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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Catar entregou a Copa do Mundo; agora, que traga paz à Palestina

As Torres Al-Jabir na área da cidade de Lusail, na capital do Catar, Doha, iluminadas com a bandeira palestina, 10 de agosto de 2022 [@PalCyberNews/Twitter]

A Federação Internacional de Futebol (FIFA) – entidade repleta de falhas – preferiu ignorar uma torrente de acusações de corrupção de que “vendeu” seu maior campeonato ao multibilionário Catar. Todas as alegações foram contestadas pelas partes envolvidas. Todavia, foram publicadas pelos prestigiosos repórteres investigativos do chamado Insight Team, no jornal Sunday Times, da cidade de Londres.

Caso comprovadas as denúncias, o Catar não deveria receber o torneio em curso. As evidências foram encaminhadas a um comitê da Câmara dos Comuns do Reino Unido, em meio a uma dura campanha global – muitas vezes, sensacionalista – para contrapor as chances do pequeno país do Golfo de sediar o evento esportivo mais popular do planeta. Somas de dinheiro escandalosas supostamente molharam as mãos de oficiais da FIFA. Os rumores persistiram e os torcedores se viram entre o entusiasmo de acompanhar a Copa do Mundo e apelos para boicotá-la.

Para agravar a questão, a mídia ocidental mobilizou-se para antagonizar o Catar e árabes locais fatalmente se viram no fogo cruzado. Com 17 dos 22 membros do Comitê Executivo da FIFA que elegeram Rússia e Catar como sede das Copas do Mundo de 2018 e 2022 – respectivamente – banidos ou afastados por suspeitas de corrupção e outros crimes, a controvérsia parece não ter fim. A FIFA pode estar diante de danos irreversíveis a sua imagem, embora logre o conforto de um rendimento recorde de £6.3 bilhões oriundos de uma das edições mais polêmicas na história das Copas.

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Caso acreditemos em apenas uma fração das denúncias, o governo catariano venceu o leilão da Copa do Mundo FIFA, ao derrotar vizinhos enciumados, como Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, que certamente tampouco pouparam recursos para sabotar o evento.

A conjuntura de fato me aflige: senão como amante do futebol, também como muçulmana que preza pelos direitos humanos e deseja ver um mundo melhor no qual todos são tratados como iguais. Quem sabe, uma utopia, mas com a qual vale a pena sonhar.

As arenas no Catar se encheram de vida, erguidas por verdadeiros exércitos de operários, cujos familiares no Paquistão, na Índia e em Bangladesh estão entre as comunidades mais pobres do planeta. Ainda assim, os trabalhadores se orgulham de ganhar a vida a duras penas – por vezes, sob salários precários – nos estados do Golfo.

Então, por qual motivo, ao invés de investir tamanho capital nos esforços de sportswashing, em nome de uma relação mais branda com o Ocidente, os países árabes não aprendem algo com o magnífico esporte? O grau de interação e rivalidade amistosa entre os torcedores do torneio de futebol no Catar é impressionante. Vale o mesmo para atletas e apoiadores em todo o planeta, cuja interação é construtiva tanto dentro quanto fora do campo.

Se o Catar e seus vizinhos do Golfo realmente desejam seduzir seus aliados no Ocidente, talvez, a primeira coisa que tenham de fazer é unir suas frentes e abdicar de onerosas rivalidades que incorreram na compra de prestigiosos eventos internacionais por playboys e príncipes da região. A aquisição dos direitos de receber corridas de Fórmula 1, entre outras competições – incluindo golpe, boxe e futebol – é repleta de denúncias de corrupção. Entretanto, o que o mundo árabe realmente demanda é alguém que acabe com os conflitos sem fim entre seus povos, uma força unificadora capaz de estabelecer um código ético e honesto em nome da paz mundial.

Árabes esnobam mídia de Israel na Copa do Mundo do Catar – Charge [Sabaaneh/ Monitor do Oriente Médio]

Segundo Lamis Andoni, analista político e jornalista palestina, jamais houve um líder “capaz de mobilizar as ruas ou moldar o pensamento político dos povos árabes” como o ex-presidente do Egito Gamal Abdel Nasser, entre 1954 e 1970. Lamis argumenta que Nasser personificou a luta anticolonial em seu momento histórico, assim como moldou estruturas do pensamento político moderno dentre os árabes, tornando-se assim um dos mais influentes líderes globais de então. A luta de Nasser pela independência árabe e seu apoio a movimentos revolucionários o colocou na vanguarda dos países emergentes do Sul Global contra o Norte imperialista – em particular, na Palestina ocupada.

“Nossa jornada à Palestina não verá adiante um tapete vermelho ou areias amarelas”, observou Nasser. “Nossa jornada à Palestina será coberta de sangue … Para que libertemos a Palestina, a nação árabe deve se unir, os exércitos árabes devem se unir, e precisamos instituir um plano de ação unificado”.

Lamentavelmente, já não há líderes assim no Oriente Médio e Norte da África, salvo nos livros de história. Ao contrário, temos governantes ostentosos, obcecados com arranha-céus cada vez maiores. O tamanho, parece, é tudo o que importa ao ditador e general egípcio Abdel Fattah el-Sisi, que depôs o presidente eleito democraticamente Mohamed Morsi em 2011, para construir um edifício de quase 400 metros de altura, na futura capital do país.

