A organização não-governamental Repórteres Sem Fronteiras (RSF) publicou um relatório sobre como a imprensa estatal do Egito — ou empresas afiliadas ao regime militar de Abdel Fattah el-Sisi — estão disseminando uma campanha difamatória contra jornalistas críticos.
Os ataques são coordenados e seguem um padrão específico. Primeiro, um âncora insulta um profissional de mídia na televisão. Em seguida, boatos são propagados por milhares de contas falsas nas redes sociais, mobilizadas para defender o governo e atacar opositores.
Entre os apresentadores que empregam tais métodos estão Ahmed Moussa, Nashaat Al-Dihy, Mohamed El-Baz e Mostafa Bakry — figuras próximas ao aparato repressivo do governo, que lograram posições de poder na imprensa egípcia desde a ascensão de Sisi, em 2013.
Jornalistas críticos são rotulados como “inimigos da pátria” e contrapostos com repórteres “patriotas” que supostamente impedem investidas contra o exército e a nação.
Com frequência, profissionais de mídia são vinculados à Irmandade Muçulmana — grupo criminalizado após o golpe militar de Sisi — e indiciados por “terrorismo”.
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Por exemplo, uma manchete da imprensa estatal sobre Khaled el-Balshy, diretor da rede de notícias Daaarb e ex-vice-presidente do Sindicato dos Jornalistas do Egito, declarou: “Figura diabólica el-Balshy explora receios do público para publicar fake news sobre o estado”.
Em ofensiva contra Yosri Fouda, ex-apresentador da BBC e Al Jazeera, declarou a comunicação do regime: “Yosri Fouda está entre aqueles que detestam o estado egípcio e suas instituições”.
Sobre a jornalista libanesa Liliane Daoud, deportada do Egito: “Não, senhora. Você não é filha deste país. Você é filha de outra coisa. Você foi expulsa do Egito porque não tem moral. Você não merece viver entre os egípcios. O Egito a abrigou e protegeu, mas a senhora é uma cobra peçonhenta; por isso, foi descartada. Nosso país é digno demais para gente como você”.
Outros jornalistas alvejados incluem Lina Attalah, articulista acusada de publicar textos críticos com intuito de obter recursos estrangeiros, e o repórter investigativo Hossam Bahgat, acusado de conspirar com Estados Unidos e Europa para angariar apoio a sua “causa”.
O aparato de Sisi descreve Bahgat como “indivíduo suspeito com uma rede de contatos internacionais”
As mulheres são um alvo particular de ataques degradantes. Esraa Abdel Fattah foi acusada de não usar o véu islâmico (hijab), com objetivo de incitar ataques reacionários. Em seguida, fotos da jornalista de biquini foram difundidas exaustivamente pela televisão estatal.
Na ocasião das calúnias, os jornalistas são também detidos e torturados. A campanha de Sisi obteve êxito em criar uma atmosfera de medo no país. Repórteres são estigmatizados e não conseguem exercer seu trabalho.
Ao longo de seu governo, o presidente e general egípcio tomou controle da mídia privada e reforçou seu controle sobre as agências estatais. O relatório descreveu este processo como “sisificação” da imprensa.
Caso a prática não seja interrompida, pode culminar na aniquilação completa da já agonizante imprensa independente do Egito, advertiu o documento do RSF.
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