Anistia alerta Europa contra lavar as mãos sobre violações na Tunísia

A Anistia Internacional advertiu a União Europeia contra uma política de omissão em relação aos abusos de direitos humanos cometidos pelo governo na Tunísia, em um artigo publicado originalmente pela rede Politico Europe, na última semana.

O texto é de autoria de Eve Geddie, diretora da Anistia para instituições europeias.

“Todos os representantes do chamado ‘Time Europa’ apertaram as mãos do presidente Kais Saied neste mês de julho, enquanto centenas de milhares de refugiados eram abandonados por suas forças de segurança nas zonas áridas de fronteira com a Líbia, sem água, comida ou teto”, declarou o alerta.

Líderes europeus foram à Tunísia para firmar um memorando de entendimento cujo intuito é conter a migração. Em troca, ofereceram €105 milhões para ‘gestão de fronteiras’ e quase €1 bilhão em empréstimos e outras concessões financeiras, em meio a uma crise econômica sem precedentes no país”.

“Enquanto Tunísia e União Europeia discutem como implementar o acordo, o custo humano já é evidente”, prosseguiu o alerta. “À medida que a Europa lava suas mãos para a crescente repressão aos direitos humanos no país, o povo na Tunísia, incluindo refugiados, migrantes e requerentes de asilo, paga um duro preço”.

“Mesmo após ser alcançado o acordo, autoridades continuam a empurrar seus refugiados à fronteira com a Líbia, onde muitos perecem em necessidade urgente de ajuda humanitária, com relatos de mortes e mais mortes pela mídia internacional”, reiterou. “É chocante que os líderes europeus ainda não condenaram tais violações”.

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A Comissão Europeia busca colaborar com as autoridades em Túnis para impedir a travessia de refugiados pelo mar Mediterrâneo. Segundo a Anistia, tais políticas encorajam “situações abusivas e a hostilidade enfrentada por refugiados na Tunísia”.

“Acordos com objetivo de confinar as pessoas a países não-europeus não salvam vidas nem evitam que recorram a rotas irregulares”, explicou a declaração. “[Refugiados] são forçados a assumir rotas perigosas para evitar intercepção, enquanto contrabandistas lucram”.

O governo na Tunísia é envolto em polêmicas desde julho de 2021, quando o presidente Kais Saied dissolveu o parlamento e passou a governar por decreto. Opositores denunciam golpe de Estado, à medida que críticos são presos cotidianamente.

Neste ano, o discurso de Saied adotou um novo alvo, refugiados subsaarianos, deflagrando uma onda de violência e racismo.

“O acordo da União Europeia ameaça ainda legitimar a escalada de Saied contra o Estado de direito e repressão cada vez maior à dissidência”, comentou o artigo, ao observar que Saied desmantelou contrapesos institucionais, acumulou poderes do judiciário e deferiu uma série de decretos que restringem a liberdade de expressão.

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“As autoridades tunisianas submeteram críticos, oponentes, advogados, jornalistas e juízes a investigações penais arbitrárias e medidas restritivas, ou mesmo os encarceraram”.

“Para garantir que a Europa não se torne cúmplice de violações de direitos e repressão, seu engajamento com parceiros sobre a migração deve ser contingente ou restrito às condições de direitos humanos, análises de impacto e monitoramento”, argumentou a nota. “É preciso uma abordagem equilibrada que promova rotas seguras de migração, com foco em proteger em vez de confinar”.

“A lógica de externalização, da qual o acordo com a Tunísia é apenas um exemplo, é imoral, perigosa e potencialmente ilegal. Não é tarde demais para que os líderes europeus corrijam o curso e aprendam com acordos prévios, que já causaram enorme sofrimento”.

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