Artigo 6 da Constituição da Jordânia
“Todos os jordanianos são iguais perante a lei. Não haverá qualquer discriminação entre eles no que se refere a seus direitos e deveres, com base em raça, linguagem ou religião”.
Zrein al-A’sar, 30 anos, é uma mulher egípcia bahá’í e mãe de dois filhos nascidos na Jordânia, privada de seu direito de naturalizar-se desde que chegou ao país, oito anos atrás, quando casou-se com um jordaniano. Com um sotaque jordaniano difícil de esconder, Al-A’sar comenta suas dificuldades diárias sem um documento de identidade nacional. Quando fala, esconde seu rosto da câmera, sem preocupar-se consigo mesma, mas sim com o eventual assédio contra seus filhos devido à sua religião.
Al-A’sar não pôde realizar seu sonho de tornar-se advogada, apesar de ser aprovada com louvor na Universidade de Direito de Al-Isra. Trabalhar e mesmo obter a licença para exercer sua profissão é algo inacessível a não jordanianos.
Tais restrições contradizem de fato a legislação referente à nacionalidade e a própria Constituição da Jordânia, segundo as quais a esposa de um jordaniano adquire automaticamente sua cidadania três anos após o matrimônio, caso possua documentos de um país árabe, e cinco anos, caso tenha origem de qualquer outro país.
Trecho da entrevista com Zrein Al-A’sar
Entrevista com Zrein Al-A’sar
“Quando nos casamos, descobri que eu, mesmo sendo árabe, não posso obter cidadania jordaniana após os três anos previstos”.
“Como bacharel em direito e primeira da minha turma, trabalhei muito para chegar aqui, mas não posso obter minha licença profissional porque não tenho cidadania jordaniana … Fiz direito para defender os direitos do povo, mas tive de parar em certo ponto. Temos dificuldades econômicas e tenho de ajudar meu marido, mas não posso trabalhar porque sempre que mando meu currículo, é preciso enviar também minha cidadania”.
“Tenho medo de viajar e não poder voltar. Não há acordo em vigor entre Egito e Jordânia e o governo hachemita pode não permitir a entrada de uma cidadã egípcia. Sempre tive esse problema de não poder viajar com meu marido para qualquer lugar. O que peço é meu direito, não um privilégio. Quero a cidadania jordaniana como cidadã que vive no país há anos e nasceu aqui; mas não posso obtê-la porque não deixam eu me naturalizar”.
No início de 2008, quando o Ministério do Interior do Egito automatizou a emissão de documentos de identidade, as escolhas religiosas se restringiram apenas a islamismo, judaísmo e cristianismo. Dessa forma, Al-A’sar teve de identificar-se como muçulmana em seus documentos pessoais e seu passaporte.
LEIA: Jordânia retoma exportação de vegetais para Israel
Ainda assim, não pôde visitar sua família no Egito desde seu casamento, à espera de sua cidadania jordaniana. Al-A’sar teme não conseguir voltar com seu marido e filhos, pois depende de um visto de entrada. Além disso, seu passaporte não registra seu estado civil e não há evidências de seu casamento para apresentar à Embaixada do Egito em Amã. Segundo seus documentos disponíveis, Al-A’sar é solteira e muçulmana, embora seja bahá’í e tenha se casado em solo jordaniano.
“Contactei minha família e amigos e concluímos que a chance de mudar meu status religioso é bastante baixa”, recorda Al-A’sar, ao referir-se a uma decisão provisória do governo egípcio, promulgada em 2011, para registrar todos os bahá’ís como muçulmanos.
Sem quase nenhuma informação disponível, o autor deste artigo acompanhou os casos de dez mulheres bahá’ís que se casaram com homens jordanianos. Nenhuma delas pôde obter até então sua cidadania, pois o Departamento de Status Civil e Passaporte recusa-se a concedê-las o devido certificado de matrimônio. Tais documentos, não obstante, são imprescindíveis para que possam se naturalizar — processo eletrônico desde 2010 —, de acordo com a Lei n°6 de 1954 e suas emendas subsequentes.
Embora os números oficiais sejam desconhecidos ou retidos pelas autoridades, Tahani Rouhi, porta-voz da comunidade bahá’í na Jordânia, estima que há aproximadamente mil adeptos em todo o país — cuja população de sete milhões de pessoas compreende 98% de fiéis muçulmanos e 2% cristãos, em números arredondados. Em todo mundo, há cerca de dez milhões de correligionários bahá’ís.
