Muitas pessoas que migraram do Império Otomano para países da América Latina no século XIX em busca de uma vida melhor, descritos como “Los Turcos”, conquistaram êxito significativo em diversos campos, entre os quais, política, negócios, arte e literatura.
Sucessivas ondas de migração ocorreram do Império Otomano rumo à América Latina, de 1860 ao final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Anos mais tarde, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) intensificou o fenômeno.
Alguns imigrantes foram acolhidos pela primeira vez pela estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, e decidiram ficar na América Latina, embora tenham partido originalmente em direção aos Estados Unidos, com a esperança de verem no horizonte a Estátua da Liberdade.
Boa parte dos imigrantes que aportaram nas Américas, com origens do Oriente Médio, então território otomano, independente de sua nacionalidade, receberam popularmente o apelido de “turcos” – ou “Los Turcos”, em espanhol. Embora alguns árabes, judeus e armênios rejeitem a alcunha, o termo ainda é bastante comum entre os latino-americanos.
Além disso, relações diplomáticas e consulares entre o Império Otomano e alguns dos países da América Latina foram inauguradas no mesmo período.
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De acordo com fontes públicas, a região abriga cerca de 30 milhões de “turcos”, em particular, árabes, muitos dos quais chegaram à região no século XIX com passaportes otomanos.
Por que a América Latina?
Entre as razões para migrar rumo à América Latina estão as dificuldades econômicas pós-guerra, mudanças demográficas e dinâmicas internas. A maioria dos imigrantes aportou no Brasil, Chile e Argentina, enquanto outros se estabeleceram em Honduras, El Salvador e Colômbia.
Em torno de 103 mil cidadãos “otomanos” se assentaram na Argentina até 1920. Deste modo, “Los Turcos” se tornaram a quarta maior nação de imigrantes no país, após italianos, espanhóis e russos muito antes estabelecidos.
Desenvolvimentos políticos, sociais e econômicos na América Latina também estiveram ligados às causas da migração em massa para a região. De fato, o incipiente desenvolvimento industrial criou riqueza no novo continente, junto de um mercado para atividades comerciais de interesse regular para os imigrantes do Oriente Médio.
Enquanto isso, devido ao passado colonial da América Latina, a chegada de imigrantes era vista como ameaça à identidade de seus países pelas elites regionais de origem europeia. Imigrantes “turcos” foram expostos a discriminação cultural e religiosa em seus países anfitriões. Em 1927, por exemplo, o governo do México aprovou uma legislação que discriminava árabes em geral, incluindo palestinos, sírios e libaneses, além de turcos, armênios e outras minorias.
Chefes de estado “turcos”
Os descendentes de “Los Turcos” têm posições-chave na cena política e empresarial da região, bem como no comércio em geral. Imigrantes “otomanos” ganharam voz na política de diversos países latino-americanos, particularmente Argentina, Brasil, El Salvador, República Dominicana, Equador e Paraguai.
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Dentre os exemplos contemporâneos estão o presidente salvadorenho Nayib Bukele, cujo pai é de origem palestina; o presidente paraguaio Mario Abdo Benítez, libanês pelo lado paterno; e Luis Abinader, presidente da República Dominicana, cujo pai é tem raízes libanesas.
Michel Temer, ex-presidente do Brasil, e o ex-presidente do Equador, Jamil Mahuad, têm origem libanesa. O ex-presidente da Argentina, Carlos Menem, entre 1989 e 1999, possui ascendência síria, cuja família havia emigrado do então Império Otomano.
Turcos famosos
Além da vida política e mercantil, muitos latino-americanos de origem “otomana” conquistaram reconhecimento global com êxito considerável em áreas da cultura, ciência, esportes e artes.
A cantora colombiana Shakira, vencedora de 16 prêmios Grammy, e Salma Hayek, atriz, diretora e produtora nascida no México, estão na vanguarda desses exemplos.
Outros árabe-latinos proeminentes incluem o magnata mexicano Carlos Slim, oitavo homem mais rico do mundo, de acordo com a Forbes, e os escritores brasileiros Raduan Nassar e Milton Hatoum, além do ilustre ator argentino Ricardo Darín.
Também existem organizações culturais ou sociais administradas por comunidades imigrantes da região em quase todos os países da América Latina. O exemplo mais marcante é o time de futebol profissional Club Deportivo Palestino, de Santiago do Chile, com 103 anos de tradição. A comunidade palestina no país é a maior da região, com quase meio milhão de pessoas.
No Chile, palestinos abarcam ainda um grupo influente de legisladores e políticos filiados aos mais distintos partidos – muito embora unidos sobre a causa palestina.
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