Tanques de guerra israelenses avançaram contra a cidade de Rafah, no extremo sul de Gaza, que abriga 1.5 milhão de refugiados, pela segunda vez nesta quarta-feira (29), em desacato a uma ordem do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), sediado em Haia.
Israel enviou tanques ao coração de Rafah pela primeira vez nesta terça-feira (28), confirmou a agência de notícias Reuters. A escalada envolve supostas “zonas seguras” designadas por Israel, para onde palestinos fugiram ao longo dos sete meses de violenta varredura norte-sul.
Os Estados Unidos, maior apoiador de Israel, alegou se opor a uma campanha por terra de larga escala contra Rafah, mas insistiu não crer que tal operação esteja em curso, apesar das imagens gráficas — incluindo crianças carbonizadas — que circularam online.
Segundo testemunhas em campo, tanques avançaram contra Tel al-Sultan, no oeste de Rafah, e Yibna e Shaboura, na região central, antes de recuarem a uma zona neutra estabelecida próxima à fronteira com o Egito.
De acordo com Tzachi Hanegbi, assessor de Segurança Nacional do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, o exército ocupante obteve o controle três quartos da zona neutra, porém pretende angariar pleno controle, sob o pretexto de impedir o tráfico de armas ao Hamas.
Tel Aviv não apresentou provas e suspendeu novamente o acesso humanitário pela travessia de Rafah, apesar da crise de fome que assola Gaza.
Segundo Hanegbi, a agressão em Gaza deve seguir, ao menos, pelo restante do ano. O governo, notou o assessor, “não está pronto” para ceder aos apelos externos por cessar-fogo, tampouco aos protestos internos por uma troca de prisioneiros.
Para Hanegbi, “o exército terá controle do Corredor Filadelfo [zona neutra acordada entre Israel e Egito] a qualquer momento”. A faixa de terra, sob o tratado, deveria ser desmilitarizada.
Analistas apontam que Netanyahu mantém a guerra em Gaza e nega negociações sob interesse próprio, conforme receios do colapso de seu governo de extrema-direita e eventual prisão por seus três processos de corrupção.
Os ministros supremacistas Itamar Ben-Gvir (Segurança Nacional) e Bezalel Smotrich (Finanças) recusam negociações, sob ameaças de deixar o governo. Pedem também a reocupação de Gaza e expulsão dos dois milhões de palestinos ao deserto do Sinai.
LEIA: ‘Genocídio mais horrível desde Hitler’: América Latina reage a massacres em Rafah
O Hamas se compromete com o fim da guerra, conforme retirada das tropas ocupantes, acesso humanitário contínuo e retorno dos refugiados ao norte de Gaza. A negociação inclui a troca de prisioneiros: 128 israelenses em Gaza contra 9.500 palestinos nas cadeias da ocupação.
A maioria dos presos palestinos permanece em custódia sem julgamento ou acusação — reféns, por definição.
As Brigadas Al-Qassam, braço armado do grupo Hamas, e as Brigadas de Al-Quds, braço armado do movimento de Jihad Islâmica, confirmaram que combatentes da resistência confrontaram os avanços com morteiros e foguetes antitanque, além de desarmar explosivos.
Segundo Israel, três soldados foram mortos e outros três ficaram gravemente feridos durante a agressão ao sul de Gaza — contudo, sem detalhes. A emissora estatal Kan alegou que as baixas ocorreram devido a uma armadilha instalada em um prédio de Rafah.
Conforme fontes de saúde in loco, várias pessoas foram feridas por disparos israelenses no leste de Rafah e instalações humanitárias foram incendiadas pelos avanços da ocupação.
Residentes relataram que o bombardeio contínuo de Israel durante a madrugada destruiu casas e infraestrutura civil. Alguns relatos reportaram a presença de veículos armados não-tripulados, cujas metralhadoras abriram fogo a partes da cidade.
LEIA: Por que é tão difícil validar a liberdade palestina?
Sinais de internet e telefonia foram cortados no leste e oeste de Rafah, sob pesado bombardeio israelense por ar e terra, informaram a agência Shebab e jornalistas em campo.
Mais ao norte, na Cidade de Gaza, tanques dispararam contra bairros residenciais, em particular em Jabaliya — o maior dos oito campos de refugiados no território palestino.
O Ministério da Saúde confirmou a interrupção das operações nos hospitais remanescentes das áreas atacadas. Ashraf Al-Qudra, porta-voz da pasta, pediu acesso imediato e seguro a insumos combustíveis, medicamentos e profissionais, tanto a Rafah quanto ao norte de Gaza.
“O exército da ocupação israelense deliberadamente exterminou a presença de saúde em Rafah e na região norte”, advertiu Qudra. “Não há como socorrer os feridos nessas áreas”.
A Agência das Nações Unidas para Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA) relatou que centenas de milhares de pessoas abrigaram em Rafah foram novamente deslocadas; entretanto, sem ter para onde ir.
O Crescente Vermelho da Palestina informou a evacuação de suas equipes do hospital de campo de al-Mawasi, considerada uma zona de evacuação civil, ao observar “artilharia e bombardeios aéreos ininterruptos” em toda a região.
LEIA: Sete meses de derramamento de sangue e destruição
Israel descumpre medidas cautelares do Tribunal Internacional de Justiça, requeridas pela África do Sul, que incluem suspensão dos ataques a Rafah, abertura da fronteira e acesso de missões investigativas internacionais.
Em Khan Younis, um ataque aéreo israelense matou três pessoas na madrugada, entre as quais, Salama Baraka, veterano do departamento da polícia de Gaza.
O Crescente Vermelho confirmou a morte de um de seus funcionários, Issam Aqel, atingido em sua casa no campo de refugiados de Bureij, na região central. Desde outubro, são 30 óbitos nas fileiras da instituição internacional, irmã da Cruz Vermelha em áreas islâmicas.
Neste domingo (26), Israel bombardeou um campo de refugiados em Tal al-Sultan, na cidade de Rafah, perto de um armazém da Agência das Nações Unidas para Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), deixando 45 mortos e 250 feridos.
Imagens gráficas, incluindo crianças carbonizadas, circularam online.
A campanha israelense deixou ao menos 36 mil mortos e 80 mil feridos em Gaza desde outubro, além de dois milhões de desabrigados — 1.5 milhão dos quais radicados em Rafah.
As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.