Os Emirados Árabes Unidos cancelaram várias reuniões com ministros do Reino Unido após terem sido acusados de ajudar um grupo paramilitar em guerra no Sudão.
No início de abril, o Conselho de Segurança das Nações Unidas realizou uma reunião sobre a guerra civil no Sudão – que começou há um ano – a pedido de Londres.
Durante a sessão, o representante do Sudão acusou os Emirados de fornecerem apoio ao grupo paramilitar Forças de Suporte Rápido (RSF), acusação que Abu Dhabi negou.
De acordo com reportagem do The Times, quatro reuniões ministeriais do Reino Unido foram canceladas pelos emiradenses, que teriam ficado irritados com o fato de os britânicos não defenderem o país no Conselho de Segurança.
Dias antes, o The Guardian reportou que o próprio Reino Unido mantinha conversas secretas com as Forças de Suporte Rápido.
As Forças de Suporte Rápido estão em guerra com as Forças Armadas sudanesas desde 15 de abril do ano passado. A guerra deslocou mais de oito milhões de pessoas e deixou 18 milhões em “grave insegurança alimentar”, segundo o Programa Alimentar Mundial (PAM).
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Um relatório divulgado em meados de abril pelo Centro Raoul Wallenberg concluiu que um genocídio estava ocorrendo contra grupos não-árabes na região de Darfur, no Sudão, pelas mãos das Forças de Suporte Rápido e de milícias aliadas.
O relatório corroborou “evidências claras e convincentes” de que Sudão, Emirados Árabes Unidos, Líbia, Chade, República Centro-Africana e Rússia, através das ações do Grupo Wagner, agem como “cúmplices” deste genocídio.
Cartum pediu uma reunião de emergência do Conselho de Segurança sobre o apoio dos Emirados Árabes Unidos às Forças de Suporte Rápido.
“Se os Emirados Árabes Unidos insistem tanto em suas negativas de que mantêm apoio às Forças de Suporte Rápido, então por que gastar tanto capital diplomático para impedir o debate?”, comentou Cameron Hudson, ex-analista da CIA, associado ao Programa África do Centro e Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), em conversa com o Middle East Eye.
Hudson afirmou que fontes próximas ao assunto lhe disseram que os Emirados estavam pressionando Estados Unidos, Reino Unido e outros membros do Conselho de Segurança a cancelarem a reunião de emergência.
“Em Washington, isso está levando a um ponto crítico as disputas entre os africanistas, que querem adotar uma postura rígida em relação ao comportamento dos Emirados Árabes Unidos no Sudão, e a equipe de política do Oriente Médio da administração de Joe Biden, liderada por Brett McGurk, que tem resistido a usar sua influência no Golfo em relação ao Sudão”, prosseguiu Hudson.
Linhas de abastecimento
O Middle East Eye reportou sobre as linhas de abastecimento que existem para canalizar armas e outros bens dos Emirados Árabes Unidos para às Forças de Suporte Rápido, por meio de grupos e governos aliados na Líbia, Chade e República Centro-Africana.
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Os Emirados são o principal patrono do grupo paramilitar sudanês, com o fornecimento de armas também facilitado pelo comandante líbio Khalifa Haftar, transportado por via terrestre a partir do Chade e da República Centro-Africana, além de via aérea a partir de bases em Uganda.
As forças paramilitares negam que exista a rede de suprimentos emiradense, assim como as acusações de que conduzam uma campanha de violência motivada por questões étnicas em Darfur.
Respondendo às acusações do Sudão no Conselho de Segurança, declarou Abu Dhabi: “Os Emirados Árabes Unidos rejeitam inequivocamente as acusações infundadas feitas pelo representante permanente do Sudão, que contrariam as relações fraternas de longa data entre nossos países e, lamentavelmente, parecem ser nada mais do que uma tentativa de desviar a atenção do conflito e da grave situação humanitária causada pela luta em curso”.
“Todas as alegações de envolvimento dos Emirados Árabes Unidos em qualquer forma de agressão na desestabilização do Sudão, ou seu fornecimento de qualquer apoio militar, logístico, financeiro ou político a qualquer facção no Sudão, são espúrias, infundadas e carecem de qualquer evidência credível para apoiá-las”, acrescentou.
Em dezembro, o Sudão exigiu que 15 diplomatas emiradenses deixassem o país após um comandante do exército acusar os Emirados de apoiarem as Forças de Suporte Rápido.
No fim de semana, o Conselho de Segurança expressou “profunda preocupação” com um ataque iminente a al-Fashir, na região de Darfur, pelo grupo paramilitar.
Funcionários da ONU alertam que 800 mil pessoas em al-Fashir – a última grande cidade em Darfur que não está sob controle das Forças de Suporte Rápido – permanecem em “perigo extremo e imediato”.
Este artigo foi publicado originalmente em inglês em 29 de abril de 2024 pela rede Middle East Eye.