Para escrever este artigo, coletei informações sobre as dificuldades enfrentadas pela comunidade bahá’í em um país que não reconhece sua crença. O Islã é a religião do estado, de acordo com a Constituição, e uma das fés reconhecidas oficialmente pelo reino, junto do cristianismo e do judaísmo. Em resposta às minhas perguntas, os círculos do governo concederam dados superficiais pouco ou nada relacionados com o assunto da pesquisa.
O Departamento de Status Civil e Passaporte, sob jurisdição do Ministério do Interior, e o Departamento de Estatísticas Públicas não revelaram o número exato de bahá’ís radicados na Jordânia. O Departamento de Justiça, ligado ao gabinete do primeiro-ministro, tampouco ofereceu informações sobre as condições legais da comunidade bahá’í ou qualquer postura formalizada de autoridades políticas ou religiosas sobre a questão. Ex-ministros e oficiais que encontrei preferiram não comentar o tópico ou pediram anonimato. Além disso, seguidores da fé temem expressar suas dores, apreensivos de que as entidades do governo possam voltar atrás em sua vaga promessa para reconhecê-los.
Qudrat Qumi (Abul-Qassem) enfrenta obstáculos sempre que precisa renovar o visto de residência de sua esposa turca, mãe de seus dois filhos. Apesar do tempo perdido em burocracia, taxas anuais de US$85 e exames médicos obrigatórios, sua esposa não pode sequer trabalhar para ajudar sua família, pois carece da cidadania.
Sem cidadania, sem documentos
Em 2010, Abul-Qassem emitiu um dossiê para solicitar a naturalização de sua esposa; no entanto, o processo jamais foi concluído e foi revogado formalmente seis meses depois. “Minha esposa e eu tínhamos nosso certificado de casamento. Porém, quando tive de anexá-lo ao pedido para naturalizá-la, o documento foi perdido, o que foi atribuído a um erro processual”. O casal, portanto, voltou à estaca zero.
Trecho da entrevista com Qudrat Qumi (Abul-Qassem)
Entrevista com Qudrat Qumi (Abul-Qassem)
“Passamos por todas as formalidades, enviamos uma solicitação inicial ao Ministério do Interior, pois tínhamos um certificado de matrimônio de 2010. Pouco importava, pois nosso pedido já não seria aceito. Ainda assim, decidi anexar nossos papéis de casamento para prosseguir com o pedido. Em seguida, fui encaminhado a consultar inúmeros departamentos”.
“Minha solicitação completa chegou à Diretoria de Naturalização e Assuntos de Estrangeiros. Seria essa a hora de deferir sua cidadania e as taxas foram devidamente pagas. Então me contactaram do Departamento de Status Civil e Passaporte. Diziam: ‘Ela é bahá’í, como conseguiu um certificado de matrimônio?’. Eu respondi que fiz isso como qualquer outro cidadão jordaniano: paguei meus dinares e consegui me casar. Mandaram então que eu enviasse todas as minhas cópias, alegando que a emissão do documento fora um equívoco. Toda a papelada foi rejeitada logo a seguir, após todo esse trabalho”.
“Em seguida, o visto de residência também travou no processo. Por um ano e meio, não conseguimos renová-lo e voltaram a solicitar nossos documentos de casamento. Na época, minha esposa teve de viajar e tive de obter uma permissão de entrada e saída para ela. Quando voltou, teve de pagar um novo visto. Estranhei que a esposa de um jordaniano tivesse de pagar pelo visto, como um turista qualquer. Comentei com o agente local: ‘Você aceitaria que sua esposa pagasse para entrar em seu país?’. Ele se compadeceu: ‘A única coisa que posso fazer é pagar eu mesmo pelo visto’. Então minha esposa entrou com um novo visto”.
Direitos perdidos entre três fés e entes do governo
Como outros membros da comunidade na Jordânia, Abul-Qassem e sua esposa carregam agora um “contrato de casamento bahá’í”, com cópia arquivada no Conselho Bahá’í — órgão não-oficial no país. O documento serve de base para obter seus registros familiares, mas não pode levar à emissão apropriada de um certificado de matrimônio, sob diretrizes do Departamento de Status Civil e Passaporte.
Os seguidores da fé asseveram sua identidade bahá’í, mas o conselho hierático da monarquia — conhecido como Departamento de Iftaa — não reconhece sua religião. Ao contrário, considera os bahá’ís como muçulmanos “pois acreditam em todos os ensinamentos do Islã, salvo a crença de que o Profeta (que a paz esteja com ele) seja o último profeta”.
