Portuguese / English

Middle East Near You

Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Os extremistas cristãos que alimentam a islamofobia no Brasil

Entrada para o julgamento de Andrés Breivick [Wikimedia]

Há alguns anos, o pastor evangélico Silas Malafaia, líder da igreja Assembleia de Deus,e hoje investigado por lavagem de dinheiro e uma série de negócios obscuros, desafiou a então presidente Dilma Roussef, após um discurso sobre a islamofobia, a lhe mostrar quando e onde um cristão havia cometido atentados ou assassinatos em nome do cristianismo.

Muito além do vergonhoso desconhecimento histórico sobre as Cruzadas, quando nós, cristãos, invadimos Jerusalém por sede de domínio territorial e riquezas materiais travestidos de defensores da fé cristã, quando sequestramos o cristianismo e agimos com uma crueldade e um terror muito maiores do que os usados pelos muçulmanos contra nós, como reconhecem hoje dezenas de historiadores cristãos, o que me chocou no discurso de Malafaia foi seu desconhecimento do mundo atual, não apenas do mundo medieval.

Líderes evangélicos como Edir Macedo e Malafaia, através de suas ligações obscuras com Israel, têm nos levado cada vez mais a um visão medieval do cristianismo, ao abismo do ódio a uma religião abraâmica irmã, uma religião que tem como patriarca o mesmo Abraão dos monoteísmos cristão e judaico, que tem exatamente o mesmo Deus, e que deu ao mundo os primeiros médicos, os primeiros cientistas como al Khaarism, que deu ao mundo a primeira universidade da história da humanidade, fundada no Marrocos em 859.

O discurso de vários pastores de que os muçulmanos são todos terroristas e de que não existem terroristas cristãos tem sido desmentido há anos e continuamente pela incômoda realidade.

LEIA: Quem é Marcos Susskind, o israelense-brasileiro que age como um supremacista judeu, atacando covardemente jornalistas brasileiras?

Você deve se lembrar do terrorista norueguês que, em 2011, matou 77 pessoas em uma ilha da Noruega, 69 delas jovens de um Partido Trabalhista, que acolhiam e ajudavam refugiados. O terrorista Andrés Breivick também utilizou um carro bomba em Oslo, matando sete pedestres inocentes na capital antes de seguir para a ilha de Utoya e massacrar os 69 jovens. O atirador, vestido como um policial, conseguiu entrar na ilha alegando que faria uma verificação de rotina.

Logo após o atentado, jornais norte-americanos e noruegueses tentaram ligar o crime a grupos fundamentalistas islâmicos, mas a realidade derrubou todas as tentativas. O autor do atentado foi detido ainda na ilha de Utoya. Andrés Breivick, um fanático de extrema direita e um odiador de muçulmanos e refugiados de guerra, confessou o crime e disse que se via como um novo cruzado, salvando seu país dos jovens que “protegiam os refugiados”. Andrés Breivick, condenado à prisão perpétua na Noruega, é um terrorista cristão.

Você deve se lembrar do atentado de Oaklahoma City, ainda em 1995, quando um homem detonou uma bomba no edifício federal Alfred Murrah, matando 169 pessoas, ferindo outras 680 pessoas, e destruindo mais de um terço do prédio. A explosão foi tão intensa que danificou mais de 300 prédios de Oaklahoma, num raio de 16 quarteirões e incendiou 86 veículos estacionados nas redondezas. Logo após o atentado, algumas redes de TV norte-americanas também tentaram ligar o ataque a terroristas muçulmanos. Noventa minutos após o ataque, um norte americano chamado Timonthy Mcveigh foi preso numa rodovia local por dirigir sem placas e por porte ilegal de armas, e a  investigação levada a cabo por mais de 500 policias da cidade conseguiu rapidamente provar a autoria do crime e McVeigh e seu cúmplice foram presos. As investigações mostraram que o norte-americano era um veterano da Guerra do Golfo, um evengélico fanático e era ligado às milícias cristãs norte-americanas. Timonthy McVeigh era um terrorista cristão.

Você deve se lembrar também de Jim Jones, um pastor norte-americano que se via como um novo Jesus, criou uma seita baseada em poligamia, abusos sexuais, orações assustadoras e um templo imenso construído nas Guianas, para onde Jones levaria milhares de seguidores. Em 1979 , o pastor Jones cometeu um dos maiores atentados terroristas da História, levando mais de 900 pessoas, entre homens, mulheres e crianças, à morte por envenenamento. Jim Jones era um terrorista cristão.

