O discurso deste ano sobre o Estado da União, proferido nesta quinta-feira (7) pelo presidente dos Estados Unidos e candidato à reeleição, Joe Biden, foi marcado por protestos pró-Palestina, com ativistas reunidos no caminho e em frente ao Capitólio, em Washington DC.
As informações são da rede de notícias Al Jazeera.
Os manifestantes reivindicaram fim do financiamento a Israel e cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza, vitimada por ações de genocídio há mais de cinco meses.
Cerca de 150 ativistas se reuniram na Avenida Pensilvânia — via que conecta a Casa Branca ao legislativo— à espera da passagem do incumbente democrata. Uma enorme bandeira palestina foi estendida na avenida, junto de faixas e cartazes dizendo “Cessar-fogo já”, “Fim da ocupação” e “Biden, seu legado é genocídio”.
“O presidente se prepara para realizar seu discurso sobre o Estado da União, mas estamos aqui para dizer basta — basta de genocídio com os nossos impostos”, declarou à Al Jazeera Cat Knarr, ativista palestino-americana da Campanha por Direitos Palestinos dos Estados Unidos.
“De DC à Palestina, ocupação é um crime”, entoaram os manifestantes.
Joanna, contadora de 39 anos, reafirmou que “é mais importante do que nunca tomar as ruas”.
“Sinto como se minhas próprias mãos fossem responsáveis pelas mortes, meu próprio dinheiro”, apontou Joanna. “Não posso permanecer em silêncio enquanto ocorre um genocídio. É errado porque é errado e tenho de dar voz a isso todos os dias”.
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“Como cidadã palestina, neta de um homem que sobreviveu à Nakba, esse é meu povo, e não tenho escolha senão acordar todas as manhãs e pensar no que estão passando”, explicou Knarr, em referência à “catástrofe” de 1948, quando 800 mil palestinos foram expulsos de suas terras, mediante limpeza étnica, para permitir a criação do Estado de Israel.
Cerca de 500 aldeias e cidades foram destruídas na ocasião.
Biden promete intensificar esforços humanitários a Gaza, mas nega quaisquer planos de reduzir ou condicionar o apoio militar e financeiro a Israel. Na última semana, seu exército lançou do ar 38 mil refeições a 1.5 milhões de pessoas famintas em Rafah, no sul de Gaza — medida descrita por críticos como esforço de relações públicas em meio à crise interna.
Diante dos recordes de rejeição a Biden, sua vice-presidente, Kamala Harris, tomou a dianteira, ao pedir por um cessar-fogo de seis semanas como parte de um acordo de troca de prisioneiros.
Manifestantes, no entanto, denunciam a falta de ações efetivas. Knarr denunciou as promessas de Biden como “manobra política” após “financiar as bombas que devastaram Gaza”.
A Organização das Nações Unidas (ONU) corroborou que a fome generalizada toma o enclave e que Israel continua a impedir o fluxo humanitário, ao manter fechadas as fronteiras por terra a caminhões assistenciais.
Na semana passada, Israel matou cem pessoas a tiros e feriu mais de 700 outras em uma fila de comida, após um caminhão humanitário enfim chegar à Cidade de Gaza. O incidente ganhou a alcunha de “massacre da farinha”.
O Estado da União coincide com as primárias americanas às eleições de novembro. Biden deve enfrentar novamente seu antecessor republicano, Donald Trump. Pesquisas de opinião, porém, apontam uma derrota do partido Democrata.
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No estado de Minnesota, mais de 45 mil eleitores do partido registraram seus votos como “não comprometidos”, como sinal a uma possível abstenção de massa no iminente pleito. Na semana passada, em Michigan — onde Biden venceu por apenas 3% dos votos em 2020 — cerca de cem mil eleitores fizeram o mesmo.
“Vemos os cidadãos levando sua indignação às urnas e isso é algo que os democratas precisam temer”, destacou Jennifer Falcon, também organizadora do ato desta quinta-feira. “Democratas perderam sua plataforma moral ao usar Trump como um fantasma dos quais as pessoas devem ter medo. Estamos cansados disso”.
No Estado da União, presidentes costumam exaltar seu suposto sucesso e propagandear visões de futuro. A advogada palestino-americana Huwaida Arraf, no entanto, apontou que os ativistas materializaram ideais que Biden apenas alega defender.
“Sabemos que Biden mentirá a milhões de pessoas de que a União é próspera e vai bem”, disse Arraf em um megafone. “Sabemos que o Estado da União é, contudo, genocídio. Não podemos aceitar um presidente que alega defender a democracia, mas ignora a vontade do povo”.
Pouco após sua fala, a carreata presidencial se aproximou da Avenida Pensilvânia, ao preferir, no entanto, uma leve curva à esquerda para evitar os manifestantes.
Durante seu discurso, Biden alertou o establishment político contra o retorno de Trump; porém, sem mencioná-lo por nome.
“Meu objetivo esta noite é acordar o Congresso e alertar o povo americano de que não vivemos um momento ordinário”, começou Biden. “Liberdade e democracia estão sob ataque, tanto em casa quando no exterior”.
Biden repetiu promessas de construir um porto temporário em Gaza, todavia, sem cronograma. Não obstante, reforçou seu apoio a Israel como “irresoluto”, ao pedir ao Congresso que aprove um pacote assistencial que inclui o Estado ocupante, além da Ucrânia e outras localidades.
Na quarta-feira (6), o jornal The Washington Post reportou que Washington deferiu mais de cem vendas de armas há Israel nos cinco meses de genocídio, incluindo mísseis de precisão, bombas de pequeno porte e outros equipamentos militares.
Segundo a reportagem, Biden contornou a aprovação do Congresso, ao dividir as remessas em custos abaixo de um valor mínimo requerido para averiguação dos deputados.
Israel mantém ataques a Gaza desde 7 de outubro, deixando 30 mil mortos, 70 mil feridos e dois milhões de desabrigados. Dois terços das vítimas são mulheres e crianças.
As ações israelenses são crime de guerra e genocídio.