A vida de ambos os lados da fronteira nominal entre Faixa de Gaza e Israel começou a voltar ao “normal” neste domingo (14), após um cessar-fogo mediado pelo Egito suspender cinco dias de bombardeios israelenses contra áreas civis, que resultaram em 34 mortos.
Desde a madrugada de terça-feira (9), o exército ocupante investiu pesadamente contra a faixa costeira, tendo como resposta disparos de foguetes do movimento de Jihad Islâmica.
Conforme o armistício, Israel reabriu as travessias para bens e serviços, ao permitir a retomada do envio de combustíveis à única usina de energia elétrica de Gaza. Lojas e escritórios públicos também foram reabertos e pessoas voltaram às ruas após dias de reclusão.
Líderes de ambos os lados confirmaram compromisso à trégua, mas deram suas interpretações distintas aos termos do pacto, por exemplo, no que concerne a execução de alvos da resistência palestina por parte de Israel.
A última escalada – a maior desde os dez dias de guerra em 2021 – começou com uma série de ataques aéreos israelenses nas primeiras horas de terça, sob pretexto de eliminar comandantes da Jihad Islâmica.
O grupo disparou mais de mil foguetes em retaliação. O lado israelense, contudo, desfrutou de abrigos antibombas, enquanto edifícios palestinos eram reduzidos a escombros.
Em algumas áreas do sul do território designado Israel, perto de Gaza, as escolas permanecem fechadas e parte dos residentes ainda não retornou a suas casas.
“Não é simples voltar de uma situação como essa”, afirmou Gadi Yarkoni, prefeito israelense na região de fronteira, à rádio local.
Oficiais de saúde palestinos confirmaram que ao menos 33 pessoas, incluindo crianças, foram mortas em Gaza. Em Israel, uma mulher palestina e um trabalhador palestino faleceram.
Mohammad al-Hindi, membro da Jihad Islâmica que participou das negociações no Cairo, disse em nota que o grupo está pronto para suspender os disparos desde que Tel Aviv deixe de atacar casas, áreas civis e alvos filiados ao movimento de resistência.
“Estamos comprometidos com a calma desde que o inimigo respeite o acordo”, destacou.
Israel, contudo, negou tais compromissos, ao insistir que suspenderá a ofensiva desde que não sinta que haja “ameaças”.
“Digo e repito: quem quer que nos ataque, que tente nos atacar ou queira nos atacar no futuro terá seu sangue derramado”, declarou o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu a seu gabinete de governo durante a reunião semanal em Jerusalém ocupada.
Netanyahu insistiu à televisão que suas forças “concluíram com êxito cinco dias de combate com o grupo terrorista Jihad Islâmica”, sem sequer mencionar o acordo de cessar-fogo.
O Hamas, grupo islâmico que governa Gaza, não participou abertamente dos combates. Tel Aviv alegou que seus ataques tampouco buscaram atingir líderes ou estruturas do Hamas.
Quanto tempo durará o cessar-fogo é algo incerto. A última escalada sucedeu em somente uma semana outra rodada de disparos na calada da noite. Ambos os lados mantiveram fogo ao passo que a trégua era redigida e finalizada.
“Continuaremos a fazer tudo que for preciso com uma única consideração: aquilo que sirva aos interesses de segurança do Estado de Israel”, acrescentou o político de extrema-direita Bezalel Smotrich, ministro das Finanças do governo de Netanyahu.
“Lidamos com um golpe sério da Jihad Islâmica, mas ainda não resolvemos o problema de Gaza. Este é um problema que demanda uma solução muito mais drástica”, sugeriu Smotrich, em seu costumeiro tom belicista.
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Em Gaza, a população tirou o dia para recolher seus pertences das ruínas após dias de intensos bombardeios que destruíram ou danificaram centenas de casas. Apesar do alto índice de baixas civis, Israel insiste em ter alvejado centros de comando da Jihad Islâmica.
Dentre os mortos, estão líderes do movimento, abatidos em suas casas junto de esposa e filhos. Vizinhos civis se tornaram “dano colateral”.
“Aqui é meu quarto. Aqui estavam meus brinquedos e livros, mas não sobrou nada”, comentou Ritaj Abu Abeid, de apenas 12 anos, ao avistar os escombros de onde dormia.
Maddah al-Amoudi, de 40 anos, um dos três mil pescadores de Gaza, agradeceu o cessar-fogo, mas reiterou que continua impedido de trabalhar devido ao cerco militar israelense que assola o território costeiro há 16 anos.
“Não temos opção exceto o mar”, reafirmou al-Amoudi. “Se podemos trabalhar no mar, nossas crianças têm o que comer. Se não temos o mar, não temos nada”.