LEIA: O pentecostalismo sionista “made in USA” e o apoio às ilegalidades de Israel

Você deve se lembrar também do australiano de 28 anos, Brenton Tarrent, que em 2019, abriu fogo contra a Mesquita de Al Noor, na Nova Zelândia, matando 51 pessoas e ferindo outras 49, no maior atentado da história daquele país.

Tarrant, um militante de extrema direita e um islamofóbico, filmou os assassinatos cometidos por ele e os postou nas redes, além de escrever um manifesto intitulado “ The Great Replacement”, repleto de ódio e racismo em estado bruto, com teorias de supremacistas brancos, segundo as quais, os brancos desaparecerão do Ocidente em breve.

O assassino Tarrant também se denomina um “ removedor de Kebab”,  em referência ao típico espeto árabe de carne, e conclamava seguidores no 4chan e ouros fóruns de ódio na web mais profunda, a cometerem seus próprios assassinatos contra mulheres e crianças muçulmanas.

Tarrant, para a vergonha de Silas Malafaia, é um terrorista cristão.

Há poucos dias, um canadense chamado Nataniel Veltman, de 20 anos, atropelou e matou uma inteira família de muçulmanos integrados ao Canadá e amados no país que os acolheu. Salman Afzaal, o pai, Madha Afzaal , a mãe, Yumna, de apenas 15 anos, e a mãe de Slman, de 74 anos, foram mortos na hora pelo simples fato de serem muçulmanos.

Pessoas como eu e você, com sonhos para o futuro, com filhos que as amam e são amados, com desejo de construir um mundo melhor, com um trabalho que contribuía com o país que as acolheu. Pessoas massacradas apenas por serem muçulmanas.

LEIA: Pentecostalismo sionista e a capitulação da Guatemala

Enquanto alimentamos o ódio aos muçulmanos, humilhando-os e condenando-os sem provas com nossas narrativas rasas e preconceituosas, o extremismo cristão e a intolerância crescem a cada dia no Brasil e no mundo.

Segundo dados levantados no Brasil pela Folha de São Paulo, apenas em 2018, ano de disputa eleitoral e com o discurso de intolerância de Bolsonaro, os casos de intolerância religiosa aumentaram 171% somente em São Paulo, em comparação com anos anteriores.

No Rio de Janeiro, onde vivo, os casos de agressão e intolerância religiosa, sobretudo a mulheres e homens muçulmanos ou de religiões afro-brasileiras, aumentaram tanto que houve a criação recente da Delegacia de Crimes de intolerância, sobre os quais escreverei mais no próximo artigo.

Recentemente, milhares de católicos extremistas liderados por Steve Bannon, um dos arquitetos do ódio no mundo,  acusaram o Papa Francisco de “ heresia”por acolher, de forma linda e verdadeiramente cristã, os refugiados muçulmanos em Roma, em um encontro solidário no Vaticano. O mais sábio dos homens que já ocuparam a cadeira de Pedro, o homem que lavou os pés de um grupo de refugiados na Basílica de São Pedro, como Jesus o fez em seu tempo, o homem que pede que a Igreja seja a porta-voz do diálogo entre as religiões e da paz, o homem que eu tive a emoção de conhecer e entrevistar numa coletiva aqui no Rio, durante a Jornada Mundial da Juventude em 2013, foi agredido nas redes covardemente por semanas e ameaçado de morte por milhares de “ cristãos exemplares” liderados por Olavo de Carvalho no Brasil e Steve Bannon nos Estados Unidos.

Os terroristas cristãos citados por mim, e mais do que eles, homens poderosos manipuladores como Olavo de Carvalho e Steve Bannon, sujeitos que alimentam apenas ódio, apartheid, mortes, guerras e novos atentados, representam o que há de mais putrefato, pútrido, perigoso e vergonhoso no cristianismo hoje.

LEIA: Traficantes do “Complexo de Israel” se unem à milícia e proíbem a liberdade religiosa na região

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Categorias
ArtigoÁsia & AméricasBrasilIsraelOpiniãoOriente MédioPalestina
Show Comments
Palestina: quatro mil anos de história
Show Comments