Líderes da Igreja Anglicana manifestaram coletivamente sua preocupação sobre o “impacto em potencial” da eventual mudança da embaixada do Reino Unido em Israel da cidade de Tel Aviv a Jerusalém ocupada, após declarações neste sentido da nova primeira-ministra Liz Truss durante reunião com seu homólogo israelense Yair Lapid, em setembro.
Em raríssima intervenção, um porta-voz confirmou à rede Middle East Eye que o arcebispo de Canterbury, Justin Welby, está “apreensivo” sobre a medida. “O arcebispo está apreensivo sobre o impacto em potencial de mudar a embaixada de Tel Aviv a Jerusalém, antes que seja firmado um acordo negociado entre palestinos e israelenses”, destacou o porta-voz. “[Welby] mantém contato com líderes cristãos na Terra Santa e continua a orar pela paz de Jerusalém”.
A mudança da embaixada seria uma reversão histórica na diplomacia britânica. O Reino Unido sempre defendeu que sua embaixada em Tel Aviv é parte de uma política duradoura segundo a qual o status da cidade depende de negociações.
Caso cumpra sua promessa, Truss seguirá os passos do ex-presidente americano Donald Trump, que – a despeito da lei internacional – transferiu a embaixada dos Estados Unidos a Jerusalém, em reconhecimento formal da “soberania” israelense sobre a cidade ocupada.
Conservadores discutem a medida
A declaração significa que as Igrejas Católica e Anglicana concordam sobre os riscos de Londres transferir sua embaixada a Jerusalém – considerada sagrada por judeus, cristãos e muçulmanos. O arcebispo de Canterbury tornou público sua apreensão horas após a maior liderança católica no Reino Unido escrever a Truss para adverti-la contra a medida. “Esta mudança da embaixada seria prejudicial a qualquer possibilidade de paz duradoura na região, assim como à reputação internacional do Reino Unido”, reiterou o cardeal Vincent Nichols, arcebispo de Westminster.
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Segundo o cardeal, o Papa Francisco e os líderes eclesiásticos radicados em Israel e Palestina – isto é, na Palestina histórica, conforme os mapas que antecedem a Nakba ou “catástrofe”, em 1948 – “pedem há tempos que o status internacional de Jerusalém seja respeitado, de acordo com resoluções relevantes da Organização das Nações Unidas”.
Posições prévias e outros relatos indicam que outras igrejas no Reino Unido devem também se opor à medida. Espera-se que líderes eclesiásticos das mais diversas denominações presentes em Jerusalém expressem seu repúdio às declarações da premiê britânica. Quatro anos atrás, todas as 13 denominações cristãs radicadas em Jerusalém rechaçaram em uníssono a mudança da embaixada promovida por Donald Trump.
Em nota conjunta, reiteraram: “Temos certeza de que tais passos alimentarão o ódio, o conflito, a violência e o sofrimento em Jerusalém e na Terra Santa, ao nos afastar ainda mais do objetivo de união e aprofundar assim a divisão destrutiva entre as partes”.
O Conselho Islâmico do Reino Unido também escreveu ao gabinete de Truss para adverti-la que a medida equivaleria a “legitimar a ocupação ilegal em Jerusalém Oriental”, além de prejudicar “a reputação internacional do estado britânico”.
Os Partidos Trabalhista, Liberal Democrata e Nacional Escocês confirmaram sua contundente oposição à mudança e mobilizaram campanhas para impedir a investida conservadora.
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A mudança da embaixada a Jerusalém ocupada foi sugerida a Truss por uma carta encaminhada pelo grupo de lobby Conservadores Amigos de Israel (CFI), durante um evento de campanha da liderança do Tory neste ano, quando a queda do ex-premiê Boris Johnson se tornou inevitável. Nesta semana, em uma Conferência do Partido Conservador realizada em Birmingham, o grupo sionista voltou a reivindicar a medida.
Jake Berry – presidente do partido – enfatizou seu “compromisso resoluto … em construir fortes laços com o Estado de Israel e apoiá-lo em sua luta para que permaneça seguro [sic] de modo que sua capital em Jerusalém [sic] seja a casa de nossa nova embaixada”.
Na terça-feira (4), o Middle East Eyes publicou uma nota emitida pelo CFI a deputados filiados, na qual apontou que o governo britânico já possui terras na parte oeste de Jerusalém para que sejam destinadas à nova embaixada. Segundo o comunicado, a transferência da embaixada de Tel Aviv a Jerusalém ocupada seria meramente uma “medida burocrática – para reconhecer a realidade em campo”.
Este artigo foi publicado originalmente em inglês pela rede Middle East Eye
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