No Egito, Lula critica campanha israelense em Rafah, pede reforma na ONU

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, reafirmou nesta quinta-feira (15) que as instituições internacionais estão fracassando em solucionar conflitos geopolíticos e criticou duramente as ações israelenses em Gaza.

“Não tem nenhuma explicação o comportamento de Israel, a pretexto de derrotar o Hamas, está matando mulheres e crianças — coisa jamais vista em qualquer guerra que eu tenha conhecimento”,

declarou o presidente, durante coletiva de imprensa ao lado de seu homólogo egípcio, Abdel Fatah el-Sisi, após reunião entre os líderes na cidade do Cairo.

“Deveríamos estar falando do aumento da produção de alimentos, crescimento econômico e distribuição de renda, mas estamos falando em guerras”, acrescentou.

O presidente chegou ao país na quarta-feira (14), em um momento de tensões regionais devido aos avanços das tropas israelenses em direção à fronteira entre Gaza e Egito.

Lula reiterou oposição aos planos israelenses para expulsar os habitantes de Gaza ao deserto do Sinai, à véspera de uma invasão por terra contra a cidade de Rafah, último refúgio dos palestinos deslocados nas proximidades do Egito, no extremo sul do enclave.

Rafah abriga hoje 1,5 milhão de pessoas — de uma população original abaixo de 300 mil moradores. O Egito e a comunidade internacional, de modo geral, rejeitam veementemente os esforços de transferência compulsória anunciados por Israel.

Segundo Lula:

“O Brasil é terminantemente contrário à tentativa de deslocamento forçado do povo palestino. Por esse motivo, entre outros, o Brasil se manifestou em apoio ao processo instaurado na Corte Internacional de Justiça pela África do Sul. Não haverá paz sem um Estado Palestino dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas”.

Em 26 de janeiro, o tribunal em Haia reconheceu “plausibilidade” da denúncia sul-africana de que Israel comete genocídio em Gaza, ao determinar uma série de medidas, incluindo assistência humanitária contínua — todavia, ignoradas pelas forças ocupantes.

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Para o presidente brasileiro, não obstante, é essencial um cessar-fogo imediato que permita o fluxo humanitário a Gaza de maneira “sustentável, desimpedida e imediata”, incluindo sob mediação ativa do governo egípcio.

Sisi corroborou as falas de Lula aos jornalistas. “Agradeço o reconhecimento do presidente brasileiro ao Estado palestino”, disse o incumbente egípcio.

Relações internacionais

Esta é a segunda vez que Lula viaja oficialmente ao Egito. Sua primeira visita foi em 2003, pouco após ser eleito a seu primeiro mandato. Nenhum outro presidente brasileiro jamais visitou o país. Em nota à imprensa, Lula destacou que o Brasil retornou ao mapa das relações diplomáticas e criticou, sem citar nomes, a política externa do seu antecessor, Jair Bolsonaro.

“Tenho a satisfação de voltar ao Cairo vinte anos depois de ter sido o primeiro presidente brasileiro a visitar o Egito. Parece que o Brasil estava fora do mundo, só olhava Europa e Estados Unidos. Retorno agora para celebrar o centenário das relações diplomáticas entre nossos países. Hoje, como em 2003, minha visita tem por objetivo aproximar o Brasil da África e do Oriente Médio e as relações com o Egito ocupam papel singular nessa estratégia”.

Lula criticou ainda a incapacidade da Organização das Nações Unidas (ONU) e outras instituições internacionais em solucionar conflitos geopolíticos, incluindo na Faixa de Gaza e na Ucrânia. O presidente brasileiro reiterou apelos para reformar a estrutura anacrônica e hegemonista do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

“O Conselho de Segurança não pode fazer nada na guerra em Gaza. A única coisa que se pode fazer é pedir paz pela imprensa, mas parece que Israel tem a primazia de descumprir, ou melhor, de não cumprir nenhuma decisão emanada das Nações Unidas”,

disse Lula.

Ao reivindicar maior participação de países da África e América Latina, o presidente enalteceu o eventual apoio do Egito para “fazer as mudanças necessárias nos órgãos de governança global”.

“É preciso acabar com o direito de veto dos países, e é preciso que os membros do Conselho de Segurança sejam atores pacifistas, não atores que fomentam a guerra”, acrescentou.

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Sobre Gaza, Lula reconheceu ainda no início da deflagração israelense no território costeiro se tratar de “genocídio”. Seu apoio à denúncia sul-africana em Haia foi considerado uma das manifestações mais fortes entre os países do chamado Sul Global.

Seu governo, no entanto, ainda se nega a revogar contratos de cooperação militar com o Estado colonial israelense — medida reivindicada por ativistas.

Lula se reunirá nos próximos dias com o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, na cidade de Adis Abeba, capital da Etiópia, no contexto de uma cúpula da União Africana, da qual o incumbente brasileiro participará como convidado de honra.

Israel mantém ataques a Gaza desde 7 de outubro, em retaliação a uma ação transfronteiriça do grupo Hamas que capturou colonos e soldados. Desde então, são 28.576 palestinos mortos e 70 mil feridos, além de dois milhões de desabrigados.

As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.

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