A equipe de pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica (PUC), Bruno Huberman, Reginaldo Nasser e Rodrigo Amaral lançou na plataforma internacional Taylor & Francis uma Special Issue sobre o Imperialismo dos EUA, do Oriente Médio à América Latina após a Guerra Fria. O convite à submissão de artigos acadêmicos para avaliação e eventual publicação acadêmica indica, além da introdução, uma série de tópicos de interesse.
Confira a apresentação do tema orientador:
A consolidação do imperialismo liderado pelos EUA moldou a construção histórica da América Latina e do Oriente Médio como regiões do Terceiro Mundo/Sul Global. O intervencionismo americano durante a Guerra Fria para conter a influência soviética por meio de golpes contra governos nacionalistas transformou os militares em atores políticos centrais em países como Brasil e Egito. Após a Guerra Fria, a Guerra às Drogas na América Latina e a Guerra ao Terror no Oriente Médio tomaram o lugar do comunismo soviético como a maior ameaça externa aos EUA. Isso permitiu a expansão do imperialismo liderado pelos Estados Unidos e a promoção de medidas violentas para a pacificação dos movimentos populares e insurgentes nessas regiões.
O racismo ocidental opera transnacionalmente através de ligações entre o traficante latino-favela e o terrorista árabe-muçulmano como ameaças onipresentes. Essas representações justificam e legitimam as ações imperialistas dos EUA contra a soberania nacional nessas regiões. A mídia dos EUA tem um papel central na representação das populações latinas, árabes e muçulmanas como ameaças à segurança nacional e aos valores ocidentais. Numerosas táticas racistas de securitização visam conter a imigração dessas regiões. As empresas israelenses e americanas de armas e segurança são as que mais se beneficiam com a construção desse medo. A exportação de tecnologia de controle de fronteira israelense para ser usada na cerca EUA-México é um exemplo claro. O caso Irã-Contras demonstra o envolvimento duradouro de Israel na venda de armas e treinamento militar de forças contra revolucionárias na América Latina.
O imperialismo estadunidense também atua por meio da influência do dólar, das doutrinas econômicas neoliberais e das instituições financeiras internacionais. 11 de setembro de 1973 e 2001 foram dois paradigmas para a expansão coercitiva do neoliberalismo no Chile e no Iraque, respectivamente. São exemplos do que Naomi Klein chamou de “doutrina do choque” que permitiu a expansão do neoliberalismo por todo o Sul Global. Os EUA encorajaram a dívida externa e a austeridade por meio do Fed, do FMI, de think tanks e universidades, o que permitiu que o capital ocidental expropriasse os mercados e ativos dos países nessas regiões. A ortodoxia econômica neoliberal manteve a América Latina e o Oriente Médio subdesenvolvidos e dependentes da exportação de bens primários. As elites nacionais e a burguesia se beneficiam do subdesenvolvimento em curso e agem transnacionalmente para reproduzir a dependência, como apontado anteriormente por marxistas do terceiro mundo como Samir Amin e Ruy Mauro Marini.
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A informalidade e a precariedade no trabalho e na moradia são características centrais da vida cotidiana na América Latina e no Oriente Médio além do período neoliberal. Ainda assim, a crise do neoliberalismo em 2007 levou a grandes revoltas em muitos lugares, como os protestos na Turquia e no Brasil em 2013 e os movimentos da Primavera Árabe. Essas convulsões ainda não terminaram, como mostram as revoltas mais recentes contra o autoritarismo neoliberal no Líbano, Iraque, Colômbia e Equador. Essa situação precária também permitiu conexões entre movimentos sociais em ambas as regiões, como a ação da Via Campesina com as populações camponesas do México à Palestina.
A reedição de políticas Sul-Sul, como a Cúpula América do Sul-Países Árabes (ASP) nos anos 2000, é fruto de relações de solidariedade de longa data entre lideranças e povos dessas regiões. Por exemplo, a amizade de Fidel Castro com Gamal Abdel Nasser durante o período tricontinental ajudou a divulgar a importância da reforma agrária para os países do Terceiro Mundo. A criação da OPEP em 1960 também foi determinante na aproximação entre as nações dos continentes de diversas formas. A amizade construída a partir de presentes milionários e casos de corrupção entre o brasileiro Jair Bolsonaro e o saudita Mohamed Bin-Salman fazia parte da candidatura do Brasil à OPEP. Por outro lado, as sanções dos EUA aos produtores de petróleo Venezuela e Irã uniram Hugo Chávez e Mahmoud Ahmadinejad em uma frente antiimperialista.
Sanções contra nações consideradas inimigas da Pax Americana, como Cuba, Venezuela, Irã, Iraque e Síria, não resultaram na derrubada de governos antiamericanos, mas aprofundaram a pobreza, o sofrimento e a violência nos países-alvo. Além disso, as sanções criaram a oportunidade para o surgimento de uma ordem econômica e política alternativa sob a liderança da China. A normalização das relações diplomáticas entre a Arábia Saudita e o Irã, mediada pela China, significou a maior mudança geopolítica do Oriente Médio no século 21 sem o envolvimento direto dos EUA. A China também é o maior parceiro comercial da América Latina e começou a discutir a desdolarização de seu comércio, como aconteceu com o Brasil de Lula.
Aproximar o Oriente Médio e a América Latina por meio do conceito de imperialismo nos permite entender como as estratégias e táticas dos EUA operam de maneira semelhante no Terceiro Mundo/Sul Global, abrindo a oportunidade de fortalecer a solidariedade transnacional contra o imperialismo liderado pelos EUA. Também permite uma concepção mais clara das práticas de domínio político e econômico dos Estados Unidos em todo o mundo, tanto historicamente quanto no presente.
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Os tópicos de interesse incluem:
As ligações entre a Guerra ao Terror patrocinada pelos Estados Unidos e a Guerra às Drogas.
Como o racismo funciona globalmente nas representações das populações da América Latina e do Oriente Médio como ameaças.
O comércio de armas e as conexões de segurança entre as regiões, em particular, o papel desempenhado por Israel.
Processos de securitização contra imigrantes e refugiados da América Latina e Oriente Médio.
As sanções dos EUA e suas consequências econômicas e políticas para a ordem internacional.
As ligações entre os golpes apoiados pelos EUA e a persistência do envolvimento militar na política.
Imperialismo neoliberal, dívida e austeridade promoção da precariedade e repressão de revoltas contra governos autoritários neoliberais.
Conexões entre a burguesia e as elites para a reprodução do subdesenvolvimento.
Mudanças na composição de classes devido a processos de desindustrialização.
Conexões entre intelectuais marxistas que refletem sobre a situação de dependência e subdesenvolvimento.
A questão agrária, o movimento dos camponeses, a violência no campo e a exportação de commodities agrícolas.
Como o movimento do Terceiro Mundo na Guerra Fria influencia as formas contemporâneas de solidariedade e resistência.
Solidariedade com os palestinos e o movimento transnacional de boicote, desinvestimento e sanções contra Israel.
O prazo para submissão de papers vai até 1º de Setembro. Confira.
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