Temos presenciado um debate sobre os motivos que têm levado a uma aproximação do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) com a República Islâmica do Irã, e vice-versa, apesar de divergências em alguns aspectos da luta de resistência no Oriente Médio e sobre temas relativos à geopolítica regional.
Penso que a resposta é que o Hamas acredita que a causa de libertação palestina deve ser a questão central das forças que lutam por direitos e por justiça. Nesse sentido, o país persa ocupa um lugar de destaque no chamado Eixo da Resistência, que envolve o Irã, a Síria, o Hezbollah libanês, as Forças de Mobilização Popular (Kaitab Hezbollah) do Iraque, os Houthis do Yemen, a Jihad Islâmica e a Frente Popular palestinas, a Frente Polisario do Saara Ocidental, entre outros movimentos.
Os laços de amizade, cooperação e apoio da República Islâmica do Irã com a resistência palestina, embora não tenham tanta visibilidade, vêm se estreitando continuadamente no calor da luta contra a ocupação colonial sionista. Um passo no estreitamento dessa relação foi simbolizado num telefonema do ministro das Relações Exteriores do Irã, Hossein Amir Abdollahian, para o chefe do Birô Político do Hamas, Ismail Haniyeh, parabenizando pelo aniversário dos 34 anos da fundação do Movimento de Resistência palestino, comemorado no dia 14 de dezembro último.
Abdollahian descreveu o Hamas como um pioneiro na libertação da cidade sagrada de Al Quds (Jerusalém), afirmando que “Hoje, a resistência desempenha um papel fundamental na realização dos direitos históricos do povo palestino.”. O ministro iraniano condenou a posição da Grã-Bretanha em designar o Hamas como “grupo terrorista”, numa clara posição contrária ao povo palestino.
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Haniyeh agradeceu e elogiou a personalidade e o inestimável apoio do ex-comandante da Força Al Quds, General Qasem Soleimani, que foi martirizado em um ataque terrorista dos EUA, perto do aeroporto de Bagdá, em 3 de janeiro de 2020. “Nós lembramos o General Soleimani com honra e agradecemos o apoio da República Islâmica do Irã à causa palestina e a resistência ao longo dos anos que passaram desde a vitória da Revolução Islâmica.”
A relação com o Irã tem avançado a passos largos e sólidos, sendo que várias delegações do Hamas visitaram o país persa para conversas bilaterais no sentido do apoio e da modernização da capacidade militar da resistência palestina. Em janeiro de 2020, Haniyeh foi a única personalidade não iraniana a discursar durante o velório do General Soleimani, quando o classificou como “mártir de Jerusalém”.
O Hamas escolheu aliar-se ao Irã, apesar das divergências no seu interior, sobretudo no que diz respeito à questão da guerra na Síria, ao Iraque, ao relacionamento com os estados árabes do Golfo, bem como ao seu anseio político de se distanciar de quaisquer eixos ou polarizações extremas à região.
Essa aproximação estratégica pode resultar em uma política hostil em relação ao Hamas por parte de outras potências regionais, especialmente Arábia Saudita, Egito e Emirados Árabes. Ao mesmo tempo, essa aliança tem gerado discordâncias por parte da Autoridade Palestina e do Fatah, que consideram a política de eixos regionais absolutamente prejudicial aos palestinos e, desse modo, que o Hamas não deveria se envolver com os iranianos.
Apesar do apoio, o Irã não oferece um cheque em branco ao Hamas, porque esse relacionamento, embora estratégico, é cercado de muitas complexidades, tendo em vista que os iranianos possuem reservas e receios em relações ao Hamas e a até que ponto suas instituições podem impedir uma maior influência iraniana ou uma eventual dependência do movimento quanto aos persas.
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Haniyeh tem se empenhado por um diálogo estratégico entre os países do Golfo Pérsico, o Irã e outros partidos regionais, entre eles o Hezbollah libanês, a fim de redesenhar as características geopolíticas da região para enfrentar os desafios e perigos que isso envolve. Um dos desdobramentos desse esforço do líder do Hamas foi a realização de exercícios militares conjuntos das forças da resistência palestina realizados em dezembro de 2020, que contaram com a cooperação iraniana.
O líder do Hamas em Gaza, Yahia Al-Sinwar, revelou, num encontro com jornalistas e ativistas palestinos, que o Irã fornece há anos os recursos necessários para a industrialização militar das Brigadas Izzi ad-Din al-Qassam, o braço armado do Hamas. Esse fornecimento se deu mesmo no período mais crítico da crise entre o Movimento e o Irã, em decorrência da crise na Síria. O apoio persa permitiu o desenvolvimento de armas estratégicas, entre elas foguetes e mísseis de maior alcance, como o Ayyash 250-K e Qassam 400, desenvolvidos e fabricados no território de Gaza, capazes de atingir Tel Aviv e Haifa, as duas cidades mais importantes do território atribuído a “Israel”.
O apoio iraniano se deu por interferência direta do General Qasem Soleimani perante a liderança iraniana. Foi por intermédio do general que o Irã ajudou a equipar a resistência, que estava de mãos vazias, permitindo o enfrentamento, em melhores condições, o regime sionista, que, mesmo com toda sua petulância, foi obrigado a pedir o cessar-fogo durante o embate de maio de 2021, devido às novas condições militares da resistência e ao uso dos seus mísseis de maior alcance.
Enquanto isso, os regimes autoritários árabes trabalham abertamente para minar a resistência palestina, visando ao Hamas e outras facções, como a Jihad Islâmica e a Frente Popular, e realizam vultosas doações à Autoridade Palestina, acusada de arrefecer os esforços da resistência contra a ocupação. Alguns desses regimes, como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e o Egito, impõem todo tipo de dificuldades aos palestinos que viajam pela Travessia de Rafah, que é basicamente a única porta de entrada e saída de Gaza.
No diálogo de 14 de dezembro, ao que tudo indica, essas relações se consolidaram ainda mais, com Abdollahian declarando que “Hoje, a resistência desempenha um papel fundamental na realização dos direitos históricos do povo palestino”, enquanto Haniyeh estendeu suas calorosas saudações e as do povo palestino ao líder da Revolução Islâmica no Irã, Imam Sayyed Ali Khamenei, e ao presidente iraniano Ebrahim Raisi.
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O sentido estratégico desse relacionamento pode ser traduzido na mensagem enviada a Ismail Haniyeh pelo aiatolá Ali Khamenei, quando disse que “a República Islâmica do Irã, como no passado, tem um dever religioso e humano, baseada nos princípios da Revolução Islâmica, não poupará esforços para apoiar o povo palestino oprimido e restaurar seus direitos e afastar do povo palestino o regime sionista falso e usurpador.”
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