O artista argelino Rashid al-Qurashi projetou um cemitério memorial na cidade portuária de Zarzis, no sul da Tunísia, para o enterro simbólico de refugiados que perderam suas vidas no Mar Mediterrâneo, em busca de uma vida melhor na Europa.
Qurashi comentou a história de sua obra, denominada “Jardin d’Afrique” — o Jardim da África.
Conforme o relato, a ideia foi de sua filha, após ler um artigo sobre as dificuldades funerárias enfrentadas pelos refugiados em Zarzis, em meados de 2018.
Pai e filha então viajaram à cidade para testemunhar os desafios mencionados. Quando chegaram, descobriram que o cemitério destinado aos refugiados ficava dentro de um aterro sanitário; segundo ambos, uma imagem devastadora.
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Hoje, o Jardim da África cobre 2.500 metros quadrados, cercado por muros. Os túmulos são decorados com flores e sinais em tributo, incluindo nome e data de óbito.
O artista também construiu locais de orações para refugiados de diferentes religiões.
“Há corpos de muçulmanos, cristãos e budistas neste cemitério”, observou Qurashi. “Por exemplo, alguns refugiados que faleceram eram bengalis. Durante a obra, prometi a Deus que todos os sepulcros seriam tratados iguais. Agora, não há diferença”.
Qurashi destacou que, entre seus objetivos, também está fornecer a famílias de desaparecidos uma chance de encontrar seus entes queridos.
“Também queremos ter a oportunidade de conhecer quem são os parentes e amigos dos desaparecidos”, acrescentou o artista. “Apenas dez pessoas foram identificadas até então neste vasto cemitério; ainda assim, é um avanço positivo”.
‘Jardin d’Afrique’, ou Jardim da África, cemitério memorial para os refugiados mortos no Mar Mediterrâneo, na cidade portuária de Zarziz, sul da Tunísia, perto da fronteira líbia, 1° de junho de 2021 [Fathi Nasri/AFP via Getty Images]
Audrey Azoulay, diretora-geral da UNESCO, com uma criança refugiada, ao lado do artista argelino Rashid al-Qurashi, durante visita ao Jardin d’Afrique, ou Jardim da África, em Zarzis, Tunísia, 9 de junho de 2021 [Fathi Nasri/AFP via Getty Images]
‘Jardin d’Afrique’, ou Jardim da África, cemitério memorial para os refugiados mortos no Mar Mediterrâneo, na cidade portuária de Zarziz, sul da Tunísia, perto da fronteira líbia, 1° de junho de 2021 [Fathi Nasri/AFP via Getty Images]
Sobre as razões pessoais que o levaram ao projeto, recordou Qurashi: “Meu irmão mais velho também se afogou no Mediterrâneo, há muitos anos. Jamais encontramos seu corpo”.
“Minha mãe ainda perguntava dele em seu leito de morte”, prosseguiu. “Perder um filho é difícil demais para uma mãe e não ter onde enterrá-lo aprofunda essa dor”.
O artista argelino — cujo trabalho já foi exposto nos Estados Unidos e Grã Bretanha, entre outros — descreveu seu Jardim da África como um primeiro palácio mundano, para que os refugiados possam repousar com dignidade antes de seus palácios pós-vida.
“Busquei construir seus palácios na terra”, reafirmou.
A migração irregular ao continente europeu continua, sobretudo por crises socioeconômicas e humanitárias na região.
Ao menos quinhentas pessoas morreram no Mediterrâneo, segundo Carlotta Sami, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).