Em 1991, Israel foi um dos primeiros países a reconhecer a independência da República do Azerbaijão. Devido a suas fronteiras com o território iraniano, a aproximação entre Baku e Tel Aviv sempre representou uma das principais preocupações de Teerã. Na década de 1990, aproximadamente 20% do território azeri permanecia ocupado por forças armênias e o governo central demonstrava insatisfação com a política iraniana sobre os territórios disputados. O Azerbaijão é importante para Israel, por sua vez, devido a sua posição geopolítica, estratégica e econômica. A complexidade da situação de um estado como o Azerbaijão deve-se, em parte, ao peso de seus países vizinhos — incluindo Rússia, Turquia e Irã. Políticos azeris têm então de assumir uma série de medidas para equilibrar seus interesses. Tamanha conjuntura outorgou a Baku uma série de encruzilhadas em suas relações internacionais, enquanto membro da Organização para Cooperação Islâmica com fortes laços com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e mesmo Israel.
Azerbaijão e Israel insistem em descrever sua cooperação como essencial para manter a segurança regional. A Geórgia, a noroeste, possui então um papel de trânsito neste contexto, incluindo escala para insumos energéticos. O governo azeri fornece a Israel cerca de 40% de sua demanda de petróleo, exportado via gasoduto instalado entre Cáucaso e Turquia. Relações bilaterais azeri-israelenses, não obstante, também têm suas fraquezas. O Azerbaijão enfrenta pressão da Rússia e do Irã, além de uma certa “guerra fria” — eventualmente deflagrada — com a Armênia. Dia após dia, Baku tem então de equilibrar com cuidado seu relacionamento com a ocupação sionista, para evitar maiores contendas com Teerã, Moscou e mesmo Ancara. Israel importa o petróleo azeri a seu mercado consumidor e devolve armamentos, incluindo drones de alta tecnologia. Tais equipamentos militares exerceram um papel crucial em ajudar o presidente azeri Ilham Aliyev a vencer a guerra de Nagorno-Karabakh, no último ano. Segundo relatório do Instituto Internacional de Pesquisa de Paz de Estocolmo (SIPRI), no período entre 2011 e 2020, Rússia e Israel foram, respectivamente, o primeiro e segundo maiores fornecedores de armas ao exército azeri. De fato, as exportações ao Azerbaijão chegaram a 17% do comércio israelense, entre 2016 e 2020. Ainda além, o relacionamento entre a república azeri, majoritariamente islâmica, e o estado colonial judeu, permanece sensível. De fato, Israel possui uma embaixada própria na capital do Azerbaijão, mas ainda não há reciprocidade.
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Oficiais iranianos costumam expressar sua insatisfação com a aproximação cada vez maior entre Baku e Tel Aviv. A propaganda oficial de Teerã prevê eliminar Israel — estado ocupante estabelecido na Palestina histórica — como política operacional preservada há 42 anos, embora bastante onerosa. Além da arena diplomática, o regime iraniano mantém seu apoio resoluto a organizações palestinas e libanesas que se opõe veementemente à presença de Israel como entidade colonial sionista. Em tais circunstâncias, o governo israelense assume toda e qualquer oportunidade para avançar em direção às fronteiras do Irã e monitorar assim acontecimentos domésticos. A superioridade militar do Azerbaijão e a derrota da Armênia na guerra do último ano, além dos equipamentos adquiridos de Israel, demonstram claramente seu papel proeminente no quadro nacional, regional e internacional. Dada a recaptura dos territórios disputados e o sentimento de vitória, Tel Aviv ganhou até mesmo alguma simpatia do público azeri. Além dos riscos de segurança, Teerã teve de considerar o episódio como uma derrota de suas relações públicas.
