Partido de Mandela sofre revés eleitoral, busca coalizão na África do Sul

O Congresso Nacional Africano (CNA), partido do líder antiapartheid Nelson Mandela, teve seu pior resultado nas eleições da África do Sul em três décadas, ao alcançar 40.2% dos votos para o legislativo, contra 57.5% em 2019, conforme resultados anunciados no domingo (2).

As informações são da agência de notícias Al Jazeera.

Conforme o sistema político sul-africano, desde a adoção do sufrágio universal pós-apartheid, a escolha do presidente se dá através do legislativo, conforme maioria simples. O resultado, deste modo, implica na necessidade de um governo de coalizão.

Neste sentido, o atual mandatário Cyril Ramaphosa (CNA) pediu aos partidos políticos nacionais que trabalhem juntos pelo “bem do país”.

A queda eleitoral, todavia, sugere descontentamento popular com questões como desemprego — entre as maiores taxas do mundo.

A Aliança Democrática (AD), principal bloco oposicionista, do liberal africâner John Steenhuisen, alcançou 21.6% dos votos, contra 14.7% do uMkhonto we Sizwe (MK), recém-fundado pelo ex-presidente Jacob Zuma, que obteve votos do partido governista.

O CNA venceu 159 dos 400 assentos da Assembleia Nacional, contra 230 há cinco anos. O atual governo pode ainda tentar formar um governo de minoria; entretanto, sob eventuais impasses para aprovar peças legislativas.

“Os sul-africanos esperam que os partidos pelos quais votaram encontrem terreno comum, para que superem suas diferenças e ajam pelo bem de todos”, comentou Ramaphosa após o anúncio dos resultados. “É hora de todos colocarmos a África do Sul em primeiro lugar”.

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Membros do CNA reconheceram “não ter o que comemorar”. Fikile Mbalula, secretário-geral do CNA, admitiu “erros”, mas manifestou compromisso em formar um “governo estável e capaz de administrar o país efetivamente”.

Ramaphosa, negociador-chefe de Mandela para o fim do apartheid, contudo, descreveu o pleito “como uma vitória para a democracia”.

Comício do Congresso Nacional Africano (CNA) no Estádio Cidade do Futebol, em Joanesburgo, na África do Sul, em 29 de maio de 2024 [Ihsaan Haffejee/Agência Anadolu]

Os partidos políticos têm prazo de duas semanas para formar um acordo até que o parlamento eleja o presidente. O mandato de Ramaphosa parece incerto após o pleito, mas espera-se que o CNA — ainda maioria — mantenha o poder.

A imprensa local notou disposição da Aliança Democrática para firmar um pacto com o governo, em troca de cargos no parlamento. O Partido da Liberdade Inkatha — dissidência do CNA, como o bloco de Zuma — também está cotado, após obter 3.85% dos votos.

Outra cisão do CNA, o partido Combatentes da Liberdade Econômica (EFF), conquistou o quarto lugar, com 9.52% dos votos.

Conforme a analista política Melanie Verwoerd, “é quase certo que o CNA não capitule à Aliança Democrática … dada a percepção de que se trata de um partido branco”.

A liderança do CNA se reunirá nesta terça-feira (4) para esboçar o plano adiante.

A África do Sul, sob Ramaphosa, tomou a dianteira nos esforços para responsabilizar Israel pelo genocídio em Gaza, ao registrar uma denúncia no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), sediado em Haia, deferida em 26 de janeiro.

Ativista estendem enorme bandeira palestina durante comício do Congresso Nacional Africano (CNA) no Estádio Cidade do Futebol, em Joanesburgo, na África do Sul, em 29 de maio de 2024 [Ihsaan Haffejee/Agência Anadolu]

A agressão israelense a Gaza já matou em oito meses 36 mil pessoas e feriu outras 80 mil, além de dois milhões de desabrigados, sob violento cerco, sem comida, água, medicamentos e outros insumos essenciais.

Lideranças do CNA reforçaram sua retórica pró-Palestina durante a campanha. Em contrapartida, a Aliança Democrática insistiu em uma posição supostamente “neutra”, apesar de forte rejeição da população, que recorda a postura anticolonial de Mandela.

As ações israelenses em Gaza são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.

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