Mais de 200 dias se passaram desde que Israel iniciou seus ataques a Gaza. Várias rodadas de negociações de cessar-fogo ainda não produziram resultados concretos, e não parece que produzirão resultados positivos no curto prazo. No momento, parece que Israel ainda não desistiu de atacar Rafah, que ele define como o último reduto do Hamas. Devido à gravidade da ameaça, os países da região, incluindo a Turquia, estão intensificando seus esforços diplomáticos para impedir o ataque e acabar com a guerra.
A Turquia, em particular, vem sofrendo pressão crescente da comunidade internacional para desempenhar um papel mais importante, semelhante aos seus esforços de mediação entre o Azerbaijão e a Armênia, bem como entre a Rússia e a Ucrânia. A visita do Ministro das Relações Exteriores, Hakan Fidan, a Doha e sua recepção ao Ministro das Relações Exteriores do Egito, Sameh Shoukri, em Istambul, e a reunião entre o Presidente Recep Tayyip Erdogan e o líder do Bureau Político do Hamas, İsmail Haniyeh, no Escritório de Trabalho do Palácio Dolmabahce, foram os passos recentes mais importantes nessa direção. Embora cada uma das reuniões em questão tivesse uma agenda independente e diferente das outras, pode-se dizer que elas faziam parte de um único todo.
Como mediadores, o Egito e o Catar, por sua vez, atuaram em todas as iniciativas de cessar-fogo no processo que continua desde 7 de outubro. O Egito, um dos atores centrais do mundo árabe, foi o local onde ocorreram as negociações indiretas e os subsequentes acordos de cessar-fogo nas guerras anteriores de 2008-2009, 2012 e 2014.
O Catar, por outro lado, é um parceiro importante do lado palestino porque hospeda o Bureau Político do Hamas e fornece financiamento em grande escala para Gaza. Além disso, desempenha um papel diplomático importante no conflito Palestina-Israel devido às suas relações políticas e econômicas com os Estados Unidos (EUA) e os países ocidentais.
LEIA: Turquia suspende o comércio com Israel até o cessar-fogo permanente em Gaza
Embora não se espere que a Turquia, que intensificou seus contatos com ambos os países, substitua o Catar e o Egito em suas posições de mediador, parece possível que ela se junte aos dois países nesse empreendimento e que um mecanismo de mediação tripartite seja estabelecido no próximo período. Embora seja membro da OTAN e da OIC, a Turquia está em uma posição única para tomar iniciativas diplomáticas na resolução de conflitos.
O anúncio feito na última semana pela Turquia de que apoiará o processo movido pela África do Sul no Tribunal Internacional de Justiça (TJI), alegando que Israel cometeu genocídio em Gaza, talvez seja o sinal mais claro de que Ancara deseja demonstrar seu compromisso absoluto com os direitos humanos e nacionais palestinos. O anúncio foi feito pelo ministro das Relações Exteriores, Hakan Fidan, após sua reunião com seu colega indonésio, Retno Marsudi, em Ancara.
Anteriormente, durante a cúpula de Gaza realizada em Riad, o ministro Fidan conclamou os Estados árabes, especialmente a Organização de Cooperação Islâmica, e os países que reconhecem a Palestina como um Estado a adotarem uma postura mais assertiva em relação à questão palestina.
Reunião entre Haniyeh e Erdogan
Outros sinais de que a Turquia está aumentando as apostas surgiram na semana anterior com a reunião entre o presidente Erdogan e o líder do Hamas, Ismail Haniyeh. A importância dessa reunião não deve ser minimizada. Embora ela tenha sido realizada a portas fechadas, as mensagens transmitidas depois dão pistas importantes sobre a mudança de marcha da Turquia.
A primeira questão que se destacou durante a reunião foi a continuação da ajuda humanitária fornecida a Gaza. Foi enfatizado que a Turquia, que atualmente está entre os países que mais fornecem ajuda humanitária a Gaza, continuará com essa missão, apesar dos obstáculos e das dificuldades. Foi visto que, sob a influência da sensibilidade pública, a decisão de restrição comercial da Turquia contra Israel foi bem recebida pelo lado palestino.
Outra questão importante nas conversas foi garantir a unidade política dos palestinos. A Turquia, que tem relações estreitas tanto com a administração palestina oficial liderada por Mahmoud Abbas quanto com o Hamas, apoia o fim da divisão política interna que influencia a política palestina há 17 anos e produz resultados contra os palestinos.
Por fim, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, conclamou os líderes do Grupo dos 20 a “tomarem a iniciativa de realizar uma solução de dois Estados” para resolver o atual conflito entre Israel e Palestina.
Não se deve ignorar que alguns atores políticos palestinos, principalmente o Hamas, não são favoráveis à solução de dois Estados porque isso significa abrir mão da maior parte da Palestina histórica. No entanto, especificamente sobre essa questão, não está claro se a Turquia solicitou ao Hamas o consentimento formal para a solução de dois Estados.
Apoio das universidades na Turquia
Da mesma forma, os esforços diplomáticos da Turquia em prol dos direitos dos palestinos afetam fortemente o ambiente social e intelectual do país. Muitas universidades da Turquia apoiaram os protestos de estudantes universitários em Gaza nos EUA com uma declaração publicada em suas contas de mídia social. Na última sexta-feira, os estudantes da Universidade de Fırat também anunciaram seu apoio aos protestos de Gaza em três idiomas na coletiva de imprensa que realizaram. Como Zygmun Bauman destacou em sua obra-prima “Liquid Times”, as pessoas estão se afetando globalmente em cada fenômeno social. Esse é o lado positivo da globalização. Se houver alguma injustiça radical em qualquer lugar, as pessoas podem reagir de forma homogênea e enfática. Se alguma vez houve um momento oportuno para a Turquia estar à altura de sua responsabilidade histórica, esse momento é agora. A Palestina e o povo palestino precisam do melhor que a diplomacia turca pode oferecer hoje e não ontem.
LEIA: Como o califado otomano chegou ao fim?
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.