O documentário “o Golpista do Tinder” foi lançado no começo de fevereiro e desde então permanece na lista do top 10 dos filmes mais assistidos da Netflix. O filme conta a história de um homem israelense que aplicou golpes milionários em mulheres através do aplicativo de encontros Tinder.
No site de relacionamento, o homem se apresentava como Simon Leviev, herdeiro de uma empresa lucrativa de venda e compra de diamantes. Em seu perfil, exibia inúmeras fotos de viagens pelo mundo, estadias em hotéis cinco estrelas, muita festa e, entre outros luxos, um jatinho particular.
Em um jogo de sedução, Leviev conquistava as mulheres com discurso amoroso e presentes, transmitia a imagem do bom moço que estava a procura de um relacionamento sério e duradouro. Suas promessas iam além de uma vida de luxo, ele dizia que queria casar e ter filhos com a mulher “amada”.
Após meses e com a conquista de estabilidade no relacionamento,o golpista dava o bote. Em uma encenação digna de cinema, com envio de fotos e vídeos dele sendo perseguido e do seu segurança todo machucado, com muito sangue, Simon Leviev dizia às vítimas que estava em perigo e sua vida corria risco. Assim, conseguia tirar dinheiro das mulheres com a promessa de pagar depois, algo que nunca viria acontecer. Ele afirmava que não poderia usar seus cartões de créditos para não ser localizado pelos “inimigos” e, numa forte manipulação psicológica, o golpista fazia as mulheres pegarem empréstimos bancários e também pedia o cartão de crédito delas emprestado.
Não se sabe ao certo quanto Simon Leviev conseguiu roubar, a estimativa gira em torno de milhões de dólares, de acordo com o documentário. Apenas uma de suas vítimas perdeu cerca de U$$ 200 mil (mais de R$ 1 milhão).
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A história do golpista muda seu rumo ao cruzar com a norueguesa Cecilie Fjellhøy, que após perder todas suas economias e se afundar em enormes dívidas devido a encenação e manipulação do israelense, procura a imprensa local e denuncia os crimes que sofreu. A partir daí, os jornalistas iniciam uma investigação que levaria a outras vítimas do golpista do Tinder e descobriria outros crimes de Simon Leviev, que na realidade possuía outro nome, Shimon Yehuda Hayu.
Nascido em Tel Aviv, em 1990, o golpista israelense, de família judia ultra-ortodoxa, saiu foragido de Israel, onde era procurado por golpes de estelionato. A investigação jornalística descobriu também que Leviev já havia sido preso na Finlândia, onde cumpriu pena por 3 anos por aplicar golpes em mulheres.
Entre as vítimas encontradas pelo jornal norueguês, estão a sueca Pernilla Sjoholm, que era amiga dele e também perdeu uma pequena fortuna, e a holandesa Ayleen Charlotte, que estava namorando com ele e também já tinha perdido muito dinheiro com o relacionamento.
O documentário da Netflix foi feito a partir da reportagem do jornal norueguês VG e a prisão do israelense na Grécia, onde usava passaporte falso, se deu, devido a denúncia dos jornalistas à Interpol. Simon Leviev ou melhor Shimon Yehuda Hayu foi extraditado para Israel, julgado e condenado a 15 meses de prisão e multado em cerca de US$ 50 mil (cerca de R$ 250 mil) para compensar suas vítimas, valor que não chega nem perto do que ele usurpou das mulheres.
A prisão do golpista israelense durou cinco meses apenas. Foi libertado, segundo as autoridades de Israel, por causa da disseminação do coronavírus nas prisões israelenses.
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Apesar das provas contundentes incriminando o golpista, como recibos de empréstimos, fotos, vídeos e áudios do Whatsapp, ele nega todas as acusações. Tanto a multa aplicada como a pena sentenciada é um insulto às vítimas do israelense.
Mas afinal, porque Israel protegeu o golpista do Tinder com uma pena tão branda?
Cotidianamente, Israel comete crimes nos territórios ocupados ilegalmente, crimes de guerra, crimes de Apartheid relatados e comprovatos por ongs internacionais e até mesmo ong israelense, como a B’Tselm.
Há muita hipocrisia em soltar um criminoso como Shimon Yehuda Hayu sob o argumento do perigo de mantê-lo preso por causa do coronavírus e ao mesmo tempo manter crianças, mulheres, jovens, homens e idosos, até mesmo doentes – todos palestinos, em prisões israelenses, muitos até mesmo encarcerados sem acusação ou julgamento.
A única resposta que consigo ver para a pergunta que compõe o título deste artigo é simples: Israel protege criminosos por ser também um Estado criminoso que naturaliza sua violência cotidianamente. Não há uma verdadeira justiça para os crimes do israelense Simon Leviev porque também não é regra julgar e punir colonos, soldados, cidadãos e autoridades israelenses que violam os direitos palestinos todos os dias.
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