje é o holocausto do século 21

Dos anos 80 para cá, a mídia ficou menos parcial em relação à Israel?

Não, porque eles – a maioria dos editores de internacional –  já formaram uma opinião, já criaram uma opinião desfavorável à causa palestina, e isso acabou formando uma certa inclinação na opinião pública favorável ao Estado de Israel. Hoje até a religião, e não só a imprensa, é usada para isso.  Vemos no Brasil manifestações religiosas dos evangélicos que carregam a bandeira israelense. E não é só aqui no Brasil ou no ocidente, mas também nos países árabes. A inteligência sionista usa da religiosidade para semear o ódio, semear a desgraça, a destruição. Se pegarmos, por exemplo,  o orçamento de Estado de Israel, veremos o  quanto eles investem inteligência,  em serviços secretos. Enquanto os países árabes investem em serviços secretos para reprimir a própria população, o Estado de Israel investe mais da metade do orçamento no serviço secreto para proteger o estado deles.

Há muita propaganda também…

Sem dúvida. O Ministro da Propaganda do Hitler dizia: ” a mentira de tanto dita acaba virando verdade”, os sionistas copiaram bem a lição nazista. Aprimoraram e melhoraram os sistemas de tortura e os sistemas de ataques. O estado de Israel nasceu com a destruição do Império Otomano e foi a partir daí que eles começaram a desenhar o Estado judaico, porque o estado de Israel não é normal, é um estado voltado exclusivamente para as pessoas que tem a fé judaica. Eles querem um Estado judeu e não  um  estado laico. Os palestinos que estão lá muito antes, não são reconhecidos como cidadãos porque não são judeus. Não importa se são muçulmanos, cristãos ou ateus. A cidadania plena é dada apenas e  exclusivamente à pessoa que tem a fé judaica.

Israel se coloca como a única democracia do Oriente Médio, que tipo de democracia é esta? 

Na verdade, é democracia para eles. Os alemães diziam que eles eram a raça ariana, a raça superior. E os sionistas dizem  que os judeus são os eleitos por Deus. E então qual a diferença da teoria nazista? Não vejo nenhuma. A humanidade precisa realmente definir um apoio lógico, um apoio verdadeiro para quem realmente é injustiçado desde a Primeira Guerra Mundial, quando começou desenhar o êxodo palestino, a diáspora palestina e que continua até hoje.

Na esfera municipal é possível apoiar a causa palestina?

Sim, inclusive no meu primeiro mandato, no dia da posse, em janeiro de 2009, Gaza estava sendo atacada por Israel. Todos os 34 vereadores de Guarulhos estavam usando a Kufiah (lenço palestino), todos se mostraram solidários, fizemos também uma moção de repúdio aos bombardeios e  aos massacres cometidos por Israel. O espaço público é importante.  Nós precisamos realmente que a comunidade e as pessoas do bem comecem a incentivar e apoiar os vereadores, deputados, senadores e ocupantes de cargos públicos que podem e devem ajudar a causa palestina. Acredito que falta  organização. Parece que as pessoas cansaram de lutar. Parece que as pessoas não querem mais saber. Isso não pode acontecer. Nós sempre temos que apoiar as causas justas e não apenas com palavras.

LEIA: Brasil precisa voltar a uma política de reconhecimento da Palestina

Sair da versão mobile