Portuguese / English

Middle East Near You

Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Concessão de dois estados normaliza colonialismo de Israel

Bandeira palestina na aldeia de Beita, perto da cidade de Nablus, Cisjordânia ocupada; no fundo, o posto colonial israelense de Evyatar, 6 de julho de 2021 [Jaafar Ashtiyeh/AFP via Getty Images]

Após a assinatura dos chamados Acordos de Abraão, no último ano, promovidos pelo governo dos Estados Unidos de Donald Trump, a comunidade internacional aparentemente acordou para a normalização dos avanços coloniais israelenses sobre a Palestina ocupada. Ninguém, no entanto, pareceu particularmente avesso à ideia. É revelador que, embora a normalização dos laços entre Israel e estados árabes tenha criado algum rebuliço, a normalização prévia em larga escala — primeiro pela aceitação da entidade sionista como estado e membro da ONU;  depois pela concessão de dois estados, sob a qual repousa o consenso internacional — não pôde jamais ser condenada.

De fato, a decisão da União Africana para aceitar Israel como estado observador foi corretamente repudiada como mais outra conquista diplomática do estado ocupante, em detrimento do povo palestino e apesar das ainda presentes cicatrizes coloniais do próprio continente. Os estados-membros do bloco deveriam distinguir melhor os danos causados por seu apoio a uma entidade colonial denunciada por crimes de apartheid. Se há alguém que recorda dos males do apartheid, são os povos africanos — mas aparentemente não os seus regimes.

Em termos do apoio africano ao consenso global sobre a Palestina ocupada, a “solução” de dois estados não foi efetivamente traída. Contudo, traíram os próprios palestinos, graças ao paradigma imposto pela comunidade internacional.

Moussa Faki, presidente da Comissão Africana, reiterou o compromisso do bloco com a concessão de dois estados. “O caminho para uma estabilidade duradoura requer que o processo de paz e as soluções buscadas não sejam somente aceitáveis, mas que garantam também os direitos de todas as partes”, declarou Faki.

Dizer que a União Africana traiu seu apoio ao povo palestino ao abraçar Israel pode até ser controverso, mas o paradigma de dois estados é, por definição, uma verdadeira traição dos direitos palestinos. E pouco importa se há consenso internacional — apenas porque alguns países concordam com algo, não significa que seja justo ou correto.

LEIA: Contra a criminalização e o genocídio, barrar os acordos Brasil-Israel

O que o bloco africano efetivamente fez foi estender o impacto de uma enorme traição ignorada, pois a comunidade internacional prefere não enxergar a contradição entre alinhar-se com um estado colonial e alegar, ao mesmo tempo, seu apoio aos povos colonizados. Enquanto o suposto apoio à Palestina preserva certa influência política — conjuntura apoiada por políticos colaboracionistas da Autoridade Palestina —, os limites continuam vagos, sempre em benefício do regime israelense.

Caso a União Africana apoiasse a libertação palestina de modo inequívoco, nunca defenderia a “solução” de dois estados. Com efeito, o mesmo vale para o restante do mundo, que parece não desejar, portanto, o fim da colonização.

A comunidade internacional agarra-se à ideia de dois estados para produzir uma imagem de apoio à Palestina — o mesmo faz o bloco africano. É absurdo apontar que o compromisso de dois estados reflete seu apoio à população oprimida, enquanto sabem muito bem que o estado palestino está longe de qualquer viabilidade prática. Ao alinhar-se com o restante do mundo, o bloco escolheu normalizar Israel e suas políticas de colonização e violência.

Nesta conjuntura, os países africanos enfim se associaram a um processo cujo início remete ao plano de partilha da ONU, conclamado em 1947, muito embora este mesmo pressuposto tenha normalizado efetivamente a limpeza étnica dos palestinos ao longo da Nakba (catástrofe), no ano seguinte. A União Africana deveria acatar as críticas à sua postura, assim como todos os países que normalizaram os avanços coloniais israelenses. As raízes desta farsa política não serão esquecidas.

A preferência da Autoridade Palestina por certo “pragmatismo” sustenta ainda todos os equívocos históricos impostos ao povo palestino pela comunidade internacional. Questionamos assim: por qual razão a liderança palestina nunca contestou as raízes da normalização da ocupação israelense, mesmo embora seja devorada diariamente toda a Palestina ocupada, em favor de um estado colonial de assentamentos ilegais?

LEIA: Democracia e autoritarismo

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Categorias
BlogBlogs - PoliticsIsraelOpiniãoOriente MédioPalestina
Show Comments
Palestina: quatro mil anos de história
Show Comments