Teerã recorreu a um software espião para monitorar e controlar manifestantes de todo o país, à medida que prosseguem os protestos contra o governo deflagrados pela morte em custódia de uma jovem cidadã curdo-iraniana.
As informações foram corroboradas por documentos vazados.
Conforme a rede The Intercept, documentos internos – em farsi e inglês – expõem a Autoridade Regulatória de Comunicações (CRA) por usar ferramentas de vigilância contra celulares civis, ao rastrear, decodificar mensagens e bloquear o acesso a internet dos cidadãos.
O spyware SIAM tem um total de 40 funções, incluindo rastreio, roubo de mensagens e redução da capacidade de internet a cobertura 2G. O aplicativo não somente impede o acesso a internet, como facilita a decodificação de mensagens – em particular, devido às limitações da rede 2G.
Por meio da ferramenta, operadores da agência vigiam número conectados a torres de sinal, ao monitorar manifestantes e compilar metadados para compor sumários detalhados de contatos dos alvos, assim como seus padrões de comunicação e localidade.
As provas do uso de espionagem pela CRA foram reveladas entre anos e anos de mensagens de e-mail e documentos compartilhados por funcionários da Ariantel – operadora de comunicação móvel que opera no país. As correspondências implicam também empreiteiros externos e oficiais do governo.
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Os registros foram obtidos por um hacker que alega ter acesso aos sistemas da Ariantel.
Segundo Gary Miller, chefe de pesquisa do centro de pesquisa Citizen Lab, a evidência esclarece “relatos de imprensa de usuários [iranianos] que tiveram dificuldades em acessar seus celulares durante os protestos”.
Embora o uso de spyware por Teerã não seja surpresa, prosseguiu Miller, “o acesso direto que o governo requer para controlar múltiplos telefones ou aparelhos individuais dentro de uma certa área, incluindo sua capacidade de controlar a velocidade de dados, é revelador”.
Bloquear o rastreamento é um desafio aos manifestantes, admitiu Miller. “Desligar o aparelho e usá-lo somente em certas condições pode ser eficaz; contudo, outras tecnologias que não o uso de redes móveis devem ser a única maneira de driblar os mecanismos de controle”.
Desde a morte de Mahsa Amini (22) duas semanas após ser detida pela polícia de moralidade, o Irã foi tomado por protestos populares que resultarem em centenas de mortos. A polícia insiste que Amini teve um ataque cardíaco; sua família denuncia tortura.
Catorze mil pessoas foram presas durante os protestos de massa, incluindo 253 estudantes, até então. A revelação de que Teerã apelou a um spyware confirma sua infraestrutura de controle de massa adotada contra ativistas e dissidentes e reflete receios de novas prisões e perseguição política pelas autoridades.