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Sob boicote, propaganda da Coca-Cola em Bangladesh tenta negar laços com Israel

19 de junho de 2024, às 10h02

Destruição deixada por ataques israelenses ao campo de refugiados de Bureij, na Cidade de Gaza, em 12 de junho de 2024 [Abed Rahim Khatib/Agência Anadolu]

Uma propaganda de 60 segundos da Coca-Cola Company, veiculada em Bangladesh, alimentou críticas à corporação sediada em Atlanta, nos Estados Unidos, por tentar ludibriar o público e se distanciar de Israel no contexto do genocídio em Gaza.

As informações são da rede Al Jazeera.

Desde outubro, dezenas de empresas, incluindo a Coca-Cola, enfrentam um declínio vertiginoso em suas vendas em países de maioria islâmica, conforme apelos por Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra a ocupação e colonização na Palestina histórica.

Segundo a imprensa local, a Coca-Cola vivenciou queda de 23% nas vendas em Bangladesh. Nos últimos meses, a empresa intensificou sua campanha publicitária no país — desde anúncios de página inteira nos jornais a intervenções em websites populares.

Em 9 de junho, a Coca-Cola divulgou um anúncio na televisão e nas redes sociais para contestar a percepção de que o refrigerante se trata de um produto israelense.

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O anúncio em bengali abre com um dia quente no mercado, com um rapaz se aproximando de um atendente de meia idade, que assiste em seu celular a um vídeo da Coke Studio — popular série de música promovida pela corporação em países do sul da Ásia.

“Como você está, Sohail?”, pergunta o atendente. “Que tal uma Coca?”.

“Não Bablu bhai [irmão]. Eu não bebo mais esse negócio. É ‘daquele lugar’”, responde o rapaz, em clara alusão a Israel.

O atendente contrapõe: “Veja, meninos. A Coca não é ‘daquele lugar’. Há 138 anos, pessoas em 190 países bebem Coca. Bebem Coca na Turquia, na Espanha e em Dubai. Mesmo na Palestina, tem uma fábrica da Coca”.

Então, aparentemente aliviados, bebem refrigerante.

Desinformação

O comercial foi veiculado pela primeira vez durante uma partida de críquete entre Paquistão e Índia, pela Copa do Mundo T20 realizada nos Estados Unidos e Caribe.

Logo após a transmissão, deflagrou indignação online e nas ruas.

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Hasan Habib, empresário na capital Dhaka, confirmou boicotar a Coca-Cola por Gaza e reiterou: “Essa tentativa absurda de retratar a marca como se nada tivesse a ver com Israel apenas me dá certeza de que devo continuar meu boicote”.

Um elemento em particular foi logo contradito: a fábrica da Coca na Palestina. De fato, a marca tem uma fábrica na Cisjordânia ocupada, porém no assentamento ilegal de Atarot.

“Trata-se de uma declaração absolutamente insensível e falsa”, explicou Nadia Tabassum Khan, analista de mercado na capital bengali. “É um insulto aos milhões de palestinos cujas terras são expropriadas há décadas pela violenta ocupação de Israel”.

Nesta quarta-feira (12), uma loja de sapatos veiculou um anúncio de protesto, mostrando uma garrafa de Coca sendo chutada por um homem. Abdul al-Nayan, gerente de marketing da firma, expressou solidariedade aos palestinos em conversa com a Al Jazeera.

“Como professional de marketing, aproveitei a oportunidade para formular uma propaganda de nosso produto com base nas questões em voga”, afirmou al-Nayan. “Porém, como muçulmano, condeno veementemente a Coca por mentir sobre sua conexão com Israel”.

Para Omar Nasif Abdullah, professor de publicidade da Universidade Norte-Sul de Bangladesh, observou que o anúncio mostra que a empresa “não conseguiu ler o pulso das ruas”. Para ele, a campanha é “tomada por uma mensagem errada e uma abordagem ainda pior”.

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A Coca-Cola removeu a peça de seus canais do YouTube e Facebook por cinco horas, entretanto, sem explicação. Ao devolvê-la ao ar, desativou os comentários.

Para Zahed Ur Rahman, analista político de Dakha, “a Coca é vista como uma marca americana por excelência, alvejada, portanto, sob a crença de que a pressão econômica pode persuadir os Estados Unidos — maior aliado de Tel Aviv — a intervir na matéria”.

Segundo Rahman, a percepção é comum entre o povo bengali.

Em fevereiro, a Coca-Cola vendeu suas operações de empacotamento a uma associada turca, a Coca-Cola Icecek. A empresa negou relação com a queda nas vendas.

Em contrapartida, uma marca local de refrigerantes, até então obscura, a Mojo, ganhou terreno.

Israel é réu por genocídio no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), sediado em Haia. Em maio, a promotoria do Tribunal Penal Internacional (TPI) requereu mandados de prisão contra o premiê Benjamin Netanyahu e seu ministro da Defesa, Yoav Gallant.

Israel mantém ataques indiscriminados a Gaza há mais de oito meses, deixando 37 mil mortos e 85 mil feridos até então, além de dois milhões de desabrigados.

Neste contexto, corporações como McDonald’s e Starbucks — na lista de boicote por seu apoio operacional ao apartheid e às ações militares de Israel — sofreram prejuízos bilionários.

As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.