Nesta semana, o partido político Fatah confirmou estar apartado do povo palestino e mesmo das condições de vida sob ocupação, ao “reafirmar sua confiança unânime no presidente Mahmoud Abbas” — que acumula a liderança do Fatah, da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e da Autoridade Palestina (AP), sobre a qual não possui mandato legítimo.
Os delírios do Fatah não poderiam ser mais distantes dos apelos populares pela renúncia de Abbas, sobretudo após a execução extrajudicial do ativista e opositor Nizar Banat, em custódia dos serviços de segurança de seu governo, no último ano. Lamentavelmente, Abbas possui aliados suficientes para abafar vozes dissidentes no cenário palestino. Não é que os palestinos não tenham voz, mas sim que a comunidade internacional já os demarcou pela concessão hipotética de dois estados, ao descrever a OLP como “único representante” da população. Israel define a Palestina por critérios de exclusão. Abbas apoia efetivamente ambas as posturas.
Dessa forma, o que exatamente apoia o Fatah quando proclama “unanimemente” a confiança em seu líder? Suas medidas, incoerentes como sempre, representam uma capitulação ainda maior a Israel. Desde o assassinato de Banat, quando milhares de palestinos manifestaram abertamente sua oposição a Abbas, o político octagenário percebeu seu destino diante do povo. Em seu estilo notavelmente autoritário, Abbas voltou-se então a Israel e aos Estados Unidos. Tais esforços correspondem ao personagem, dado que sua autoridade perdeu qualquer confiança entre os palestinos. Os encontros de Abbas com o Ministro da Defesa de Israel Benny Gantz permitiram à Autoridade Palestina se agarrar a um filete de poder. A única razão para o êxito político desse diálogo é justamente décadas de marginalização do povo palestino. Assim como a assistência humanitária tornou-se prioridade na falta de direitos democráticos, a liderança em Ramallah manteve-se impune por concessões simbólicas e pactos políticos.
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Abbas tomou as manchetes no último ano ao ameaçar Israel com um ultimato para encerrar a ocupação militar da Palestina dentro de um ano. No entanto, capitulou novamente ao estado sionista ao obstruir a coleta de evidências sobre os crimes de guerra perpetrados nos territórios ocupados, a serem encaminhadas ao Tribunal Penal Internacional (TPI) — arbitrariedade pouquíssimo surpreendente, mas que fede a exploração do povo palestino. Dessa forma, Abbas não apenas opôs-se aos direitos políticos de seus conterrâneos, como também objetou a menor chance, ainda que tardia, de obter justiça sobre os evidentes crimes perpetrados contra a população. Tudo isso foi feito em troca de promessas vagas do ministro israelense, representante de um governo hostil que desdenha publicamente da liderança palestina. De fato, o regime israelense não preocupa Abbas, desde que possa preservar seu ganha-pão como colaboracionista da colonização — a serviço da própria ocupação, dos Estados Unidos e da conivente comunidade internacional.
O Fatah limitou então as fronteiras palestinas por meio de seu incongruente, embora estratégico, apoio a Abbas. O movimento decerto confia que seu presidente continuará a auxiliar Israel no processo de expropriação das terras nativas — atitude da qual não resta a menor dúvida, sobretudo entre o povo palestino. É precisamente por essa razão que Abbas está onde está; é por isso que a Autoridade Palestina e seus serviços de segurança promoveram Oslo, em primeiro lugar. Contudo, a Palestina é muito mais que Abbas. É uma terra de gente resiliente que não vai a lugar algum e continuará a lutar por seus direitos legítimos. Os palestinos não merecem um líder como Abbas, mas terão de conviver com seu legado mesquinho. Boa parte da luta popular tem de dedicar-se agora a superar a presente definição da Palestina, meramente como alvo de uma eventual aniquilação. É isso que fornecerá aos palestinos esforços unânimes contra a hipocrisia de Abbas e do partido Fatah.
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