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Outro nome célebre – e profundamente desprezado – nos anais da história do Oriente Médio é o do Lorde Arthur Balfour, então chanceler inglês que assinou a hedionda Declaração Balfour e ratificou a criação do Estado de Israel, em detrimento de milhões de vidas palestinas. A carta de 2 de novembro de 1917 abriu espaço para que o estado sionista se impusesse na Palestina, por meio de terrorismo, limpeza étnica e brutal ocupação militar.

Pois vale pergunta: a atual safra de líderes árabes carece de imaginação para enxergar os louros que lograriam caso levassem a paz o Oriente Médio? Novamente, digam-me que sonho demais, mas é inconcebível tamanho tempo e esforço para edificar a Copa do Mundo FIFA nas areias do minúsculo Catar, sem compará-los com o investimento em potencial na luta por justiça do povo palestino. De fato, as recompensas e benefícios seriam incomensuráveis.

Os povos do mundo árabe nunca se esqueceram da Palestina e mantêm, quase universalmente, seu apoio aos direitos legítimos de autodeterminação e retorno dos refugiados da Nakba – em árabe, “catástrofe”, como é chamada a criação do Estado de Israel, em 1948 –, assim como de seus descendentes. Numerosas bandeiras e lenços palestinos apareceram nas arquibancadas da Copa do Mundo no Catar, junto de símbolos do país-sede e das torcidas de Tunísia e Marrocos. Houve até mesmo uma expressão de solidariedade ao povo palestino durante a partida entre Inglaterra e País de Gales, em 29 de novembro. A FIFA, como sabemos, proibiu que torcedores do time escocês Celtics exibissem bandeiras palestinas durante os jogos. Logo, é uma surpresa, embora grata, ver que torcedores no Catar lograram de sua liberdade para mostrar seu amor e apoio à causa palestina.

O presidente da FIFA Gianni Infantino, embora arrogante, esteve certo ao acusar a imprensa do Ocidente de “hipocrisia” por concentrar-se exclusivamente no histórico de direitos humanos no Catar, quando defendeu a escolha da sede às vésperas do torneio, na cidade de Doha. Infantino falou por mais de uma hora. Indignado com o fato de que as denúncias – incluindo homofobia e abusos trabalhistas – pudessem ofuscar o evento, Infantino, nascido na Suíça, chegou a afirmar que a Europa deveria se desculpar por seu próprio passado, ao invés de gastar tamanha energia na questão dos trabalhadores imigrantes no Catar. Insistiu Infantino: “Hoje, estou emocionado. Hoje, sinto-me catariano, sinto-me árabe, sinto-me africano, sinto-me gay, sinto-me deficiente, sinto-me um trabalhador imigrante”.

Sua declaração, quem sabe, poderia nos impressionar caso somasse: “Sinto-me palestino”. Mas sua tremenda exibição de privilégio branco não foi tão longe. Imagino quanto deste monólogo foi motivado pela pressão sobre a FIFA e o Catar para que entregassem uma Copa do Mundo em plena transparência e honestidade.

Os governantes catarianos decerto conquistaram algo impossível, ao trazer a Copa do Mundo a seu país, contra todas as hipóteses. No entanto, o que farão agora?

Há uma multidão em Tel Aviv preparada para apontar dedos sujos de sangue e outros crimes às violações do Golfo. O futuro premiê israelense Benjamin Netanyahu – sim, ele está de volta – é investigado por propina, fraude e crimes de responsabilidade. Netanyahu nega as denúncias; no entanto, fica a questão. Já que a corrupção e hipocrisia de Israel é tão flagrante e notória, e que estes mesmos crimes estão no DNA da Autoridade Palestina, sinto-me convencida de que Doha e seus peritos em diplomacia são mais do que qualificados para convencer seus primos e irmãos da frivolidade da guerra, da violência e – sobretudo – da ocupação em curso na Palestina.

O prestígio de levar a paz ao Oriente Médio carregaria o líder responsável por esse ambicioso projeto à estratosfera da política global e faria da arrebatadora conquista da Copa no Mundo no Catar algo diminuto. Seu nome certamente estaria reservado à história junto de Nasser. Diante do sucesso da Copa do Mundo, o emir catariano Tamim Bin Hamad al-Thani parece em posição privilegiada para tomar essa missão em suas mãos e liderar a busca por paz no Oriente Médio. Todo o resto será insignificante. Al-Thani teria a admiração de todo o mundo árabe; ao mesmo tempo, seria capaz de arrematar desconfianças de seus aliados no Ocidente.

Portanto, parabenizo o Catar pela Copa do Mundo. Mas peço a seu governante que aproveite o momento para lutar por um sonho quase impossível, um sonho de paz na Palestina ocupada e em todo o Oriente Médio. Use a fortuna a seu dispor em nome de benesses de longo prazo, ao invés de mero agrado aos hipócritas e colonizadores. Doha entregou a Copa do Mundo; agora, que traga paz à Palestina.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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