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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Intifada das Chuteiras

Interior do estádio Al Bayt antes da partida entre Inglaterra e EUA do Grupo B da Copa do Mundo da FIFA 2022 , em 25 de novembro de 2022 em Al Khor, Catar [Eddie Keogh - The FA/The FA via Getty Images]
Interior do estádio Al Bayt antes da partida entre Inglaterra e EUA do Grupo B da Copa do Mundo da FIFA 2022 , em 25 de novembro de 2022 em Al Khor, Catar [Eddie Keogh - The FA/The FA via Getty Images]

A “copa do ódio”, como está sendo chamada pelos jornalistas israelenses, seria uma demonstração da intolerância e brutalidade dos torcedores árabes. O próprio governo de Israel recomendou evitar o uso de bandeiras e símbolos israelenses ou judaicos, bem como se abster do idioma hebraico em público. No entanto, a hostilidade desferida contra esses profissionais de mídia israelenses pode ser vista como uma dose homeopática do próprio veneno.

As alegadas agressões registradas pelos jornalistas israelenses são apenas a recusa de torcedores de todo o mundo — portanto, não apenas árabes — em conceder entrevistas a eles e aos seus veículos. Na maioria dos casos, ao identificarem que o correspondente é israelense, os árabes, especialmente, viram as costas e vão embora. Quando muito, pronunciam um “Palestina Livre” ou “Israel não existe” e seguem seus caminhos.

Realmente, em condições normais, a hostilidade contra a imprensa israelense seria reprovável, ou mesmo inadmissível. Entretanto, ela é amena e inofensiva diante do que acontece aos jornalistas palestinos na Palestina ocupada por Israel.

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O que diria Yaser Murtaja se o soldado israelense apenas dissesse “a Palestina não existe” e virasse as costas para ir embora ao invés de atirar — provavelmente com munição expansiva — em seu estômago? Nunca saberemos o que Murtaja diria, porque o soldado israelense não se comportou como os torcedores na Copa do Catar, mas sim como sempre se comportam as forças de ocupação israelenses: atirou para matar! Murtaja morreu naquela mesma noite. Ele foi assassinado em Gaza, enquanto cobria a Grande Marcha do Retorno, em abril de 2018. Ele usava colete a prova de balas e capacete, ambos o identificando como profissional de imprensa.

Como será que Attiya Darwish veria a situação caso um soldado israelense apenas dissesse “a Palestina não existe” e virasse as costas para ir embora ao invés de disparar uma granada de gás em seu rosto? Attiya não enxerga bem, pois perdeu o olho. Ele também foi tratado pelos soldados de Israel com mais severidade do que são tratados no Catar os jornalistas israelenses: foi atingido enquanto cobria a Grande Marcha do Retorno, em dezembro de 2018, quando também usava colete a prova de balas e capacete timbrado imprensa, que havia emprestado de um colega de profissão para trabalhar naquele dia.

Fotojornalista Muath Amarneh é resgatado após ter o olho atingido com uma bala de borracha por forças israelenses durante a cobertura de um protesto contra o muro da separação e assentamentos judaicos na cidade de Hebron (Al-Khalil), Cisjordânia, 15 de novembro de 2019 [Mamoun Wazwaz/Agência Anadolu]

O mesmo poderia ser dito de Muath Armaneh, que também perdeu o olho, simplesmente porque o soldado, ao invés de virar as costas para ir embora ou dizer “a Palestina não existe”, preferiu atirar em seu rosto. Ele apenas fotografava uma manifestação em Surif, cidade da Cisjordânia ocupada, em novembro de 2018. Tal qual todos os jornalistas palestinos mortos ou gravemente feridos por Israel, Muath Armaneh usava o colete a prova de balas e o capacete que o identificavam como da imprensa.

Será que Adham al-Hajjar correria atrás de um soldado que virasse as costas para ir embora depois de dizer “a Palestina não existe”? Não faria, mesmo que quisesse! Adham se locomove com dificuldades depois que levou um tiro — provavelmente de munição expansiva — na perna. Sua saída para tratamento fora de Gaza foi recusada pela potência colonial israelense. Adham al-Hajjar também foi baleado enquanto cobria a Grande Marcha de Retorno, em 2018. Como todos os outros, estava identificado como profissional da imprensa no colete balístico e no capacete.

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E o que Sheren Abu Akleh reportaria quanto às violências contra os jornalistas israelenses no Catar? Jamais saberemos. Shereen levou um tiro na cabeça enquanto reportava a violência israelense no campo de refugiados palestinos em Jenin, Cisjordânia, em 11 de maio deste ano. Não bastou estar identificada, ter cidadania estadunidense ou ser jornalista veterana, reconhecida internacionalmente e trabalhar para grandes veículos internacionais de comunicação (cobria pela Al-Jazeera).

A manifestação popular de solidariedade ao povo palestino, bem como, também, aos seus profissionais de imprensa, é o que Israel quer tachar como “Copa do ódio”. Imagino que os jornalistas palestinos adorariam ser tratados com o mesmo “ódio” dirigido aos jornalistas israelenses pelos árabes e não-árabes no Catar. No entanto, nenhum deles teve a mesma sorte!

O que ocorre no Catar é a insurreição contra a ocupação e o apartheid sionista. Se na Palestina, as bandeiras não podem ser hasteadas, na Copa elas são sustentadas por jogadores e tremulam nas mãos de torcidas diante dos olhos da comunidade internacional. Insurreição que, por sinal, em árabe significa “Intifada”. Por coincidência, a primeira Intifada começou em 9 de dezembro de 1987 para exigir os mesmíssimos direitos que ainda hoje os palestinos exigem. Sendo assim, penso que ao invés de “Copa do ódio”, talvez seja mais coerente batizar as manifestações pró-palestinas na Copa do Catar, dentro e fora dos gramados, de “A Intifada de chuteiras”. Esta, diferente das outras intifadas, não tem como a comunidade internacional desviar os olhos, ou o Estado de Israel silenciar seus mensageiros!

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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