Quando um candidato a presidente diz que Justiça Social é uma aberração como fez esta semana Javier Milei na Argentina, e ainda assim arranca aplausos dos que só podem contar com a justiça social para sobreviver, está dado o passe livre para o extremismo da direita avançar.
A experiência desastrosa brasileira, com Jair Bolsonaro, deu às elites do país motivos para se precaver de quem chega com espalhafato prometendo como solução desmontar o Estado, a democracia, os direitos. Daí, as críticas a Milei na mídia privada se reverte em afagos para a outra candidata da direita conservadora, Patricia Bullrich. Mas ambos servem igualmente ao sistema financeiro quando acenam para a entrega do país e algumas medidas tresloucadas.
Ambos querem dolarizar a economia, abrir mais os mercados, cortar gastos sociais. Enquanto isso, o ministro da Economia do atual governo, o candidato Sérgio Massa, tenta o recurso desesperado de empenhar uma boa fatia do PIB em uma melhoria transitória das condições de vida do eleitorado.
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Juntando os votos no segundo turno, os Milei e Bullrich deixam o adversário governista em apuros contra um provável paredão da direita. Mas para qualquer um dos dois direitistas, o melhor dos mundos será conseguir a vaga para disputar com o peronista e carregar o outro a reboque, sem arriscar-se a um segundo turno dividido entre direita e extrema direita
O debate deste domingo na Argentina, que será possível assistir por qualquer meio no país porque o sinal da transmissão será distribuído pela emissora pública, será um segundo teste, após as prévias do PASO que aproximaram os três primeiros candidatos, apesar da vantagem para Milei
Sionismo na disputa
Outro fator que liga Milei e Burllrich é o sionismo que ganha adeptos na América do Sul. Milei se inspira em Jair Bolsonaro e alardeia que pretende banhar-se no Rio Jordão e converter-se ao judaísmo. Mas fora o proselitismo religioso eleitoral, ele pretende seguir o exemplo de outro ídolo – Donald Trump – e transferir a embaixada da Argentina em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém, independentemente do quanto isso atropele os direitos palestinos.
Patricia Bullrich Luro Pueyrredón é um nome tradicional da direita e, de acordo com o site La Haine, “ostenta três sobrenomes oligárquicos, está inserida familiarmente nas aulas terratenientes e seu atual marido, Guillermo Yanco, é um representante dos interesses sionistas na Argentina. O círculo vermelho de grandes empresários e as embaixadas de EEUU e Israel apadrinharam Bullrich, que também contou com o apoio dos multimídia hegemônicos como Clarín e La Nación”.
No mesmo voo
As alianças que provavelmente surgirão no campo da direita caso se confirme um segundo turno contra Sergio Massa, não chegaram ainda a polarizar as ruas como ocorreu no Brasil nas eleições de 2018 e 2022. Se assim fosse, o avião das Aerolíneas Argentinas que partiu neste sábado em direção a Santiago del Estero, local do debate, com parte dos debatedores a bordo, nem teria decolado pela turbulência de eleitores em terra.
Ao aeroporto, para embarcar no mesmo avião, chegaram Javier Milei, sua irmã Karina e sua colega de chapa Victoria Villarruel. Além deles, chegou a concorrente Patrícia Bulrich. E embarcou também a candidata da Frente de Izquierda, Myriam Bregman, seu vice Nicolás del Caño e sua equipe.
Apesar da inusitada coincidência de vôo, houve no máximo uma troca de slogans no saguão do aeroporto. Quando o pessoal da extrema-direita começou a entoar seu grito de campanha: “Vote em Milei, eu sou liberal!”, a turma de Bregman respondeu “Como foi com os nazistas, assim será com eles, onde quer que eles forem, nós iremos buscá-los”.
Na hora do embarque, conforme registrou o site argentino Resumem Latinoamericano ontem, a entrada no avião foi feita em meio a risadas. O adversário Sergio Massa não estava no mesmo voo.
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