A Turquia escolhe seu próximo presidente na próxima semana, em 14 de maio de 2023, em um pleito que pôs o incumbente Recep Tayyip Erdogan, do partido Justiça e Desenvolvimento (AK), contra o líder da oposição Kemal Kilicdaroglu, do Partido Republicano do Povo (CHP).
Não importa quem vença, o controverso membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) deve manter relações de cordialidade com a Rússia, como faz há anos apesar de muitas outras mudanças drásticas na política externa do Estado turco.
As informações são da agência de notícias Reuters.
Segundo analistas, diante da contundente crise econômica na Turquia, Erdogan se viu obrigado a remendar relações com regimes antes duramente criticados por seu governo, como Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Israel.
A invasão russa da Ucrânia e seu impacto na economia global também bateu à porta, de modo a tornar inoportuna a demanda para que Erdogan escolhesse um lado, após vinte anos no poder, se evadindo habilmente de tais pressões.
Uma aproximação com o regime militar do Egito e mesmo esforços para normalizar laços com a Síria de Bashar al-Assad, em guerra civil há 12 anos, ganharam tração.
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“A guinada se deu por necessidade e não por escolha”, comentou Fatih Ceylan, chefe do Centro de Política de Ancara, think tank radicado na capital turca. Neste entremeio, a Rússia também se tornou um vizinho com o qual a Turquia teve de trabalhar, acrescentou Ceylan.
A Turquia conduz certo malabarismo diplomático desde o início da guerra na Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022. Ancara se opõe às sanções ocidentais e busca manter contato com ambos os lados em conflito, seus vizinhos no Mar Negro. Não obstante, criticou brevemente as ações do Kremlin, em certas ocasiões, e enviou drones armados a Kiev.
“A Turquia não pode se dar ao luxo de ostracizar a Rússia”, prosseguiu Ceylan. “Trata-se de um vizinho poderoso e temos fortes laços econômicos e comerciais recíprocos, diretamente ligados a nossos interesses nacionais”.
O presidente russo Vladimir Putin e seu homólogo turco, Erdogan, participaram virtualmente da cerimônia de inauguração da primeira usina nuclear da Turquia, em abril, construída com ajuda da corporação nuclear moscovita, Rosatom.
Putin saudou o projeto como “pioneiro”, ao “fortalecer a parceria multifacetada bilateral”.
Neste contexto, as eleições gerais da Turquia – ao executivo e ao parlamento – são vistas, quem sabe, como as mais importantes da história moderna do país.
A crise no custo de vida, devido a uma enorme inflação, erodiu a popularidade de Erdogan nos anos recentes e pesquisas de opinião mostram que seu oponente, Kilicdaroglu, lhe ultrapassou nas intenções de voto.
“Qualquer nova crise em política externa pode afetar ainda mais a economia”, comentou Birgul Demirtas, professora de Relações Internacionais na Universidade Turco-alemã de Istambul.
Nova postura?
Moscou teme que uma mudança de governo possa aproximar Ancara do Ocidente, reconheceu Ahmet Kamil Erozan, vice-presidente do chamado Partido do Bem (IYI), parte da coalizão de seis partidos oposicionistas.
“Precisamos fazer um balanço com Rússia e Estados Unidos no primeiro dia de governo, porque a política externa de Erdogan era personalista”, insistiu Erozan, visto como candidato à vaga de ministro de Relações Internacionais, em caso de vitória de Kilicdaroglu.
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A Turquia, contudo, buscará reduzir sua dependência energética sobre insumos russos de 50% de sua demanda a 30%, prometeu Erozan, também ex-diplomata.
Devido a seu bom relacionamento com o Kremlin, o governo de Erdogan conquistou, no último ano, um acordo mediado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para reaver a exportação de grãos ucranianos dos portos do Mar Negro.
A ponderação turca sobre Moscou não deve mudar caso Kilicdaroglu substitua Erdogan, afirmou Ceylan, que também serviu como emissário de Ancara na OTAN. Entre as relações turco-russas, estão setores como turismo, gás natural, grãos e comércio agrário.
Kilicdaroglu prometeu, por sua vez, “uma continuação sã e viável das relações com a Rússia”, além de construir relações com Washington, com base na confiança mútua.
A aliança opositora prometeu reverter uma série de políticas de Erdogan, mas disse, entretanto, que pretende priorizar a diplomacia em favor dos interesses nacionais, à medida que abandona o estilo combativo que caracterizou a política externa turca da última década.
As mudanças em Ancara foram bem-acolhidas por rivais regionais, mas o relacionamento com a União Europeia permanece complicado. Erozan insiste na meta de plena filiação ao bloco, com base em princípios como direitos humanos e democracia.
Conforme Demirtas, é fato que a oposição planeja reverter o Estado a parâmetros tradicionais, ancorados na orientação ao Ocidente. “Porém, sua ênfase na igualdade de relações com todos os agentes internacionais – Europa, Estados Unidos e Rússia – parece notável”, acrescentou.
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