Na última segunda-feira (3) a atriz britânica Emma Watson, conhecida por interpretar Hermione Granger na franquia Harry Potter, foi caluniada como “antissemita” por oficiais israelenses. Outras acusações de militantes sionistas emergiram a seguir.
Todavia, é importante notar que o governo da ocupação sempre fabricou calúnias de “antissemitismo” contra seus detratores. A política remete à própria criação do Estado de Israel, durante a Nakba ou “catástrofe”, em 1948, sobre as valas comuns do povo palestino.
Os primeiros a sofrerem tamanha difamação foram os próprios palestinos. Alegações falaciosas de antissemitismo, propagadas por Israel e pelo lobby sionista, para depreciar o movimento de solidariedade internacional são, portanto, uma extensão do projeto colonial sionista e seus métodos de desinformação a fim de marginalizar a população nativa.
Diplomatas e propagandistas israelenses defendem há décadas que a resistência palestina ao roubo de suas terras não decorre de uma noção de injustiça, mas sim de um suposto racismo antijudaico. Segundo a mentalidade orientalista e imperialista eurocêntrica, tamanha discriminação seria misteriosamente endêmica às sociedades árabes e islâmicas. Trata-se de um notório absurdo. Não apenas absurdo, uma mentira racista e absolutamente tóxica.
Os palestinos opõem-se ao movimento sionista — e sua criação direta, o Estado de Israel — porque este promove a expulsão, os massacres, o apartheid, a intervenção militar e a expropriação de seus pais, seus filhos e mesmo seus netos. O fato de Israel designar a si mesmo como “estado judaico” é irrelevante. Os palestinos opõem-se a qualquer projeto político semelhante ou equivalente que decida expulsá-los de suas próprias terras.
Neste contexto, justamente porque as injustiças da ocupação se tornaram cada vez mais nítidas a mais e mais pessoas, o movimento sionista decidiu escalar suas acusações de “antissemitismo”. Os marqueteiros de Israel sabem muito bem que não podem vencer o debate com base em argumentos. Portanto, tentam silenciar os ativistas ao difamá-los, vetá-los da discussão pública e — no caso dos palestinos — mesmo encarcerá-los.
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Não obstante, as falsas alegações de “antissemitismo” contra os críticos da ocupação tornaram-se tão transparentes que sua credibilidade declinou vastamente. Em um passado recente, tais difamações representavam um componente tão poderoso do arsenal israelense quanto seus armamentos nucleares jamais declarados. A retórica perde agora a tração.
Tudo isso nos leva ao caso de Emma Watson.
The Israeli government is now openly and unambiguously saying that any form of solidarity with Palestinians makes you an "anti-Semite". #ItWasAScam https://t.co/iQKcAxsaQ6
— Asa Winstanley (@AsaWinstanley) January 4, 2022
Asa Winstanley denuncia difamação israelense contra a solidariedade ao povo palestino
No início deste ano, a conhecida atriz britânica compartilhou em seu Instagram uma declaração bastante franca de solidariedade com o povo palestino. Junto de uma montagem de manifestações com bandeiras palestinas, Watson deixou a mensagem: “Solidariedade é um verbo”. Trata-se de uma declaração naturalmente pouco controversa; todavia, o simples reconhecimento do ativismo palestino incitou o ódio de militantes sionistas.
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Danny Danon, ex-embaixador israelense nas Nações Unidas e atual presidente do ramo internacional do partido Likud, respondeu a postagem em sua página do Twitter, ao caluniar Watson como “antissemita”. Evidentemente, como de costume, Danon não apresentou qualquer evidência para embasar suas acusações. Contudo, o diplomata israelense foi bastante direto, sem qualquer pretensão de nuance, e deixou absolutamente claro que o menor comentário a favor dos palestinos seria interpretado como “antissemita”.
Muitos comentaristas, entretanto, deixaram de apontar dois fatos importantes: primeiro, que o verdadeiro racista neste episódio é o próprio Danny Danon; segundo, que sua mensagem demonstra que Danon, assim como o projeto sionista como um todo, é o verdadeiro antissemita. A cobertura da grande mídia sobre a postagem de Watson e sua recepção — manchetes do The Guardian chegaram a mencionar uma “onda de antissemitismo” — ignoraram precisamente quem é Danny Danon; isto é, um notório extremista antipalestino.
Como disse Nora Barrows-Friedman, em texto publicado pela página The Electronic Intifada: “Danon é um político de extrema-direita que reivindica o ‘suicídio nacional’ dos palestinos e possui um longo histórico de incitação racista contra árabes e africanos”.
O cineasta e fotógrafo Jonathan Kennedy constatou no Twitter: “Equiparar a solidariedade aos palestinos ao antissemitismo pressupõe que a repressão contra o povo palestino é uma qualidade inerentemente judaica; um pressuposto de fato antissemita”.
Equating support for Palestinians to antisemitism presumes that repression of the Palestinian people is an inherently Jewish quality, which is the real antisemitic sentiment here.
— Jonathan Kennedy (@getradified) January 3, 2022
Jonathan Kennedy observa pressupostos verdadeiramente antissemitas nas acusações de Israel
Apreensivos sobre a resposta da opinião pública, alguns sionistas de esquerda minimizaram as agressões de Danon como “grosseria”. Seus receios são justificados. A repercussão negativa contra o ex-embaixador viralizou rapidamente. Danon foi contestado, ridicularizado e denunciado por seu histórico hediondo e suas graves acusações. Ainda assim, ao contrário da preocupação dos sionistas de esquerda sobre o declínio das acusações falaciosas de antissemitismo, essa mudança é bem vinda — de fato, há muito esperada.
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