‘Agressão flagrante’: Países reagem a veto dos EUA sobre Palestina na ONU

Os Estados Unidos vetaram nesta quinta-feira (18) uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que previa a filiação do Estado da Palestina como membro integral do organismo internacional. Embora se esperasse o veto, à medida que Washington mantém seu contundente apoio a Israel, diversos países reagiram negativamente, reforçando cisões em âmbito global.

As informações são da rede de notícias Al Jazeera.

A proposta foi apresentada ao fórum pela Argélia, que enxerga ecos de sua própria luta contra a colonização francesa na causa palestina. Doze dos 15 países que integram o conselho votaram a favor. Apenas Reino Unido e Suíça se abstiveram.

A seguir algumas reações internacionais:

Autoridade Palestina

O gabinete do presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, radicado em Ramallah, na Cisjordânia ocupada, caracterizou o veto como uma “agressão flagrante … levando toda a região à beira do abismo”.

Em nota, a presidência palestina reafirmou se tratar de uma medida “injusta e injustificada, sem qualquer critério ético”.

“O fato de que essa resolução não foi deferida não dará fim a nossa força de vontade, tampouco derrotará nossa determinação”, destacou o embaixador palestino na ONU, Riyad Mansour, após a votação. “Não cessaremos os esforços. O Estado da Palestina é um fato inevitável”.

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Em referência ao genocídio israelense em Gaza — com 34 mil mortos e 76 mil feridos até então —, acrescentou Mansour: “Lembrem-se que quando acabar essa sessão, na Palestina, há ainda inocentes que pagam com suas vidas […] ao protelarmos a justiça, a liberdade e a paz”.

Hamas

O movimento palestino Hamas, que administra a Faixa de Gaza sitiada, acusou Washington de atravancar a “vontade internacional”, ao exercer seu veto solitário e negar o reconhecimento do Estado palestino e sua integração plena às Nações Unidas.

Em nota, o Hamas condenou “o posicionamento enviesado da América em relação à ocupação” e instou a comunidade internacional a “manter pressão para superar Washington, em apoio aos direitos legítimos por autodeterminação do povo palestino”.

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“Asseveramos ao mundo que nosso povo continuará sua luta e sua resistência legítima até que a ocupação seja derrotada, que nossos direitos sejam restabelecidos e que tenhamos um Estado independente e soberano, com Jerusalém como sua capital”, acrescentou o comunicado.

Catar

O Ministério de Relações Exteriores do Catar — que busca mediar há meses um cessar-fogo em Gaza — “lamentou profundamente” o “fracasso” do Conselho de Segurança em aprovar a ação, ao “considerar este um dia triste para a justiça e um revés para a paz na região”.

Segundo Doha, o veto expõe novamente a “incapacidade do conselho em conduzir seu papel e suas responsabilidades conforme parâmetros de manutenção da paz e segurança internacional, sobretudo diante da brutal guerra travada contra a Faixa de Gaza”.

Egito

O Ministério de Relações Exteriores do Egito — ao sul de Gaza, que teme um enorme influxo de refugiados — ecoou “profundo pesar” sobre a negativa, ao descrever a anuência da Palestina na ONU como um “passo vital [e] direito inerente do povo palestino”.

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Para o Cairo, impedir a representação plena dos palestinos na ONU é algo “inconsistente com a responsabilidade legal e histórica da comunidade internacional”, ao exigir das partes relevantes que alcancem uma “solução justa e derradeira à questão sobre a mesa”.

Turquia 

O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, afirmou: “Enquanto todo o mundo está do lado do povo palestino, os Estados Unidos — lamentavelmente — insistem em sua postura favorável a Israel. Não poderíamos esperar nada diferente”.

Israel

Após uma demonstração de racismo de seu embaixador, Gilad Erdan, no plenário da ONU — na qual o diplomata rotulou os palestinos como “nazistas” e “terroristas” —, o ministro de Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, celebrou o veto da Casa Branca.

Em postagem na rede social X (Twitter), Katz descreveu a proposta como “vergonhosa”.

“É ultrajante que meio ano depois do massacre de 7 de outubro [sic], o Conselho de Segurança ainda não consiga condenar o Hamas”, afirmou o chanceler, ao ignorar a retaliação ilegal de seu regime contra a população civil de Gaza — crime de genocídio e punição coletiva.

Estados Unidos

Robert Wood, vice-embaixador dos Estados Unidos na ONU, alegou que seu governo “trabalha vigorosamente e com determinação em apoio a um Estado palestino, no contexto de um acordo de paz abrangente capaz de resolver permanentemente o conflito”.

“Desde os ataques de 7 de outubro”, comentou Wood, após estender sua mão em sinal de veto, “o presidente [Joe] Biden mantém com clareza que uma paz sustentável na região só poderá ser alcançada via solução de dois Estados com salvaguardas de segurança a Israel”.

Veto dos EUA ajuda Israel a continuar ataques em Gaza.[Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

Wood ignorou, porém, que as negociações continuam paralisadas há anos pelo lado israelense, incluindo mediante sua persistência ausência nas conversas voltadas a um eventual cessar-fogo em Gaza, para permitir o fluxo humanitário.

Para o burocrata americano, entretanto, “há questões não resolvidas se o requerente cumpre os critérios para ser considerado um Estado”.

“Pedimos há tempos que a Autoridade Palestina assuma reformas necessárias para estabelecer atributos de prontidão a um Estado e notamos que o Hamas, uma entidade terrorista [sic], hoje o poder em exercício na Faixa de Gaza, é parte integrante do Estado proposto nesta resolução”, argumentou Wood.

Biden é candidato à reeleição, mas insiste em alienar seu eleitorado progressista — crucial a sua vitória em 2020 — ao longo da campanha, apesar de protestos crescentes em seu país contra as violações de Israel em Gaza.

Brasil

Como membro espectador no presente momento, o Brasil não participou da votação, contudo, instou em discurso que os demais países “cumprissem com suas obrigações internacionais”, ao orientar o voto favorável.

“Reiteramos nosso apoio inabalável à Palestina em sua busca por reconhecimento internacional por meio dos canais diplomáticos”, afirmou o chanceler Mauro Vieira em Nova York.

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Mauro Vieira reafirmou que as Nações Unidas devem discutir formas de garantir a base jurídica que dá às autoridades palestinas o direito a soberania sob o território e proíbe sua anexação e ocupação por Estados terceiro.

“A paz e a estabilidade no Oriente Médio só serão alcançadas quando as aspirações legítimas do povo palestino pela autodeterminação e soberania forem atendidas”, alertou o chanceler.

Rússia

O embaixador da Rússia nas Nações Unidas, Vassily Nebenzia, apontou que, ao impor seu poder de veto, Washington demonstrou “o que verdadeiramente pensa do povo palestino”.

Segundo Nebenzia, os Estados Unidos consideram que os palestinos nativos “não merecem seu Estado próprio”, ao ponderar exclusivamente sobre “os interesses de Israel”.

Para o representante do Kremlin, a Casa Branca busca lavar as mãos sobre os crimes israelenses contra os residentes civis da Faixa de Gaza, além da continuada atividade colonial na Cisjordânia ocupada, ilegal segundo o direito internacional.

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“Seu objetivo é subjugar os palestinos, forçá-los de uma vez por toda a se submeter à potência ocupante, torná-los escravos, cidadãos de segunda classe — quem sabe, de uma vez por todas, expulsá-los de suas terras ancestrais”, prosseguiu Nebenzia. “Esta política tem apenas o impacto oposto”.

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