LEIA: Em primeira ligação depois de uma década, rei da Jordânia e presidente da Síria conversam
Não obstante, Ahmad al-Hasanat, secretário-geral do Departamento de Iftaa, argumenta que não reconhecer oficialmente o bahá’ísmo não impede o estado de proteger os direitos políticos e civis de seus correligionários. “Caso o problema seja a emissão de certificados de casamento, isso se deve a outros serviços”, insistiu al-Hasanat, ao transferir o problema ao Departamento de Status Civil e Passaporte e ao Departamento de Justiça.
Segundo o Departamento de Justiça, entretanto, analisar casos legais de não-muçulmanos “não é parte de sua jurisdição” e admissões “reconhecidas” podem prosseguir nas cortes de sharia (lei islâmica), caso ambas as partes estejam de acordo. Como confirmado pelo juiz Ashraf al-Omari, o Departamento de Status Civil e Passaporte não reconhece documentos de casamento bahá’í e apenas emite registros familiares a casais e seus filhos, sem deferí-los um documento de matrimônio oficial.
Um conselheiro legal da comunidade bahá’í — que teme mencionar seu nome — recomenda a outros adeptos da religião que não processem os departamentos governo na Corte de Magistrados da Jordânia, ao observar que, em caso de derrota, haveria jurisprudência para que os apelos dos bahá’ís por naturalização fossem coisa do passado. “A questão é bastante complexa e pode levar meses, talvez anos, para ser solucionada”.
O advogado Wissam al-Masjoun enfatiza que há reconhecimento do bahá’ísmo como identidade jurídica por gabinetes prévios, que aprovaram o registro de terras em nome da comunidade entre 1969 e 1974 — isto é, o nome do proprietário nas escrituras formalmente autenticadas é “comunidade bahá’í”. Dessa forma, seu reconhecimento é estabelecido legalmente, sob o Código Civil.
O jurista e senador George Hazboun descreve a retenção da cidadania após prazo legal, sob discriminação de crença, como “provável violação constitucional”. Explicou ainda: “Enquanto houver a questão a ser preenchida sobre fé e crença, esta deve ser respondida com algo verdadeiro, com aquilo que a pessoa realmente acredita”.
Trecho da entrevista com George Hazboun
Entrevista com George Hazboun
“Isso não se restringe aos bahá’ís. Há grupos cristãos não reconhecidos que têm documentos revogados junto de autoridades sectárias. Creio que não é certo coagir as pessoas dessa maneira. De fato, representa uma fraude legal”.
“A comunidade bahá’í é única. Reconhecer tais identidade deveria ser considerado formalmente, pois possuem suas próprias crenças. A fé é algo entre a pessoa e seu Deus. Desde que não viole a ordem e a moral pública, como determinado pela Constituição em termos de liberdade de rito, não deve haver obstáculos a essas pessoas … Se trata do tecido nacional e cultural dentro da Jordânia”.
Taghrid al-Dagmi, advogado que contribuiu com um estudo sobre minorias religiosas na Jordânia e seu direito à cidadania e sua liberdade de crença, argumenta que a maior parte da legislação do país é “civil, salvo a Lei de Status Pessoal”. Segundo al-Daghmi, os bahá’ís enfrentam discriminação religiosa em situações básicas, incluindo o acesso de suas esposas à cidadania, em detrimento do conceito de igualdade previsto pela Constituição.
O labirinto das autoridades
Cronologia da busca bahá’í por documentos de casamento
Início de 2015: Uma delegação visita o diretor do Departamento de Status Civil e Passaporte; é então orientada pelo responsável por relações públicas a consultar o diretor-assistente de nacionalidade e assuntos estrangeiros, que volta a encaminhá-la à diretoria de assuntos legais.
O Departamento de Iftaa sugere emitir uma fatwa para que os bahá’ís apresentem provas de matrimônio à Corte de Magistrados da Jordânia. A entidade religiosa insiste, contudo, que nenhuma fatwa do tipo foi de fato emitida. A delegação decide consultar o Departamento de Justiça para assegurar a existência da supracitada declaração islâmica.