O Azerbaijão, receoso com a ascensão do islamismo político e a influência direta e indireta do Irã no processo, resguarda então objetivos comuns com o estado israelense. Em contrapartida, o regime da ocupação na Palestina continua apreensivo com o desenvolvimento militar e nuclear iraniano e busca assistência para conter os avanços de seu adversário regional, com base na intersecção de tais interesses. Israel sabe muito bem que os Estados Unidos demonstrarão apoio a negociações na região do Mar Cáspio, para impedir o progresso do Irã e de sua influência política no Azerbaijão, incluindo apreensões com raízes no passado.
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Em meio às conversas acaloradas entre as partes, no início de outubro, o presidente Aliyev sugeriu que a minoria azeri radicada no Irã poderia provocar uma revolta junto de seus primos no Azerbaijão. Para os aiatolás, não obstante, tais comentários representam esforços deliberados para causar distúrbios em solo iraniano, sobretudo entre as minorias. Como resultado das tensões crescentes entre os países vizinhos, Teerã voltou suas críticas e descontentamento aos laços azeri-israelenses, sobretudo em torno do comércio de armas. O regime iraniano mantém-se apreensivo sobre eventuais nacionalistas turcos e tendências separatistas azeris em seu território. Há dúvidas ainda se o novo governo do presidente iraniano Ebrahim Raisi e seu Conselho Supremo de Segurança Nacional será capaz de instituir uma política efetiva para combater o risco potencialmente imposto pelo Azerbaijão. Por outro lado, é absolutamente certo que sua nova política de segurança e diplomacia será muito mais agressiva, dadas tensões exponenciais no Oriente Médio e na região do Cáucaso.
A capacidade do Azerbaijão, mesmo com seus relacionamentos estranhos, de reconquistar a totalidade das terras disputadas permanece em dúvida no presente momento. Qualquer novo avanço pode engatilhar uma resposta de países vizinhos muito mais poderosos, além de insurreições domésticas convocadas por movimentos de oposição. Dessa forma, é mais provável que Baku tente administrar tensões e preservar relações amenas por seu próprio interesse. Questões controversas, como a expansão das fronteiras da OTAN ao sul do Cáucaso ou a eventual ameaça nas fronteiras com o Irã, não têm qualquer base racional no presente momento e operam somente no âmbito ideológico, sob uma leitura hostil do nacionalismo iraniano. Do ponto de vista econômico e também estratégico, o caminho natural é conectar o Irã e a Europa — primeiro, através da Turquia; então Azerbaijão. E mesmo caso se depare com obstáculos improváveis, a passagem pela Armênia não lhes parece viável.
O Irã quer restaurar o Plano de Ação Conjunta Global (JCPOA), ou acordo nuclear, o mais rápido possível, com intuito de proteger seus interesses. Neste contexto de persistente bloqueio geopolítico e econômico, por exemplo, Baku pode arcar com uma postura relativamente agressiva sobre seus avanços para além do Cáucaso, pois não lhe parece próxima uma reação veemente por parte de Teerã. As relações azeri-israelenses devem se ampliar nos próximos anos, em detrimento dos anseios do Irã. Ebrahim e seus correligionários, portanto, podem tentar expandir sua influência sociopolítica no Azerbaijão e mesmo causar instabilidade no país, ao outorgar apoio a grupos islâmicos e recorrer a mecanismos de relações públicas. O Azerbaijão, fundamental à segurança energética da ocupação sionista, deve permanecer como comprador de armas e munição fabricadas em Israel e manter relações bilaterais devido à conjuntura regional. Há ainda espaço para até mesmo ampliar seu relacionamento. Os problemas ideológicos de Teerã concernentes a Tel Aviv continuarão em voga, como estiveram nas últimas quatro décadas. Na mesma medida que o governo azeri coopera com Israel em nome de sua segurança nacional, o regime iraniano preserva boas relações com a Armênia, sem sequer considerar a ocupação de territórios azeris. Todavia, dada a importância do diálogo entre as partes, Teerã deve evitar escalar tensões com Baku e outros países vizinhos. O regime iraniano busca agora melhorar relações com a Arábia Saudita — tensões com o Azerbaijão, portanto, não são uma escolha lógica e contradizem de fato os interesses do Irã.
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