Eid el-Fitr no Brasil: a comunidade islâmica comemora o fim do mês de Ramadã

Celebrações do Eid Al-Fitr na Mesquita de Al-Aqsa (Mostafa ALkharouf / Agência Anadolu)

O que é Eid el-Fitr?

Ao término do período do jejum islâmico, com o fim do mês de Ramadã, os muçulmanos de todo o mundo comemoram o Eid el-Fitr, ou seja, a festa do desjejum. É o segundo dia santo mais importante do calendário islâmico, o primeiro é o Eid el-Adha (ou dia do sacrifício), no décimo segundo mês do calendário islâmico. O Eid el-Fitr coincide com o dia primeiro de Shawwal, o décimo mês do calendário lunar islâmico, composto por um total de doze meses, e que tem dez dias a menos que o calendário solar gregoriano. Isto explica o fato de haver uma rotação do mês de Ramadã e de todos os outros meses lunares em relação ao calendário gregoriano. Ou seja, todos os meses lunares mudam ano a ano quando comparados com os meses solares. Por exemplo, o mês de Ramadã pode cair numa década no verão, na outra no outono, e assim sucessivamente.

O que marca o Eid el-Fitr é a felicidade dos fiéis do Islã em comemorar o fim do abençoado mês de Ramadã, considerado o mês por excelência para a introspecção e contemplação religiosas, além de ser uma excelente oportunidade para a prática da caridade e generosidade. O Eid el-Fitr acaba sendo o ápice deste sentimento. Tanto é que todo muçulmano capaz e produtivo deve fazer a doação de “zakat el-fitr”, ou seja, a caridade do dia do desjejum, a ser destinada aos mais necessitados.

O dia da festa do desjejum islâmico começa cedo pela manhã, após o dia clarear completamente, com a “salat el-eid”, ou seja, a oração do dia santo. Esta oração deve ser feita na mesquita por todos os indivíduos muçulmanos do sexo masculino que alcançaram a puberdade. A participação das mulheres e crianças é opcional. A conclamação para esta oração tem uma forma especial, diferente do “athan” habitual (chamamento para a oração proveniente das mesquitas nas cinco orações diárias). O chamamento da oração do Eid el- Fitr é feita através de “takbirat el-eid”, que são peculiares dos eid menor (el-Fitr) e maior (el-adha), dias santos mais importantes do calendário islâmico. Estas takbirat começam logo após a oração da aurora e só terminam com a realização da oração do eid logo pela manhã, com o dia já claro.

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Conforme ordenou e recomendou o profeta Muhammad, que as bênçãos e a paz de Deus estejam sobre ele, o Eid el-Fitr deve ser dia de felicidade, tolerância, misericórdia e comunhão. É uma excelente oportunidade para a comunidade islâmica praticar a felicidade e confraternizar entre familiares, amigos e conhecidos. Tamanha é a importância de manifestar júbilo e regozijo neste dia, que é vedada a prática do jejum voluntário no dia do desjejum. Se o nome do dia santo que comemora o final do período de jejum islâmico obrigatório é dia do desjejum, então este nome deve ser honrado por todos os muçulmanos, que devem usufruir do lícito de comes e bebes.

O feriado do Eid el-Fitr no mundo islâmico costuma ser de três dias. O primeiro dia é comemorado com banquetes, roupas novas para crianças e visitas a familiares e amigos. Quem passou a infância num país de maioria islâmica lembra muito bem do ritual da compra de roupas novas nos dias que antecedem o dia santo. A roupa só pode ser usada pela criança na manhã do eid. Eu tive a oportunidade de passar a minha infância no Líbano. Me lembro com nostalgia do ritual da compra das roupas do eid pelos meus pais. A nossa felicidade como crianças, com a chegada do eid era algo indescritível. Um outro hábito das crianças na época era soltar fogos de artifícios. Mas talvez o mais marcante de todos os hábitos era a doação dos adultos da família de quantias em dinheiro para as crianças. Pais, avôs, tios e outros parentes mais próximos costumam agradar as crianças da família com quantias boas em dinheiro. Ainda me lembro de como aguardávamos ansiosamente este dinheiro e da nossa felicidade enorme ao recebê-lo. O mais curioso era a competição entre os primos sobre quem iria juntar mais dinheiro.

