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Copa do Mundo: trabalho escravo na construção civil aproxima Catar e Brasil

No Brasil, em 12 anos, foram resgatados 2.742 profissionais da construção civil de situação análoga à escravidão
Mais de 6.500 trabalhadores imigrantes da Índia, Nepal, Bangladesh, Paquistão e Sri Lanka morreram na construção de estádios e outras obras da Copa do Catar - ILO/Apex Image

Condições degradantes de trabalho, alimentação insuficiente e de má qualidade, excesso de jornada, tráfico de trabalhadores sem experiência para atividades de alto risco. Enquanto as atenções se voltam às primeiras partidas da Copa do Mundo da Fifa de futebol masculino, essas são algumas das condições a que os trabalhadores no Catar são submetidos.

As críticas em torno da escolha do país árabe como sede já eram conhecidas e ganharam fôlego com novas denúncias sobre as condições dos trabalhadores. Em um relatório publicado no início deste mês pelo grupo de direitos humanos Equidem, os trabalhadores relatam rotina de trabalho forçado baseada na cultura do medo e da xenofobia – 90% dos 2,8 milhões de habitantes do país vieram de outras regiões. Além disso, os operários relatam um esforço dos empregadores para escondê-los durante as inspeções da Fifa e a ocorrência de mortes.

Essa, contudo, não é uma realidade apenas do Catar, situações semelhantes são encontradas nos canteiros de obras brasileiros. Nos últimos 12 anos, 2.742 pessoas foram encontradas em situação análoga à de escravo na construção civil no Brasil, segundo dados do Ministério do Trabalho e Previdência. O pico de resgates aconteceu em 2013, quando o país realizou um grande investimento em obras de desenvolvimento e infraestrutura para receber a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas do Rio (em 2016) e também no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento.

A pressa para a conclusão das obras agrava a falta de compromissos das empresas com a segurança dos trabalhadores. Na Copa do Mundo de 2014, por exemplo, nove brasileiros morreram na construção de estádios – que se somaram aos mais de 1.400 trabalhadores da construção civil que foram vítimas de acidentes fatais entre 2010 e 2014, de acordo com informações do Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (AEAT) .

LEIA: Copa do Mundo no Catar: Empresas ‘escondiam trabalhadores’ durante inspeções em estádios, aponta relatório

Não há uma estimativa de quantos trabalhadores morreram em obras de preparação para a Copa e o governo do Catar não garante transparência sobre isso.

A Organização Internacional do Trabalho afirma que, em 2020, houve pelo menos 50 mortes e 500 feridos relacionadas ao trabalho naquele país. No começo do ano passado, o jornal inglês The Guardian publicou uma estimativa de 6.571 mortes de trabalhadores de Bangladesh, Índia, Nepal, Paquistão e Sri Lanka no Catar entre 2010 e 2020, sem afirmar quantos estavam atuando na preparação da Copa.

A Copa do Mundo no Catar e seus problemas [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

“Tanto no Catar quanto no Brasil, foram acidentes trabalhistas passíveis de serem evitados. Uma análise de risco adequada, uso de equipamentos de proteção, treinamento dos trabalhadores, tudo isso são fatores que poderiam ter evitado essas mortes”, afirma Giuliana Cassiano, auditora fiscal do Ministério do Trabalho.

A mão-de-obra da construção civil tanto aqui quanto no país sede da Copa não são muito diferentes. A maior parte dos trabalhadores encontrados em situações degradantes nos canteiros de obras são jovens e negros que saem de regiões pobres com pouca oferta de emprego. Normalmente, são aliciados ilegalmente e partem para locais que apresentam um “boom” de crescimento – conjunto de características que possibilitam a superexploração do trabalho.

Apesar de, no Brasil, a maioria dos resgatados da escravidão na construção civil serem brasileiros, também já houve resgates de haitianos e de cidadãos de outras nacionalidades. No Catar, os explorados são estrangeiros.

O quadro piora com a exigência de metas e a possibilidade de terceirização e subcontratação. “Isso pulveriza a responsabilidade e desemboca nas costas do trabalhador, que é quem paga o preço dessa estrutura de descaso”, pontua Christiane Nogueira, procuradora do trabalho. “São raízes profundas de desrespeito e de violações da dignidade dos trabalhadores, como se não tivessem direitos”, completa.

Publicado originalmente em Brasil de Fato

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