A Comissão Australiana de Direitos Humanos investigará uma queixa de discriminação racial contra o governo federal da Austrália, acusado de advogar em nome de Israel. Em um esforço para modificar a política externa do país, o palestino-australiano Nasser Mashini acusou o país de violar suas leis antirracistas ao não reconhecer as violações dos direitos humanos cometidas por Israel, prejudicando os cidadãos palestinos-australianos.
A queixa argumenta que ao não reconhecer Israel como “uma potência ocupante” e suas “violações do direito internacional”, o governo federal tem causado enorme angústia aos palestinos-australianos e que o discurso sujeita os australianos de herança palestina à discriminação contínua, levando as pessoas a acreditar que os palestinos são agressores e não vítimas.
Após a recente designação do Hamas como terrorista, Mashini escreveu que “o governo australiano continua a trair suas obrigações sob o Direito Internacional de progredir continuamente os direitos humanos de todos os grupos étnicos na Austrália igualmente. Abandonando mais uma vez os palestinos-australianos!”
The Australian government continues to betray its obligations under International Law to continually progress the human rights of all ethnic groups in Australia equally.
Abandoning Australian Palestinians yet again! https://t.co/ZLm3L1SE2j
— Nasser Mashni (@iamthenas) February 17, 2022
Nasser Mashini afirmou ao RN Breakfast, da ABC Austrália, que ele e sua família sofriam discriminação cotidiana no país – em um caso, seu filho foi comparado a um terrorista por um professor na escola – e que o preconceito poderia ser motivado pelas ações do governo em sua política externa. “É realmente prejudicial”, disse o Sr. Mashni. “Tudo o que pedimos ao governo australiano é que seja equilibrado, que fale de uma maneira equilibrada. Hoje, eles não são”.
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Ao site australiano SBS News, Mashni afirmou que a Austrália não é honesta quando discute sobre Israel, e por isso não cumpriu suas obrigações de progredir nos direitos humanos de todos os grupos étnicos do país. “Como australianos-palestinos, estamos inevitavelmente na retaguarda porque o governo australiano toma uma posição muito centrada em Israel. Ele nega nossa humanidade”. O advogado é vice-presidente da Rede de Defesa da Austrália-Palestina (APAN, na sigla em inglês) e contou que ainda tem familiares na Palestina e as terras de seu vilarejo foram expropriadas por Israel para dar lugar a assentamentos israelenses; “é uma catástrofe humana”.
Após o governo ter feito declarações em defesa de Israel durante o brutal bombardeio a Gaza e ter participado de um lobby contra a investigação do Tribunal Penal Internacional sobre crimes de guerra cometidos por Israel, o advogado acusa o país de ter discriminado os seus cidadãos palestinos. Após o cessar-fogo em Gaza, em maio passado, a Ministra das Relações Exteriores da Austrália, Marise Payne afirmou que “o Estado de Israel tem inquestionavelmente o direito de se defender de acordo com o direito internacional”.
Investigada pela Comissão Australiana de Direitos Humanos, a acusação alega que o governo violou a seção 9 da Lei de Discriminação Racial. Moustafa Kheir, advogado que representa Mashni, reconhece que não é uma queixa típica. “É diferente na medida em que ele analisa como a política externa de um governo afeta seus cidadãos. Como uma política externa pode fazer um cidadão se sentir como se não fosse igual dentro do país”, afirmou ao RN Breakfast.
Para o SBS, o advogado da Brichgrove, Moustafa Kheir, também afirmou que a queixa é legalmente significativa por ser a primeira de seu tipo. “Deveria haver consequências legais locais para os governos que apóiam os Estados-nação estrangeiros na realização de roubos de terra e violações diretamente contra grupos raciais ou étnicos, onde cause danos discriminatórios locais”, disse ele em uma declaração. “Esta situação é muito distinta de outras questões internacionais na medida em que o governo australiano assumiu um papel muito ativo no apoio a Israel para evitar pressões internacionais”.
A especialista em direito internacional e direitos humanos Amy Maguire, professora associada da Universidade de Newcastle, disse ao programa da ABC que se tratava de uma reclamação incomum. “Eu mesma não vi nada parecido com isto”, disse ela. “A queixa mais típica de discriminação racial seria, por exemplo, quando a um indivíduo fosse negada uma oportunidade de emprego por causa de sua raça ou talvez lhe fosse negada a entrada em um local licenciado por causa de sua raça”.
Ela disse que era improvável que a reclamação fosse bem sucedida, mas caso fosse bem sucedida, “criaria um precedente muito importante que alteraria fundamentalmente os efeitos habituais da lei de discriminação na política pública australiana”.
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