Talvez uma das faces mais importantes do dia do desjejum seja a sua face social. A interação e a solidariedade entre os membros da comunidade são uma marca desta data. Além de compartilhar dinheiro e produtos de necessidade básica, as famílias muçulmanas costumam trocar visitas intensivamente neste dia. É tradicional o almoço do eid, assim como os doces servidos desde as primeiras horas da manhã. Somente quem viveu esta data em países do mundo muçulmano consegue ter uma noção exata do sentimento de júbilo e felicidade que tomam conta da sociedade neste dia, principalmente quando o assunto é a faixa etária pediátrica.

Como é o Eid el-Fitr no Brasil?

No Brasil, a comunidade islâmica, uma minoria que não chega a 1% do total da população brasileira, tenta reproduzir o clima jubiloso do el-Fitr do mundo islâmico. Guardadas as devidas proporções, e levando em conta as limitações inerentes a todas as minorias, a minoria islâmica no Brasil tem conseguido deixar a sua marca no dia do desjejum. Diferentemente do mundo islâmico, em que a sociedade como um todo é tomada pelo clima do eid, no Brasil a comemoração é praticamente restringida ao espaço das mesquitas.

As famílias muçulmanas costumam ir à mesquita mais próxima do seu local de residência nas manhãs do “Eid el-Fitr”. Depois da oração, as sociedades islâmicas responsáveis pela manutenção das mesquitas costumam oferecer banquete de desjejum gratuito a toda a comunidade presente na mesquita. Este banquete do desjejum costuma ser caracterizado pela fartura e pela presença maciça dos membros da comunidade islâmica. Estes banquetes costumam servir de sobremesa os tradicionais doces árabes. Fora das mesquitas não há nenhum clima que lembre esta data, já que o Brasil é um país de maioria católica.

Embora a constituição brasileira garanta a liberdade religiosa, e embora a sociedade brasileira seja tolerante e receptiva aos rituais islâmicos, no entanto, os dias santos do calendário islâmico ainda estão fora do calendário oficial de feriados religiosos no Brasil. Os membros da comunidade islâmica acabam pagando o preço de pertencerem a uma minoria religiosa. Muitos muçulmanos acabam ausentando-se da mesquita quando o dia de desjejum cai num dia útil. Trabalhadores, estudantes e profissionais liberais muçulmanos muitas vezes acabam sendo privados de congregar com a sua comunidade, em virtude de compromissos de estudo e trabalho que não levam em consideração os dias santos islâmicos.

Mesmo assim, e sem medo de parecermos exagerados, ainda podemos dizer que o Brasil é um dos melhores países do mundo quando o assunto é liberdade e tolerância religiosas. O estado e a sociedade brasileiros dão todo o suporte necessário para a comunidade islâmica brasileira poder praticar os seus rituais e comemorar os seus dias santos, como no caso do Eid el-Fitr.

Em tempos de pandemia, e seguindo as recomendações de autoridades médicas e sanitárias, a maior parte dos teólogos islâmicos do Brasil e do mundo têm tido o bom-senso de ordenar e recomendar a adesão ao isolamento social e a todas as medidas de combate à pandemia. Neste sentido, e em época de plena pandemia, neste ano, é esperado que a comemoração Eid el-Fitr no Brasil, assim como em todo lugar onde houver muçulmanos, seja com seguimento às regras de isolamento social e coibição de aglomerações, mesmo que com finalidade religiosa. Portanto, conclamamos a comunidade islâmica no Brasil a manter a rigorosa observação das recomendações sanitárias e a evitar ir à mesquita no dia do eid. Ó muçulmano, faz o bem neste eid, e fica em casa. A tua saúde e a saúde do seu próximo agradecem.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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