Portuguese / English

Middle East Near You

Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

A cúpula de Astana e os avanços diplomáticos da Turquia

Presidente da Turquia Recep Tayyip Erdogan discursa durante Conferência de Interação e Medidas de Confiança da Ásia (CICA), em Astana, Cazaquistão, 13 de outubro de 2022 [Murat Kula/Agência Anadolu]

A 6ª Conferência de Interação e Medidas de Confiança da Ásia (CICA), realizada entre 12 e 13 de outubro, atraiu atenção da imprensa global. O presidente turco Recep Tayyip Erdogan viajou ao Cazaquistão a convite de seu homólogo local Kassym-Jomart Tokayev. A viagem de Erdogan e as recentes conquistas da diplomacia turca no decorrer do evento podem ser ponderadas sob dois contextos distintos: primeiro, os novos acordos entre Turquia e Cazaquistão e maior avanço nas relações bilaterais; segundo, o encontro de Erdogan com o presidente russo Vladimir Putin, nos bastidores da cúpula.

Erdogan e Tokayev

Erdogan e Tokayev copresidiram o 4º Conselho de Cooperação Estratégica Turquia-Cazaquistão; neste entremeio, conversaram cara a cara. Com efeito, o presidente turco assinou seis tratado em campos distintos junto de seu homólogo cazaque.

Em termos de comércio, ambos os países confirmaram seu compromisso em melhorar os laços econômicos. O volume de comércio entre Turquia e Cazaquistão aumentou em 66% nos últimos anos e chegou a US$3.5 bilhões. Ambos esperam chegar ao índice de US$5 bilhões em breve, e US$10 bilhões a médio prazo. Além do comércio, corporações turcas parecem interessadas em investir em diferentes setores do Cazaquistão. Segundo o Ministro da Indústria e Infraestrutura Kairbek Usskenbayev, empresários turcos pretendem investir até US$200 milhões no complexo agroindustrial do Cazaquistão.

Robustecer as relações econômicos deve criar condições mutuamente benéficas aos aliados. O avanço de laços entre Turquia e Cazaquistão deve ajudar o primeiro a diversificar suas rotas de importação e exportação e alcançar sua meta de crescimento econômico. Em segundo lugar, as novas oportunidades devem ajudar marcas turcas a fortalecer sua posição no mercado cazaque e propagar seu potencial de investimentos à Ásia Central. Além disso, a aproximação de ambos os países deve reduzir sua vulnerabilidade recíproca a eventuais choques econômicos externos.

Para além da economia, outra prioridade na agenda foi o setor de transportes. Ambos os países são parte fundamental do chamado Corredor Médio. Erdogan confirmou prontidão para ajudar o Cazaquistão na construção de uma fábrica de navios, ao defender a medida como um avanço estratégico significativo. Apesar das vantagens particulares do Corredor Médio, um dos maiores problemas desta rota comercial é precisamente a carência de embarcações. No futuro próximo, a colaboração na produção de navios entre Turquia e Cazaquistão pode solucionar o excesso de tráfego no Mar Cáspio e otimizar o Corredor Médio.

 Putin e Erdogan

Erdogan e o presidente russo Vladimir Putin se encontraram nos bastidores da cúpula cazaque na quinta-feira. Desde o início da guerra russo-ucraniana, o regime turco buscou equilibrar suas relações entre os países em guerra, além de agir como ponte entre Moscou e o Ocidente. Como resultado destes esforços, a Turquia exerceu um papel fundamental ao firmar acordos de grãos e de troca de prisioneiros. Durante o evento, o líder turco reiterou que seu intuito é acabar com o derramamento de sangue assim que possível, apesar dos obstáculos.

LEIA: Rússia transfere US$20 bilhões a Turquia para usina nuclear

Como resultado, dois importantes avanços se sucederam em favor das posições da Turquia em termos político, econômico e estratégico. O primeiro avanço se refere ao acordo de grãos, cujos termos preveem a continuidade das exportações turcas e russas ao exterior, incluindo insumos fertilizantes. Erdogan reiterou a importância consagrada por seu governo ao abastecimento de grãos e fertilizantes, sobretudo a países pobres ou em desenvolvimento. Além de mediar laços políticos e estratégicos entre Rússia e Ocidente, ao robustecer relações com países africanos e outros, amplia o chamado “soft power” da Turquia em todo Hemisfério Sul.

Ademais, o presidente russo propôs transformar a Turquia em um “centro de gás natural” para controlar o fluxo de bens energéticos à Europa. Putin insistiu que, caso o interesse se consolide, seu regime pode construir um gasoduto e um centro de exportação na Turquia, para transferir insumos ao continente europeu. Erdogan confirmou ainda que ambos os lados devem cooperar para construir um centro de infraestrutura energética na região da Trácia, no território turco, e criar assim oportunidades econômicas e empregos. Em termos de implicações econômicas, ao instalar um novo sistema de distribuição e transporte, a Turquia pode desfrutar de novas fontes de receita tributária e aduaneira.

O novo gasoduto deve materializar a posição estratégica e energética da Turquia, dado que seu território já abriga uma série de gasodutos oriundos da Rússia, Azerbaijão e Irã. Além do mais, o novo gasoduto pode assegurar a segurança energética do mercado turco, diversificar suas rotas de importação energética e equilibrar demandas de diferentes países, sobretudo em tempos de crise. Em último caso, exercer um papel de centro energético pode minimizar a possibilidade da Turquia de incorrer em conflitos geopolíticos, ao ampliar a interdependência de Moscou. O novo projeto pode também robustecer a posição de Ancara tanto frente à Rússia quanto União Europeia e criar oportunidades uma abordagem flexível e multifacetada de política externa.

Em suma, os resultados da cúpula de Astana são favoráveis à posição estratégica da Turquia na Eurásia. Por meio dos novos acordos com o Cazaquistão, o governo turco ampliou sua presença política e econômica na Ásia Central. Após sua reunião com Putin, o presidente turco parece ter consolidado sua projeção política, econômica e estratégica na arena geopolítica e distender seu poder de barganha tanto em contato com o Kremlin quanto em relação ao eixo ocidental.

LEIA: Turquia abandona sistema de pagamento russo, cede a pressão dos Estados Unidos

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Categorias
ArtigoÁsia & AméricasCazaquistãoEuropa & RússiaOpiniãoOrganizações InternacionaisRússiaTurquiaUnião Europeia
Show Comments
Palestina: quatro mil anos de história
Show Comments