20 de janeiro de 2015: Uma petição é entregue ao diretor de assuntos legais. O documento permanece com o Ministério do Interior desde então. O Centro Nacional de Direitos Humanos recebe também um memorando sobre renovações anuais do visto de residência, sobretudo indeferidas com base na falta de documentos matrimoniais — a questão das mulheres bahá’ís iranianas, nacionalidade restrita pelas práticas da monarquia hachemita, ganha destaque. O memorando chega ao ministério após análise de um servidor público intermediário.
A delegação bahá’í visita então o oficial responsável por direitos humanos no Ministério do Interior, que promete levar o problema e as recomendações ao então ministro Salama Hammad. Abdel-Basset Al-Kabariti, diretor de gabinete da pasta, é consultado dezenas de vezes, tanto por telefone quanto pessoalmente; o ministro está sempre ocupado.
12 de junho de 2016: O diretor de assuntos legais é consultado novamente; alega que é preciso marcar reunião com o próprio ministro.
19 de maio de 2018: O advogado Salah Ma’ayta é consultado sobre procedimentos legais para registrar uma queixa judicial. No entanto, desencoraja a delegação de fazê-lo; em seu lugar, aconselha que tentem contactar o novo Ministro do Interior Samir Al-Mubaidin.
27 de agosto de 2018: O Departamento de Inteligência é informado sobre a jornada dos bahá’ís. O oficial responsável pelo contato com a delegação volta a recomendar uma audiência com o Ministério do Interior e promete acompanhar a matéria.
4 de novembro de 2018: Uma petição enfim chega ao premiê Omar al-Razzaz. Diversas consultas são feitas por telefone com Bassel Al-Tarawna, então comissário de direitos humanos. Uma nova carta é encaminhada pelo gabinete de al-Razzaz ao Ministério do Interior e solicita comentários sobre o problema. A delegação consulta o gabinete do ministro e seu diretor Al-Kabariti, mas o ministério nega veementemente receber sua mensagem.
Janeiro de 2019: O responsável pelo contato do Departamento de Inteligência consulta o diretor do Departamento de Status Civil e Passaporte e marca um encontro. O diretor, no entanto, não expressa qualquer opinião, senão afirmar que sua agência tem função meramente executiva. Questionado, o assistente do diretor sugere contactar novamente o responsável por assuntos legais do Ministério do Interior. Três visitas são feitas em seu gabinete, mas ele não está, apesar de concordar em receber a delegação. Em 31 de janeiro, o diretor de assuntos legais diz aos bahá’ís ter enviado uma nova carta a Al-Mubaidin. Apenas em 3 de março, o documento chega às mãos do ministro, mas é prontamente repassado a seu gabinete.
Automação e privação
O processo de naturalização dos bahá’ís foi dificultado pela automação do sistema em 2010.
Al-Masjoun tentou obter cidadania jordaniana em 2007, antes dos procedimentos serem automatizados. Ela anexou seu registro familiar e certificado de casamento bahá’í à solicitação encaminhada ao Ministério do Interior. Na ocasião, a pasta demandou documentos de matrimônio que respeitassem a sharia, como solicitado a cidadãos muçulmanos. Após uma série de explicações e visitas intermináveis ao ministério, Al-Masjoun conseguiu isentar-se desse pré-requisito.
Após toda sua jornada e diante de minha nova pesquisa, o ministério e o Departamento de Status Civil e Passaporte recusaram, no entanto, entregar a nós qualquer informação relacionada ao caso, apesar do dever de concedê-las sob a lei de transparência, conforme requerimentos feitos em 24 de julho e 19 de setembro de 2019.
Um ex-oficial próximo à questão, em condição de anonimato, observou que o Departamento de Status Civil e Passaporte “facilitou as medidas de naturalização com base em documentos de união civil, mesmo na falta de certificados religiosos”. Na prática, segundo o ex-oficial, a resposta depende ainda da mentalidade do oficial responsável pela solicitação, ao aceitar os documentos em mãos, enquanto respeita, todavia, as regulações vigentes. Apesar das considerações de crença, o ex-oficial crê que a naturalização “é questão civil e não religiosa, dado que todos os recursos para tanto são civis, salvo o contrato de matrimônio”.
Hoje, nenhum requerente possui sequer a chance de explicar seu caso ao Departamento de Status Civil e Passaporte; aprovação ou não exige friamente os documentos em anexo, sobretudo o certificado oficial de casamento. O Ministério do Interior se recusa a debater a luta dos bahá’í com a imprensa e o departamento foge da responsabilidade.
