Juntos se rebelam, unidos contra o apartheid

A luta palestina contra o colonialismo sionista, desde Balfour até Biden, é uma das lutas de libertação mais bem documentadas na história moderna. Tentativas recentes de deturpar suas origens, desenvolvimento e significado foram minuciosamente expostas e desacreditadas. A narrativa israelense sobre os eventos de 7 de outubro de 2023 se enquadra perfeitamente nessa categoria. Tipicamente, ignora de forma perniciosa tudo o que precedeu a data. No entanto, com a revolta de estudantes e organizações da sociedade civil em todo o mundo, a busca palestina pela liberdade atingiu um ponto crítico. Seja nas Américas, Europa, África ou Ásia, as pessoas estão se rebelando juntas — unidas contra o apartheid de Israel.

Portanto, foi apropriado que Joanesburgo, o berço da luta antiapartheid da África do Sul, se tornasse o local para o lançamento de um Movimento Global Antiapartheid de Solidariedade Palestina. Na primeira quinzena de maio, delegados de mais de duas dezenas de países se reuniram lá para estabelecer as bases da iniciativa. Entres os emissários, estavam veteranos sobreviventes dos movimentos antiapartheid e de libertação na África do Sul, Namíbia e Moçambique; representantes de partidos políticos da Europa e América do Sul; líderes muçulmanos e religiosos da Palestina e Zimbábue; além de ativistas da sociedade civil.

África do Sul recorre a justiça internacional contra genocídio em Gaza [Sabaaneh/MEMO]

O papel proeminente dos líderes cristãos na reunião de três dias foi especialmente significativo, pois por muito tempo cristãos sionistas, como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, dominaram o discurso sobre a Palestina com seu apoio pernicioso às alegações de um povo “escolhido” e outro “não escolhido”. Pelo contrário, a reunião de Joanesburgo rejeitou essa noção messiânica de um conflito entre crentes e não crentes. Em vez disso, adotou a postura de uma luta entre colonizadores e colonizados.

Para os sul-africanos, há um senso especial de responsabilidade em relação à Palestina, como insistia Nelson Mandela; que a questão da Palestina é a grande causa moral do nosso tempo e que a liberdade da África do Sul permanecerá incompleta enquanto a Palestina não for livre. Nesse sentido, a ministra das Relações Exteriores, Naledi Pandor, foi cristalina em sua mensagem; que revoluções não são feitas em salas de conferências, mas no campo de ação. Como parte de sua postura revolucionária, Pandor lembrou os esforços de seu país para garantir que Israel nunca recebesse um assento de observador na União Africana. Foi uma luta solitária, admitiu a ministra, mas no fim obteve sucesso.

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Como a África do Sul, a República da Namíbia também tem sido um apoiador firme da luta pela libertação da Palestina. Em uma de suas últimas declarações sobre o assunto, pouco antes de sua morte em fevereiro de 2024, o presidente Hage Geingob falou sobre a situação dos palestinos vivendo sob bombardeio israelense em Gaza, ao reafirmar: “Nenhum ser humano amante da paz pode ignorar a carnificina cometida contra os palestinos em Gaza”.

Falando na conferência em nome do governo da Namíbia, a ministra da Justiça, Yvonne Dausab, afirmou que a destruição intencional de escolas, bibliotecas, universidades e o assassinato de jornalistas não pode ser caracterizado de outra maneira senão como genocídio. Dausab lembrou com emoção a experiência de seu país com o genocídio nas mãos dos colonos alemães a partir de 1893. “A Alemanha,” observou, “é agora acusada de cometer seu terceiro genocídio ao se associar a Israel, que conduz o genocídio em curso na Faixa de Gaza. A Alemanha ainda tem de desculpar-se completamente e concluir as negociações sobre reparações com a Namíbia — não resolvidas até os dias de hoje.”

Enquanto isso, a Namíbia se mantém comprometida em impulsionar seus ativos estratégicos para alcançar a libertação da Palestina. Independentemente do que acontecer no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), o país, de acordo com Dausab, revisará o possível impacto do comércio de diamantes entre empresas namibianas e israelenses em relação ao genocídio e à limpeza étnica em curso na Palestina. “Certamente, não temos intenção de agir contrariamente à nossa posição de buscar a liberdade para o povo palestino.”

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A atual intervenção da Namíbia em Haia tem raízes históricas que vão muito além do genocídio pós-outubro. Tanto o Sudoeste Africano, agora Namíbia, quanto a Palestina foram postos sob mandato colonial pela Liga das Nações após a Primeira Guerra Mundial. Enquanto o primeiro foi concedido à União da África do Sul para ser administrado e supostamente preparado para sua independência, o último foi cedido à Grã-Bretanha para o mesmo propósito. Em ambos os casos, a soberania não foi transferida para as potências mandatárias: ambos foram simplesmente destinados a serem governados como uma “concessão sacra”. Em vez de permitir a independência da Namíbia, a África do Sul tentou anexá-la a seu próprio território. Da mesma forma, Israel agora busca anexar toda a Palestina ocupada.

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Em 1971, o Tribunal Internacional de Justiça decidiu em parecer consultivo que a presença da África do Sul no Sudoeste Africano era ilegal e que, portanto, estaria obrigada a encerrar sua ocupação. Em última análise, foi a combinação de sanções da Organização das Nações Unidas (ONU, isolamento internacional e a luta armada da Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO) que levou à independência do país em relação ao regime de apartheid na África do Sul em 1990, sob o nome ancestral de Namíbia. A luta palestina se firma agora em uma trajetória similar.

Inspirada pelo Movimento Global Antiapartheid que acabou com o apartheid na África do Sul e na Namíbia, a Declaração de Joanesburgo busca seguir o mesmo curso contra o colonialismo, o apartheid e o genocídio de Israel. Embora os governos do Norte Global não pretendam deixar pedra sobre pedra para interromper e frustrar seus esforços, há um senso esmagador de que a luta palestina pela libertação entrou em uma nova fase; uma que será determinada pelo movimento de solidariedade global nas ruas, nos campi, nos portos, nas arenas esportivas e nos centros culturais, todos com um único objetivo: o isolamento total e o boicote ao apartheid israelense. O mundo finalmente se rebelou em uníssono — cada vez mais unido contra o colonialismo e o genocídio de Israel na Palestina.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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