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A luta contra o terrorismo: Os Estados Unidos e os amigos Talibãs

Autor do livro(s) :Reginaldo Nasser
Data de publicação :Novembro de 2021
Editora :Contracorrente
Número de páginas do Livro :264 páginas
ISBN-13 :9786588470886

“A luta contra o terrorismo: Os Estados Unidos e os amigos Talibãs”, do professor de Relações Internacionais Reginaldo Nasser, aborda o conflito interno e o complexo cenário regional da Ásia Central e Grande Oriente Médio, tomando por base as duas invasões imperiais sofridas pelo Afeganistão em menos de cinquenta anos. Na obra, o docente da PUC-SP enfatiza a presença dos Estados Unidos (e de alguns governos da Superpotência) por duas décadas no país de maioria islâmica, o equivalente a uma geração inteira. Iniciada no segundo ano do governo Bush Jr (republicano), os invasores ali permaneceram nos dois governos de Obama (democrata), na íntegra do mandato de Trump (republicano) e ainda por sete meses da administração Biden (democrata).

No prefácio da orelha do livro, o repórter Jamil Chade nos faz recordar que o Império destinou mais de seis trilhões de dólares na chamada “guerra contra o terror”, após o 11 de setembro de 2001 (importante lembrar que o primeiro “onze de setembro” foi o golpe no Chile em 1973). Paradoxalmente, a chamada “mancha salafista” (como a do norte da África e os países subsaarianos) só faz aumentar, crescendo o número de militantes-alvo e também o número de vítimas desta “guerra sem fim e sem fronteiras definidas”.

Além das necessárias e evidentes análises e denúncias a respeito do Império anglo-saxão e seus aliados destacados – como os países-membros da OTAN e do Sistema Cinco Olhos – o livro de Nasser traz o mérito de reconhecer a complexidade intra-asiática, para além de um “continuum” do Grande Jogo derivado do final do século XVIII, quando a expansão dos impérios britânico e russo-czarista ali se chocaram. Ao trazer para a língua portuguesa e difundir nos meios acadêmico, jornalístico e também na militância anti-imperialista, a obra possibilita um primeiro contato com as concepções e capacidades de organização social do Mundo Islâmico e, em especial, da potência regional Paquistão.

O aparelho militar e de inteligência paquistanês é em si o “pivô geopolítico” que opera na seca “fronteira” contínua, com mais de 2.500 quilômetros de extensão. A virada de Islamabad após a derrota de 1971 e a perda do Paquistão Leste foi ao encontro da necessidade do Afeganistão em ter sítios seguros onde pudesse abrigar ao menos uma pequena parcela da geração de refugiados, entre 1978 e 1988.

No subcapítulo 2.9, Paquistão: um amigo de ocasião, o autor afirma:

“Um dos primeiros desafios que os  EUA deveriam enfrentar no campo  da política internacional era garantir a cooperação do Paquistão. A localização estratégica do Paquistão ao lado do Afeganistão e o envolvimento de seu governo nesse país, desde a invasão soviética no final da década de 1970, tornaram-no um jogador-chave” (p.99).

“A ajuda do Paquistão para derrubar o regime talibã levou Pervez Musharraf para  o estrelato…Mas apesar destes desenvolvimentos promissores, a paz e a estabilidade eram passageiras. Havia um êxodo preocupante de combatentes do Afeganistão para o Paquistão, bem como  novas rugas perturbadoras da complexa teia de alianças entre os Talibãs, os combatentes da Al-Qaeda e os militares paquistaneses” (pp.99-100).

Outra virtude do livro é narrar a genealogia do moderno Talibã e as relações com a Al Qaeda através de três lideranças reconhecidas. O egípcio Ayman al-Zawahiri (atual número um da rede outrora liderada pelo que segue), o saudita de origem iemenita Osama bin Laden e o afegão mulá Muhhamad Omar. Este último representa as raízes afegãs e pashtun, mas também as conexões diretas com o Inter-Services Intelligence (ISI, Inteligência Inter-Serviços, o aparelho de espionagem que faz o enlace entre os sistemas e serviços das três forças armadas do país).

“Desde o início, o Talibã encontrou apoio no Paquistão. Embora mantivessem vínculos com outros grupos insurgentes afegãos, os paquistaneses viram no Talibã a forma mais eficaz para encerrar a guerra civil e consolidar sua influência sobre o Afeganistão. O ISI estava confiante de que poderia controlar a liderança do Talibã e usar a organização para solidificar a proeminência do Paquistão no país” (p.47).

Quando os Estados Unidos invadem o Afeganistão, o desenho já estava montado, sendo as redes do Talibã as únicas com coesão interna, relações exteriores e amparo no ISI com capacidade de assegurar uma luta de longo prazo. Ao “apostar em governos fantoche” e “senhores da guerra”, Washington e seus “gênios” simplesmente ignoraram as lições da história recente, negando as evidências de que o território do país seria praticamente incontrolável. A ordem social era garantida apenas pelo Talibã e nenhuma outra instituição conseguiu superar barreiras étnicas ou sectárias e isso não só se manteve, como foi sendo ampliado mesmo durante os momentos mais intensos da guerra promovida pela OTAN.

Nas considerações finais, Reginaldo Nasser recorda que a maior ameaça terrorista dos EUA vem da extrema direita estadunidense e que a “guerra ao terror” reforça essas posições do pacto neoconservador e dos tele-evangelistas. Trump não foi eleito no vazio político. “O ambiente para a sua ascensão política foi preparado ao longo de uma década e meia de belicismo xenófobo e messiânico de Washington, com raízes que remontam a séculos de política supremacista branca. Os ataques ao Capitólio, em janeiro de 2021, foram o ápice desse movimento.” (p.257)

Já a retirada dos gringos do Afeganistão pode ser representada pelo abandono da Base Aérea de Bagram. “Um comandante do exército afegão descreveu que os militares norte-americanos deixaram Bagram no meio da noite, como ladrões. Eles simplesmente desligaram a energia elétrica e deixaram para trás uma grande quantidade de equipamentos descartados.” (p.261)

Afeganistão, o cemitério de impérios, deixa mais um pelo caminho…

ASSISTA: MEMO conversa com Reginaldo Nasser

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