Um ex-ministro que ocupou a pasta nos anos 2000, também em condição de anonimato, comentou seus esforços para resolver o problema: “Era mais difícil na época, porque os pedidos dos bahá’ís concentravam-se em reconhecer sua religião … era uma questão político-religiosa” — portanto, bastante relevante ao influente Departamento de Iftaa. No entanto, toda vez que uma saída legal fosse eventualmente encontrada, os apelos eram frustrados, sob receios da reação em massa da maioria islâmica no país. Em nossa entrevista, o ex-ministro sugeriu emendar a lei de nacionalidade para exigir apenas registros familiares, sem a necessidade de documentos de matrimônio, para deferir cidadania às mulheres bahá’ís.
Histórias parecidas
Amjad Al-Nuaimi, casado com uma iraniana bahá’í há cinco anos, recebeu um registro familiar, mas não possui ainda um documento de matrimônio — ambos necessários para registrar sua solicitação eletrônica. Após saber do sofrimento de outros requerentes, Al-Nuaimi recorreu ao Conselho Bahá’í para acompanhar seu caso, junto de outros quinze.
A Jordânia carece ainda de um sistema judicial para questões de união e patrimônio entre os bahá’ís — há apenas o “conselho” que realiza sua união sob costumes religiosos.
A nacionalidade iraniana é marcada como “restrita” — neste contexto, é bastante difícil aos cidadãos iranianos que consigam visto ou residência na Jordânia.
Uma vida adiada
Após grande hesitação, nove mulheres bahá’ís concordaram em falar sobre seus problemas, sobretudo sem cidadania ou emprego, apesar de serem qualificadas.
Após dez anos de burocracia em busca de reconhecimento formal, os bahá’ís sentem-se perdidos em um ciclo vicioso. Sem respostas convincentes por parte das autoridades, os bahá’ís continuam como cidadãos incompletos em um limbo de direitos.
Raízes históricas
A presença dos bahá’ís na Jordânia data de ao menos um século. A comunidade insiste que não representa uma congregação islâmica, mas sim uma religião independente que deriva do Kitáb-i-Aqdas — ou Livro Mais Sagrado. “Os bahá’ís acreditam que Deus é único e expressam seu amor e obedecem Suas ordens; Ele é eterno sem igual; não há como conhecer Sua essência. Os bahá’ís acreditam que todas as fés são uma como Deus é um, embora as manifestações culturais produzam diferentes versões e interpretações sobre o livro de Deus. Portanto, creem em todos os profetas e escritos sagrados”.
Trecho da entrevista com Youssef Mahrakani
Entrevista com Youssef Mahrakani
“Somos iguais ao restante da população; não há diferença alguma. Somente conduzimos reuniões familiares muito simples e recitamos orações para alcançar prosperidade. Um contrato de casamento requer a anuência dos esposos, seus pais e duas testemunhas — ou seja, oito pessoas. O dote deve ser pago, mas é preferível que seja mínimo, isto é, 69 gramas de prata; equivalente hoje a 35 dinares”.
Outros desafios
Dotes, patrimônios e celebrações
Os bahá’ís não tem qualquer autoridade religiosa, pois não são filiados ao Ministério de Recursos Islâmicos ou ao Conselho Eclesiástico. Seus recursos, portanto, não são registrados em seu nome, mas sim como patrimônios individuais — sob pessoa física. Isso leva a problemas de herança à medida que são considerados propriedade privada.
Os bahá’ís são forçados a recorrer a cortes de sharia para distribuir suas heranças. Entretanto, após ser alcançado um consenso, tais patrimônios são partilhados conforme suas próprias determinações religiosas, explica um porta-voz da comunidade. No bahá’ísmo, caso não haja um testamento — embora aconselhado pela fé — as heranças são devidamente repartidas em sete categorias: filhos, cônjuges, pais, mães, irmãos, irmãs e mentores.
Embora algumas propriedades sejam registradas no Departamento de Terras e Estatísticas em nome da comunidade bahá’í, a falta de uma entidade legal devidamente reconhecida leva a disputas entre herdeiros e perda de propriedades. Segundo a Lei n°55 de 2008 sobre Associações, uma organização religiosa não pode registrar-se sem autorização do Ministério de Recursos Religiosos ou do Conselho Eclesiástico — os bahá’ís continuam expostos.
Em geral, comemorações públicas dependem da autorização de instituições administrativas, em âmbito regional, salvo procissões e eventos religiosos. Não obstante, os bahá’ís não se beneficiam dessa mesma exceção, pois carecem de reconhecimento.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.